ASSINE
search button

"Um novo muro de Berlim e voltar à Guerra Fria", diz governo ucraniano

Compartilhar

"Os fatos de hoje estão começando a colocar em perigo a Europa e a União Europeia. Agora está claro que nossos vizinhos russos decidiram construir um novo muro de Berlim e voltar à Guerra Fria. O governo russo deve encerrar imediatamente seus grupos de inteligência diversivos, condenar os terroristas e exigir que eles libertem os prédios. Isso é, se a Federação Russa estiver interessada na estabilização da situação, o que eu tenho dúvidas significativas”, com essa declaração o primeiro ministro ucraniano, Arseni Yatseniuk, levantou nesta quarta-feira (16) uma profunda discussão política e econômica sobre uma possível guerra na Europa.

A declaração de Yatseniuk não parece distante da realidade. Em um telefonema para Vladimir Putin, o presidente americano, Barack Obama, pediu para que o presidente russo convença grupos separatistas a se retirarem dos prédios públicos, que foram ocupados no leste da Ucrânia. Ativistas pró e anti-Rússia têm promovido manifestações e, frequentemente, se enfrentado com violência. Obama disse a Putin que estaria preocupado com o “apoio do governo russo às ações separatistas armados pró-Rússia que ameaçam desestabilizar o governo ucraniano". A declaração teria desagradado o russo, que negou o apoio aos milicianos.

Vale lembrar que, durante o referendo que anexou a Crimeia à Rússia, os Estados Unidos e a União Europeia não reconheceram a negociação como legítima. Na ocasião, Obama emitiu ordens de sancionar sete funcionários do governo de Moscou, sendo eles, Dmitri Rogozin (primeiro-ministro russo), Valentina Matvienko (presidente do Conselho da Federação), Vladislov Surkov e Sergei Glazyev (conselheiros ligados ao presidente) e mais dois legisladores da Duma.

Diante da situação de tensões constantes, na segunda-feira (14), o Presidente Interino da Ucrânia, Aleksandr Turchinov, solicitou ao secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, que enviasse tropas de pacificação para o leste do país. Contudo, Ban descartou a possibilidade, alegando que não seria uma solução prática e que, para isso, dependeria de um mandato do Conselho de Segurança da ONU. A questão é que a Rússia é um dos cinco membros permanentes do Conselho e, assim, pode vetar qualquer resolução da ONU sobre o envio de tropas. Sem alternativas, nesta última terça-feira (15), a Ucrânia combateu rebeldes pró-russos que ocupavam um campo de avião na cidade de Kramatorsk.

Posição da Embaixada

Em nota, a Embaixada Russa no Brasil comentou a declaração do primeiro ministro ucraniano. Leia a nota:

"Destaca-se o fato de as forças ocidentais recolherem qualquer especulação distribuída por atuais autoridades de Kiev para justificar as acusações contra a Rússia da instigação e praticamente organização de tumultos no sudeste da Ucrânia. Assim são, por exemplo, dois comunicados de imprensa compostos às pressas, de 13 de abril, com monte de  'fatos' duvidosos sobre envolvimento das forças especiais russas na apreensão de prédios administrativos e coordenação de protestos. A qualidade de tal 'propaganda' pode ser julgada pela  tal 'prova' convincente como rifles automáticos 'Kalashnikov' vistos nas mãos de alguns manifestantes em uniformes camuflados. Como se as autoridades ocidentais não estivessem cientes de que os AK-47 estão em serviço no exército ucraniano e nas forças de segurança.

Não suporta nenhuma crítica a tese avançada por Ocidente de compromisso temporário do governo ucraniano de 'proteger os direitos de todos os cidadãos'. Não se pode negar o óbvio - o partido rusófobo, anti-semita 'Svoboda', liderado por O.Tiagnibok recebeu, como o resultado do golpe de estado, várias pastas ministeriais e o cargo do Procurador-Geral .

Mas o problema principal não é só distorção dos fatos, é a falta de vontade ou incapacidade de ver a realidade como ela realmente é, é a tentativa de impor ao resto do mundo uma percepção distorcida do que está acontecendo no sudeste da Ucrânia. Justificar as ações dos 'heróis de Maidan', chamando-as de uma revolução popular, e chamar protestos em Donetsk, Kharkiv, Lugansk, Slaviansk e outras cidades de ataques terroristas coordenadas de fora - tudo isso representa não apenas padrões duplos, mas é hipocrisia descarada.

As pessoas que usurparam o poder em Kiev através de um golpe não estão fazendo nada para normalizar a situação no país, por meio de elaboração transparente de uma reforma constitucional com a participação de todas as forças políticas e das regiões da Ucrânia, a implementação das reformas necessárias para garantir uma vida confortável e segura para todos, sem exceção, cidadãos ucranianos.

Ninguém mencionou nenhuma palavra sobre a força de ordem criminosa de A.Turchinov dirigida a sufocar os protestos dos moradores do Sudeste da Ucrânia, o que contraria a Constituição e senso comum".

Jornal do Brasil não conseguiu contato com a Embaixada Americana.

Opinião brasileira

Para o coordenador do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), Leonardo Paz, a possibilidade de ocorrer uma guerra na Europa é baixa. O diplomata também comentou a afirmação do primeiro ministro da Ucrânia. 

"Eu sou um pouco crítico em relação às declarações do Arseni Yatseniuk porque acho que ele usa palavras muito fortes para o cargo dele. Cargo este que ele assumiu há pouco tempo. Eu não acredito em uma Guerra Fria. A Rússia hoje é mais organizada e potente e está tentando atrair países para fortalecer a sua influência. Daí a importância da Ucrânia", explica Paz.

Sobre a possibilidade de uma guerra envolvendo o Ocidente e a Europa, o diplomata acredita que, se houver uma possibilidade, ela é remota. "Não acredito que nenhum país esteja disposto a lutar pela Ucrânia - ou para qualquer outro país - a esse ponto. É claro que não podemos descartar conflitos de menores proporções, como já estamos vendo. É preciso diferenciar guerra de conflito. Uma guerra tem um preço muito alto. Até mesmo as sanções que o Ocidente está impondo são risíveis porque não atingem diretamente a Rússia, são pequenas", analisa.

Entenda o caso

As divergências entre Ucrânia e Rússia, tiveram início em novembro de 2013, quando Viktor Yanukovich, então presidente ucraniano, voltou atrás com a decisão de assinar um acordo de livre comércio e associação política com a União Europeia. Yanukovich alegou que havia decidido buscar relações comerciais mais profundas com a Rússia e enfrentou resistência da oposição e de parte da população. Manifestantes foram às ruas e realizaram protestos violentos. No dia 22 de fevereiro de 2014, o Parlamento destituiu Yanukovich e antecipou as eleições para o dia 25 de maio.

O quadro se agravou com as tensões separatistas na península da Crimeia, de maioria russa. A saída encontrada foi a realização de um referendo, que acabou com a aprovação da adesão da península à Rússia. O presidente russo, Vladmir Putin, incorporou o território, desconsiderando a opinião do Ocidente e outras regiões ao leste da Ucrância começaram a enfrentar tensões separatistas.

Yanukovich anunciou que a desistência do acordo com a União Europeia foi motivada por pressão russa. Segundo o então presidente ucraniano, ele teria recebido ameaças de Moscou sobre o corte de fornecimento de gás e medidas protecionistas, que dificultariam o acesso dos produtos ucranianos ao mercado russo. As ameaças foram criticadas pelo bloco europeu.

* Do Projeto de Estágio do Jornal do Brasil