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O Racismo deles de cada dia

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Racismo é crime e crime se responde com justiça! A tipificação do Racismo como crime inafiançavel garante que todo indivíduo seja imediatamente responsabilizado legalmente pelos seus atos. Lamentavelmente vimos essa semana a jornalista da rede globo, Maria Júlia Coutinho, ser brutalmente atacada pelas redes sociais por racistas que merecem o sistema penitenciário como resposta a suas atitudes. 

As ofensas geradas a 'Maju' reverbera uma das faces mais inescrupulosas do racismo no Brasil,  que para muitos não existe. A reporter sofreu o que toda população negra sofre cotidianamente nos espaços de sociabilidade do nosso país. Sejam eles de lazer, de cultura, de bens e serviços públicos e mercado de trabalho. Me entristece, mas não me surpreende tal episódio, por estar há exatamente 30 anos, todos os dias, tendo que contornar e vencer tais práticas de quem ainda não aceitou a lei áurea, nem fim o da senzala.

Olhares, apelidos, falta de seguridade social são constantes na trajetória de qualquer negro ou negra que ouse ocupar os espaços que historicamente  lhe eram negados. E mesmo quando há uma ocupação desses lugares, percebemos uma hospitalidade hostil. “Ok, queria universidade? Agora que tem, se vire!”. Não é incomum pensar nos programas de pós graduação (strictu sensu), cargos do governo de primeiro escalão, altos postos de mercado de trabalho terem a ausência da população negra. Por outro lado, quando os/as encontramos   lá, ouvimos sempre relatos de “Tenho que fazer isso três vezes melhor que um branco, porque se errarmos ou  não estivermos em destaque temos nossos espaços rifados com mais efervescência”

Para Dara Sant'Anna, estudante de Direito e militante do coletivo Enegrecer: “A Maria Julia que é repórter da Tv Globo foi vítima do mesmo racismo que o conglomerado de comunicação reproduz em seus mais diversos produtos televisivos. Se em um dia da semana, a Regina (personagem da Camila Pitanga na novela Babilônia) reproduz uma fala de enfrentamento contra o racismo e a favor da identidade negra ( e o vídeo tem sido viralizado nas redes), no domingo no horário do almoço temos a outra Regina, a do esquenta, reproduzindo o racismo de diversas formas e naturalizando diversos estereótipos”.

A 'Maju' ainda teve um espaço dentro do telejornal para rebater o racismo que sofreu. Quantos negros e negras tem o mesmo espaço de PODER para rebater as opressões sofridas? E quantos negros e negras  são exterminados na periferia cotidianamente pela polícia? Quantos adolescentes são encarcerados por estarem a margem da sociedade e por ausencia de políticas públicas entram em  conflito com a Lei? Vimos na última semana o golpe no Congresso Nacional, encampado por Eduardo Cunha, que propõe a redução da maioridade penal e a aprovação da PEC 171/1993. Não é difícil perceber o quanto a mídia, em especial a rede globo, ao longo da criação do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, tem agenciado opiniões a favor da redução, de forma a espetacularizar, criar ranço, ódio e um sentimento de impunidade com esses adolescentes. 

Se por um lado a “Maju” teve chance dar uma resposta, continuamos caminhando sem saber aonde está o pedreiro Amarildo. Continuamos ainda, sem ter avanço nas investigações do caso do dançarino DG. ou da Cláudia que foi arrastada no carro da Polícia Militar. 

Não tento invisibilizar em nenhum momento o racismo que a repórter sofreu. Existiu e foi real. E temos que combatê-lo incessantemente. Mas, não dá para tirarmos da conta da emissora o desserviço que ela corrobora para a construção e manutenção do racismo diário, aquele que tenta te derrubar a cada cinco minutos.

?*Walmyr Júnior é morador de Marcílio Dias, no conjunto de favelas da Maré, é professor e representante do Coletivo Enegrecer como Conselheiro Nacional de Juventude (Conjuve). Integra a Pastoral Universitária da PUC-Rio. Representou a sociedade civil no encontro com o Papa Francisco no Theatro Municipal, durante a JMJ.