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Referendo na Itália deixa UE em estado de alerta

Derrota de Renzi pode levar à ascensão de forças populistas

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Mais do que validar ou não uma reforma constitucional, o referendo do próximo domingo na Itália pode selar também o destino do primeiro-ministro Matteo Renzi e será acompanhado com bastante atenção pela União Europeia.

Dá-se como certo que uma eventual vitória do "não" na consulta popular levaria à renúncia do premier, que vem governando com relativa estabilidade desde que assumiu o poder, em fevereiro de 2014, além de jogar o país em um novo período de incerteza.

Em uma nação que teve 63 governos nos 70 anos de sua história republicana, Renzi já está no Palácio Chigi há mais de mil dias sem precisar reformular sua coalizão, o quarto maior período desde 1946.

O premier disse em diversas ocasiões que renunciaria em caso de vitória do "não". Recentemente, amenizou o tom e afirmou que o futuro do governo não está ligado ao resultado do referendo, mas, nesta sexta-feira (2), seu próprio ministro de Infraestrutura, Graziano Delrio, declarou que Renzi pedirá demissão se a reforma não for aprovada pelo povo.

E é essa hipótese que assusta a União Europeia. Ainda que tenha se indisposto com Bruxelas em várias situações, principalmente nos debates sobre a crise migratória e a austeridade fiscal no bloco, o primeiro-ministro é um europeísta convicto e pretende se fortalecer com o "sim" para tentar reformar a UE.

Mas a alternativa a ele não tem a mesma postura. Quem mais pode ganhar com uma vitória do "não" é o partido populista e antissistema Movimento 5 Estrelas (M5S), do humorista Beppe Grillo. Após ter conquistado as prefeituras de Roma e Turim em meados do ano, a legenda vê no referendo do próximo domingo uma oportunidade de derrubar Renzi e chegar ao poder.

Em caso de renúncia, a prerrogativa de convocar novas eleições é do presidente Sergio Mattarella, que também poderia nomear outro político para formar um novo governo ou até mesmo manter o atual primeiro-ministro como chefe de um gabinete "técnico".

Porém a pressão para antecipar as eleições parlamentares será grande, já que as pesquisas apontam o M5S como a legenda mais popular do país, em situação de empate técnico com o centro-esquerdista Partido Democrático (PD), liderado por Renzi. Em seu estatuto, o movimento não prega o rompimento da Itália com a UE, mas defende sua saída da zona do euro.

Tal cenário, menos de um ano após a "Brexit", pode representar mais um golpe na União Europeia, justamente no momento em que a extrema-direita surge com chances de ganhar a Presidência da França e de alcançar um crescimento significativo na Alemanha.

Além disso, como publicou recentemente o diário "The Wall Street Journal", o referendo é mais uma oportunidade para o eleitor "dar um chute no establishment", ainda no calor da vitória de Donald Trump nos Estados Unidos, que foi celebrada pela oposição italiana.

Em privado, os líderes europeus alertam que a Itália representa atualmente o maior risco para a estabilidade da zona do euro, tanto que alguns deles vieram a público para defender a reforma constitucional, como a chanceler Angela Merkel. A preocupação também cruzou o Atlântico e chegou a Washington, onde o presidente Barack Obama dedicou seu último jantar de gala na Casa Branca a exaltar Renzi.

A vitória do "não" também colocaria dúvidas sobre a capacidade do país de seguir em um percurso de reformas que impulsione o crescimento econômico e reduza sua elevadíssima dívida pública, hoje em 130% do PIB.