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O que esconde Putin sob a mudança de responsáveis no Kremlin?

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Nesta semana o presidente russo Vladimir Putin realizou uma grande remodelação de altos funcionários regionais, demitiu o chefe do Serviço Aduaneiro Federal da Rússia substituiu o embaixador de Moscou na Ucrânia e fundiu a Crimeia com o Distrito Federal do Sul. Qual a finalidade destas manobras políticas? A Sputnik apresenta algumas opiniões.

Objetivos das mudanças 

O RBK, um portal russo de notícias de negócio, sugeriu que o objetivo geral das alterações foi “eliminar conflitos políticos em determinadas áreas [como no caso do ex-governador Menyailo em Sevastopol] trazer sangue novo aos cargos dirigentes de nível médio, nos quais o chefe de Estado deposita as esperanças nos próximos ciclos eleitorais".

O que é importante ter em mente aqui é que, depois de meados dos anos 2000 até 2012, quando os governadores eram nomeados pelo presidente, o chefe de Estado apoiou a reintrodução de  eleições diretas dos dirigentes regionais.

Ao mesmo tempo, cientistas políticos e analistas da mídia, tanto na Rússia como no estrangeiro, também fizeram nota do fato de que muitos dos novos governadores nomeados (nas regiões de Kaliningrado, Yaroslavl e Kirov) são representantes dos serviços de segurança da Rússia.

A agência Bloomberg proclamou a reorganização de "esforço do Kremlin para aumentar o papel dos serviços secretos nas regiões". Enquanto isso, The Moscow Times, um jornal de tendência liberal, até chamou as alterações do pessoal de "Game of Thrones de Putin: Os homens de farda assumem o poder". 

Será mesmo isso? Será realmente uma indicação de que a Rússia está indo em direção a algum tipo de ditadura dos serviços de segurança?

A resposta é claramente não. De acordo com o respeitado cientista político russo Aleksei Zudin, membro do conselho de peritos do Instituto de Moscou de Ciências Políticas e Socio-Econômicas, há muito boas razões políticas para colocar os ex-oficiais de segurança e militares nos mais altos cargos.

Em declarações à rede de notícias Tsargrad na quinta-feira, Zudin explicou que há duas considerações importantes para lembrar. "Em primeiro lugar, os políticos originários dos órgãos de segurança ou no serviço militar têm sido as forças mais ativas na realização dos esforços anti-corrupção do governo ao longo dos últimos anos".

Além disso, Zudin observou que o atual modelo de escolha dos governadores – eleições diretas – significa que os candidatos devem também corresponder às exigências de competência política por isso o passado militar não pode ser o único componente para a seleção dos governadores.

Outro tema especulado na mídia russa é que o presidente, tendo estado sempre muito focado na política externa do país, finalmente voltou a olhar para a política interna, tradicionalmente o domínio do primeiro-ministro e de outros dirigentes.

Zudin sugeriu que este também era um exagero:

 "Vou ser franco, eu não gosto deste tipo de sugestão, de que ‘o presidente se envolveu a fundo na política interna’, ou ‘se envolveu a fundo na política externa’. Vou dizer porquê: o presidente é o chefe do governo russo. Ele exerce suas funções e toma decisões sobre um determinado conjunto de questões. E no curso dessa atividade, o foco recai sobre ambos os assuntos nacionais e estrangeiras. Aqui, o que é importante não é o foco, que, como sabemos muda constantemente. O que é mais importante são as tarefas que estão definidas".

O analista explicou que "para poder participar efetivamente na política internacional como uma entidade verdadeiramente independente, a Rússia precisa de um governo eficiente com um sistema eficaz de autoridades do Estado e instituições políticas de alta qualidade. E esta é uma das razões que motivam Vladimir Putin, que está envolvido na política externa, a participar ativamente na política doméstica também".

Uma nota especial sobre a embaixada da Ucrânia

De acordo com analistas russos, a decisão de substituir Mikhail Zurabov, o embaixador da Rússia na Ucrânia, tem um significado importante.

Falando com a agência de notícias RIA Novosti, Andrei Suzdaltsev, o vice-chefe da Faculdade de Economia Mundial e Relações Internacionais na Escola Superior de Economia de Moscou, enfatizou que a demissão de Zurabov é uma decisão que terá consequências de grande alcance para a política externa da Rússia em relação à Ucrânia e seus parceiros ocidentais.

Suzdaltsev observou que a avaliação negativa do trabalho do ex-embaixador tem a ver com uma posição muito passiva no início da crise política em Kiev, em 2014. Naquela época, enquanto os norte-americanos, embaixadas canadenses e europeias estavam ativamente engajados no apoio e promoção dos manifestantes de Maidan e os seus apoiantes políticos, a embaixada da Rússia manteve-se extremamente passiva.

No lado positivo, Suzdaltsev sugeriu que "o fato de a Rússia e a Ucrânia não terem entrado no confronto aberto entre 2014 e 2015", no auge da crise, "é, sem dúvida, uma importante contribuição" de Zurabov e da sua equipe.

Segundo o especialista, a Embaixada da Rússia em Kiev hoje desempenha um papel crucial, comparável às missões diplomáticas da Rússia em grandes potências do mundo. Isto tem a ver com uma forte ligação da Rússia com a Ucrânia como uma nação fraterna que "nunca será considerada estrangeira para a Rússia".

Os analistas têm repetidamente apontado para o fato de que o ex-embaixador tinha uma relação pessoal muito próxima com o presidente ucraniano, Pyotr Poroshenko e com outros membros da elite política.

O afastamento de Zurabov, diz, é uma indicação de que “Moscou estabeleceu novas prioridades nas suas relações com a Ucrânia e com os países ocidentais que apoiam Kiev. É um elemento dessa nova linha, que não conhecemos plenamente". Em qualquer caso, de acordo com o analista, "a liderança russa parece estar decidida a selecionar pessoas de uma nova formação para seus postos diplomáticos".