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A Eucaristia não é um prêmio 

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“A Eucaristia não é um prêmio para os bons, mas a força para os débeis e os pecadores. O perdão, viático que nos ajuda a andar, a caminhar”

A afirmação do Papa Francisco na homilia do Corpus Christi no dia 4 de junho de 2015 revela para nós o sentido real daquilo que a Igreja no mundo celebrará na próxima quinta feira. A festa religiosa tem por objetivo celebrar o mistério da eucaristia, o sacramento do corpo e do sangue de Jesus Cristo. Porém o que se entende como corpo de Cristo e como a vivencia do sacramento se distorceu na práxis dos fieis ao longo do tempo. Fazer memória da ultima homília do Papa, referente a Corpus Christi, nos ajudará a aprofundar-se no mistério que celebraremos essa semana.

Sabemos que a tradição, impulsionada pelo papa Urbano IV em 1264, é celebrada 60 dias depois do Domingo de Páscoa ou na quinta-feira seguinte ao domingo da Santíssima Trindade, em memória da quinta-feira santa quando Jesus instituiu o sacramento da eucaristia. Sabemos também que são celebradas missas festivas e as ruas são enfeitadas com tapetes de sal para a passagem da procissão onde é conduzido geralmente pelo Bispo, ou pelo pároco da Igreja, o ostensório com o Santíssimo Sacramento, que é acompanhada por multidões de fiéis. 

A partir das experiências simbólicas que nos remetem para o jubilo da festa sacramental, e das falas do Santo Padre na festa do ano passado, quero refletir alguns breves pontos em cima daquilo que Francisco nos exorta.

A primeira coisa, a saber, é: “A Eucaristia não nos permite separarmo-nos; é sinal vivo do amor de Cristo que se aniquilou para que permaneçamos unidos. Participando da Eucaristia e nutrindo-nos dela, nós assumimos um caminho que não admite divisão”. Ou seja, o amor de Deus revelado no mistério da transubstanciação, nos impulsiona para o outro. Logo, quando não estamos dispostos a viver em sentido pleno da palavra COMUM UNIDADE estaremos fadados a viver das nossas individualidades, fato esse que faz aumentar em nossas igrejas a divisão e não o amor. 

Segundo: O Papa Francisco citou um trecho do Ofício das Leituras nesta celebração que diz o seguinte: “Você reconhece neste pão, aquele que foi crucificado; no cálice, o sangue que jorrava de Seu lado. Tomai e comei o Corpo de Cristo, bebam o seu sangue, porque agora são membros de Cristo. Para não vos separarem, comer este vínculo de comunhão; para não esmorecer-vos, beber o preço de sua redenção“. Quando tomamos parte do Corpo de Cristo, nos tornamos membros do seu corpo. Porém nos afastamos da sua graça à medida que recusamos receber os outros membros de cristo que também fazem parte da COMUM UNIÃO que nos atualiza em perfeita aliança. 

A cobiça, o ter e o poder, ou até o mito da personificação da identidade cristã, são armadilhas que nos fazem detentores da razão e do julgamento de quem é ou não corpo místico de Cristo. Fazendo crescer no meio de nós a disputa para saber quem é o mais santo e o maior pecador.

Terceiro: “Nos separamos quando não vivemos a Palavra do Senhor, quando competimos para ocupar os primeiros lugares, quando não somos capazes de oferecer esperança. Assim nos separamos”.

Bem, se a partir dessa leitura, o Papa nos questionava sobre os significados da separação, ele ao mesmo tempo nos orientava a ser indiferentes. Não no sentido real das indiferenças, daquilo que estamos acostumados a fazer em nossos egoísmos. Mas nos aponta um caminho para termos em nossa prática a indiferença inaciana. Essa perspectiva teologal de Inácio de Loyola permite que possamos abrir mão das nossas vontades e se abandonar na vontade de Deus. Isso é ser indiferente, isso é perceber que minha vontade é indiferente, pois o que me leva a ser mais feliz é estar correspondente a vontade de Deus. 

Vejamos:  “o consumir, o aparecer, o ‘eu’ no centro de tudo. O não admitir nunca ter errado e não ter necessidade. Tudo isso nos abate e nos torna cristãos medíocres, pagãos”.

Quando argumentado que a eucaristia não é um prêmio, é por perceber que desde a etimologia da palavra, até sua ação misericordiosa, o corpo de Cristo é graça, é ação de graças. É uma graça transformadora que, ao olharmos para nossa humanidade, veremos sempre um permanente pecador, mas que encontra no corpo e sangue de Cristo o retorno da dignidade humana, quer desde a sua concepção é a imagem e semelhança de Deus. 

 “Cantemos com eles, adoremos com eles, e veneremos no nosso coração aos quais fora pedido o sacrifício da vida por amor a Jesus Cristo. E não nos esqueçamos: para não nos separarmos e formamos este vinculo de comunhão, bebamos o preço da nossa redenção”.

*Walmyr Júnior é morador de Marcílio Dias, no conjunto de favelas da Maré, é professor, membro do MNU e do Coletivo Enegrecer. Atua como Conselheiro Nacional de Juventude (Conjuve). Integra a Pastoral Universitária da PUC-Rio. Representou a sociedade civil no encontro com o Papa Francisco no Theatro Municipal, durante a JMJ