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No 3º dia de Lollapalooza, vocalistas brilham e Pearl Jam faz show militante

Líderes do Kaiser Chiefs e da banda sueca The Hives dão banho de carisma e conquistam festival

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Se você estava quase certo que o Lollapalooza Brasil poderia também ser chamado de 'convenção pantanosa de hipsters', o terceiro e último dia de festival, ontem (31), no Jockey Club de São Paulo, contradisse e muito tal 'acusação'. Pois, sem dúvida, a última jornada de shows do evento recebeu um público com os pezinhos bem fincados não somente na lama, obviamente, como também no tal do rock. De preferência, hard ou grunge. Aproximadamente 60 mil pessoas prontinhas para curtir mais uma apresentação do Pearl Jam. Uma espera longa, mas que, no final das contas, definitivamente valeu a pena.

Mas, antes, lá no início do caminho, os ingleses do Foals já abriam os trabalhos no palco Butantã com uma apresentação incendiária e digna de nota. Com seu rock que passeia entre o clássico indie (e suas guitarrinhas levemente nervosas), o punk e o rock progressivo, a banda conquistou facilmente a plateia que chegou cedo ao Jockey, principalmente com a entrega do vocalista Yannis Philippakis, de uma melancolia envolvente. Uma performance, no mínimo, respeitável, destes rapazes que vêm abrindo shows do Red Hot Chili Peppers em turnê pelos EUA.

Logo depois, no palco Cidade Jardim, subiu ao palco mais uma vez (no sábado, ele já havia se apresentado no festival com o projeto A Perfect Circle) Maynard James Keenan e sua banda Puscifer, em uma apresentação de um country delirante regada a muito vinho. Aliás, somente sob efeito de muito álcool para (de repente) curtir o show comandado pelo (também) vocalista da banda Tool. Sem dúvida, o grande destaque do show do Puscifer foi a presença de Eddie Vedder, frontman do Pearl Jam, assumindo os teclados da faixa 'The rapture'. E só.

Ricky Wilson, vocalista do Kaiser Chiefs, mostrou muito mais do que 'presença de palco' durante a performance da banda britânica, cinco anos após sua última (e única) passagem pelo Brasil. Bem mais magro do que estava quando nos visitou em 2008, Ricky fez questão de demonstrar seu condicionamento físico escalando torres da estrutura do festival, para delírio geral. Uma dedicação que ofuscou, inclusive, o som tenebroso que, como de praxe, atrapalhou (e muito) o desempenho de vários shows, como o do Kaiser Chiefs.

Mas, superando qualquer falha técnica, Ricky e seus companheiros deram conta do recado, levando o público a uma pequena viagem no túnel do tempo do indie rock e do new wave, com sucessos como 'Ruby', 'I predict a riot' e 'Everyday i love you less and less'. 

Talvez a animação de Ricky só tenha sido encarada de frente pela eletrizante aparição de Pelle Almqvist, líder do The Hives: vestido com um elegante fraque, o frontman do grupo sueco foi um mestre-de-cerimônia carismático e explosivo, como já era de se esperar. A cada faixa da banda, com seu punk de garagem legítimo, Pelle convocava o público. Chegou a descer do palco para dar um autógrafo a um fã. Lia frases inteiras em português, como: 'Brasil, nós amamos vocês. E vocês, amam a gente?'. Carinho devidamente retribuído com uma plateia em alta voltagem, muito por conta da proximidade do grande momento do derradeiro dia. Ao fim, 'Tick tick boom', maior hit do Hives, fechando a tampa de um show divertidíssimo.

Do outro lado do Jockey, ao fim da passagem dos suecos, uma banda genuinamente brasileira iniciava seu 'barulho'. Era o Planet Hemp, sob a liderança carismática de Marcelo D2, que dividiu o show em 'atos', de acordo com a cronologia dos três álbuns de estúdio do grupo. Ela, a maconha, sempre protagonista das letras, era mesclada com citações políticas, principalmente por BNegão, que fez questão de mencionar os índios removidos da Aldeia Maracanã, no Rio, e também a polêmica presença do deputado Marco Feliciano à frente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados. 

Uma performance, como sempre, politizada e ovacionada, mas que, aos poucos, foi perdendo quórum por conta da iminência do show do Pearl Jam, no palco principal. Assim, como por exemplo, talvez a passagem enlouquecedora do projeto Major Lazer, liderado pelo DJ e produtor americano Diplo, não tenha recebido a devida atenção na tenda Perry.

No set criado pelo ex-marido da cantora MIA (e executado ao lado dos DJ's Jillionaire e Washly Fire), a forte presença do funk carioca (Diplo é um amante do Rio e do ritmo), com direito ao 'Passinho do Volante', aquele do 'Ah, lelek, lek lek'. E, claro, sem deixar de fora o viral 'Harlem shake', lançado pela Mad Decent, gravadora de Diplo. Uma verdadeira festa com o que de mais atual poderia existir em termos de 'febre'. Esse sim, sabe decodificar a alma popular do brasileiro.

Mas, a despeito de qualquer 'night' que estivesse ocorrendo na tenda eletrônica, os olhos (e ouvidos) a esta altura já estavam todos voltados para o palco Cidade Jardim, onde começava a última apresentação do Lollapalooza Brasil 2013. 'Feliz Páscoa', soltou Eddie Vedder, em português, logo nos primeiros minutos da apresentação dos americanos do Pearl Jam, cuja transmissão pela TV foi vetada, assim como a presença de mais de 20 fotógrafos à frente do palco durante o show.

Uma certa antipatia que em nada pode ser comparada à reconhecida presença marcante de Eddie em ação: com um setlist extenso de 27 faixas e 2h10 de apresentação, o frontman do grupo de Seattle dominou com facilidade (e até certa sobriedade) o público, ávido pelos hits do Pearl Jam. Detalhe: nenhum ficou de fora. 'Do the evolution', 'Even flow', 'Daughter', 'Corduroy', 'Given to fly', 'Alive', 'Jeremy' e 'Black': estava tudo ali.

E assim foi se desenhando a passagem do Pearl Jam pelo Lollapalooza. Uma maratona de sucessos, como se, acima de tudo, Eddie e seus parceiros estivessem ali para realizar o desejo de seus fãs. Básico, não é mesmo? Mas não menos eficiente por isso. Um artista 'dizer' o que seu público quer ouvir é passo primordial para o êxito. Mas, dizer, literalmente, mais do que estão esperando pode ser um diferencial e tanto.

"Parabéns, São Paulo, por respeitar casamentos entre pessoas do mesmo sexo", soltou Eddie, novamente em português, para aclamação geral. E assim, entre o papel correto como artista e o complemento admirável como cidadão, Eddie e o Pearl Jam demonstram facilmente o porquê de mais de 20 anos de sucesso, o porquê de serem os dinossauros sobreviventes da onda grunge do início dos 90's e o porquê de conseguirem arrastar 60 mil pessoas para o Lollapalooza em um domingo de Páscoa. Aplausos.

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