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Grupo da OEA denuncia que Nicarágua não permite esclarecer violência

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Um grupo de especialistas vinculados à Organização dos Estados Americanos (OEA) expressou nesta quinta-feira (16) a sua "preocupação" pelo bloqueio da Nicarágua ao seu trabalho de "coadjuvar" em esclarecer os casos de violência no contexto dos protestos que deixam mais de 300 mortos.

Em um mês e meio de permanência no país "não tivemos acesso" aos expedientes das investigações, causas penais e plano de reparação às vítimas da violência, declararam em entrevista coletiva os membros do Grupo Interdisciplinar de Especialistas Independentes (GIEI).

O grupo coordenado pelo italiano Amerigo Incalcaterra assegurou em comunicado que solicitou de forma verbal e por escrito a informação sobre as mortes e causas penais à Chancelaria, ao Poder Judiciário, à Promotoria e à Polícia, sem receber resposta até agora.

O organismo, autônomo mas vinculado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), pediu ao governo para que disponha em breve e "sem condições" o acesso a essa informação, sem a qual a sua "tarefa se vê seriamente limitada".

O mandato do GIEI, por um período de seis meses a partir de 1º de julho, tem como objetivo trabalhar com as autoridades envolvidas no processo de investigar os feitos ocorridos entre 18 de abril e 30 de maio.

No período em questão estima-se que tenham morrido "por volta de 100 pessoas", de acordo com a informação preliminar que o organismo dispõe.

- Quem são os responsáveis -

A tarefa de investigar não corresponde ao GIEI, mas de fazer recomendações e fornecer sua expertise para esclarecer "o que aconteceu, o motivo pelo qual esses fatos se deram e quem são os responsáveis", explicou Incalcaterra.

A guatemalteca Claudia Paz considerou "urgente" ter a informação por parte do governo porque "há um período que vence em seis meses e já transcorreu um mês e meio".

Não obstante, "se não compartilharem (a investigação oficial), ficaremos sem base e tentaremos encher com outro tipo de informação", assinalou Incalcaterra.

A presidente do Centro Nicaraguense de Direitos Humanos (Cenidh), Vilma Núñez, considerou que a falta de colaboração do governo é para que nada seja esclarecido.

As autoridades não têm nenhum expediente das mortes "porque não fez nenhuma investigação dos crimes que eles mesmos cometeram. O que querem é que tudo isso fique na impunidade", explicou Núñez.

O governo nicaraguense concordou com a criação do GIEI em um momento de muita violência, desatada pelos protestos por uma reforma no sistema de aposentadorias e que se transformou em uma demanda pela saída do presidente Daniel Ortega, após 11 anos no poder.

O ex-guerrilheiro, de 72 anos, é acusado por opositores de corrupção, nepotismo e de instaurar uma ditadura junto com a sua esposa e vice-presidente, Rosario Murillo, feitos que Ortega nega.

No país também está atuando o Mecanismo de Acompanhamento Especial para a Nicarágua (Meseni), que foi mobilizado em 24 de junho e elaborou dois relatórios com os atos ocorridos a partir dessa data e, segundo o qual, reporta 317 mortes desde que explodiram os protestos.

"Não são bem-vindos em nosso país. Por isso, não serão recebidos em nosso solo pátrio", declarou o governo de Ortega sobre o "Grupo de Trabalho" integrado por 12 países-membros da OEA.

Essa entidade, qualificada como uma ingerência pelo governo, foi criada para contribuir na busca de uma solução à crise no país.

- Jornalistas ameaçados -

Nesta quinta-feira, uma organização humanitária anunciou que pedirá à CIDH medidas cautelares para mais de 60 jornalistas que foram intimidados ou ameaçados de morte por cobrir os protestos contra o governo, informou uma fonte sindical.

"Vamos pedir medidas cautelares" para mais de 60 jornalistas de veículos independentes e de oposição, declarou em entrevista coletiva o diretor da Comissão Permanente de Direitos Humanos (CPDH, local), Marcos Carmona.

Carmona fez o anúncio depois de receber denúncias de ameaças de morte a nove jornalistas da opositora Radio Corporación, de alcance nacional, que trabalham no interior do país.

"É preocupante que queiram calar os jornalistas por meio de ameaças, assédios e perseguição", assinalou Carmona, acrescentando que são "atos covardes de grupos afins ao governo" de Ortega.

Entre os afetados está um comunicador da cidade de Masaya (sul), Yilber Idiaquez, por cuja cabeça um desconhecido ofereceu 5.000 dólares nas redes sociais.

Parece "que estamos no Velho Oeste na Nicarágua", afirmou Carmona, em relação às recompensas que eram oferecidas pelos bandoleiros no Velho Oeste americano no século XIX.

Idiaquez, por sua vez, teme que essas ameaças estimulem "qualquer pessoa a atentar contra a minha integridade e de minha família", embora tenha dito que não irá parar de trabalhar.

A CIDH informou em julho que concedeu medidas cautelares a 64 nicaraguenses que se encontravam em grave risco devido à crise no país.