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Carnaval não combina com opressão (parte 1)

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O carnaval vem chegando e, junto a ele, a alegria dos foliões já envolvem todas as cidades do país. A animação e as grandes festas em torno d’ele já trazem para o Brasil um numero expressivo de turistas com seu capital estrangeiro para comprar nosso carnaval. Não quero falar da mercantilização da cultura e nem da venda do nosso patrimônio histórico. Quero falar de problemas sintomáticos que alimentam o preconceito e esconde o racismo, o machismo e a homofobia praticados na tão famosa ‘festa da carne’

O que vem ao caso não é história do carnaval, mas sim que a festa das fantasias romantizada pelo carnaval francês, da colombina e do pierrô, ganhou outra conotação. O imaginário cultural do carnaval no Brasil, que historicamente foi se configurando como uma das festas mais populares protagonizada pelas massas, não tem mais essa referência.  No Rio de Janeiro, o carnaval foi elaborado nas favelas e periferias, que ao longo do tempo virou moeda de troca para os grandes empresários incidirem no imaginário dos carnavalescos. Não por acaso os temas dos sambas de enredo sempre homenageiam quem vai bancar a escola naquele ano. No tradicional carnaval baiano não é diferente. Existe o carnaval dos ricos, com seus abadás e privilégios, enquanto que as cordas protegem a elite econômica dos negros e pobres, que ficam na ‘pipoca’ dos grandes blocos.

Se é possível associar a grande festa do carnaval como uma ferramenta do capitalismo, logo também vemos o carnaval se tornar a festa do patronato e do patriarcado. Esses conceitos estruturantes garantem os privilégios de uma classe, assim como determina quem é a vítima e o preconceito da vez. No caso do carnaval, temos nítido que o preconceito aumenta e de forma pejorativa oprime as mulheres, os/as homossexuais e a população negra. 

De uma série de três artigos, quero explanar esse tema e construir uma linha de frente de combate às opressões nesse carnaval. Começo com a seguinte pergunta: Quem nunca em uma noite ou dia de carnaval não viu um homem fantasiado de mulher? 

Essa pergunta é muito fácil de ser respondida. Muitos poderão afirmar que já se ‘fantasiaram de mulher’. A outra pergunta que fica no ar é se esses mesmos que usam o imaginário da fantasia de menina carregam sobre si as opressões que elas carregam. 

A resposta é óbvia: não. O homem quando se veste de mulher satiriza e faz chacota. Se vestem de mulher mas continuam oprimindo as mulheres. Um dos exemplos mais comuns é a oferta do corpo do homem ‘fantasiado'. Ele fantasiado dela, levanta a saia, rebola seduz e satiriza toda opressão sofrida por ela. Ou seja, esse homem que se veste de mulher só amplia as opressões. 

Para Lays Gonçalves, diretora de Mulheres da UNE (União Nacional dos Estudantes), a grande mídia influencia na mercantilização do corpo das mulheres. Para ela, a mídia também quer usar os corpos das mulheres, a exemplo da globeleza.

Além disso, argumente que  “o momento do carnaval deve ser encarado como algo que pode vir a imprimir muito da identidade cultural do Brasil, porém, como qualquer outra atividade cultural é permeada de preconceitos. O mais grave é o do uso do corpo das mulheres não só como mercadoria mas para diversão dos homens. Por ser um momento de festividade musica e festa, tem que ser um espaço onde homens e mulheres possam estar e que nenhum homem se ache no direito de encostar no corpo de qualquer mulher.” 

Vou deixar outras impressões sobre as opressões no carnaval para meu próximo artigo. Mas para auxiliar o combate às opressões que as mulheres sofrem no dia a dia, quero indicar para os machistas de plantão uma cartilha para o carnaval escrito pela militante da Marcha Mundial das Mulheres Marianna Brito:

“Atenção, Homens

- Se a mulher não estiver em condições de dizer SIM ou NÃO, é NÃO.

- Drogar mulheres para que elas fiquem mais fáceis pra você É CRIME.

- Não é legal segurar a mulher pelo braço; forçar beijo; apertar bunda no meio da multidão; passar a mão no peito; entrar na frente da mulher impedindo a passagem dela (ou dizendo que só sai se ganhar beijo), enfim, assediar. Nós, mulheres, temos direito de caminhar na rua sem ter que esquivar o tempo todo de tarados machistoides de plantão. Eu, particularmente, lido com essas situações armando um barraco, mas nem sempre é possível e as vezes os caras partem pra cima de você.

- A linha entre o assédio e a vontade mútua não é tênue: assédio é sem consentimento. 

Você, homem, que está lendo esse post, não repita esses comportamentos. Nós, mulheres, repudiamos assédio. Se for muito difícil pra você entender porque não deve fazer isso, antes de fazer qualquer coisa pense: E SE FOSSE UM DOIDÃO FAZENDO ISSO COM MINHA MÃE? (detesto ter que pedir pra um homem respeitar as mulheres porque ele tem mãe, mas tem homem que só entende assim...) Coloquem-se no lugar das mulheres, gente. Vocês iriam gostar de serem agarrados a cada 50 metros?

Mulheres: 

-Nós somos muito guerreiras de sairmos na rua, Carnaval após Carnaval, assédio após assédio. Carnaval é uma época em que uzomi de plantão acham que tudo tá permitido, e é incrível como a quantidade de assédio que sofremos aumenta. Você, mulher, que continua curtindo Carnaval na rua mesmo com tudo o que temos que aguentar nessa época do ano, você é muito guerreira! Isso se chama fazer revolução e eu estou com você nessa! Vamos ocupar o espaço público porque ele é nosso por direito! Vamos dançar nossa liberdade na cara dos machistas!

- Toda minha solidariedade a todas nós, e sejamos irmãs: viu uma mulher sofrendo assédio? Tente ajudar de alguma maneira! Seja escrachando o otário, seja perguntando pra ela se ela está bem, seja chamando a polícia.”

*Walmyr Júnior é professor. Representante do Coletivo Enegrecer como Conselheiro Nacional de Juventude - CONJUVE. Integra Pastoral da Juventude e a Pastoral Universitária da PUC-Rio. Representou a sociedade civil no encontro com o Papa Francisco no Theatro Municipal, durante a JMJ.