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Preto no branco

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Nestas horas em que o Congresso Nacional pretende se ocupar, quase exclusivamente, das coisas da campanha eleitoral dos homens e mulheres que o integram, pareceria fora de propósito pedir atenção para outras questões, ainda que revestidas de seriedade. Mas senadores e deputados não podem consentir serem meros expectadores, ante os entendimentos que, nos últimos dias, vêm se processando, discretamente, entre as chancelarias brasileira e americana, com vistas à criação de novos instrumentos nas relações entre os dois países; na verdade, são eles a base de um vasto esquema de convivência, que em alguns pontos amplia o que naturalmente já é existente, mas também inova, sob outros aspectos.

A participação legislativa é, por isso mesmo, indispensável, sobretudo quando as consultas abrangem aspectos de segurança. Principalmente quanto a esse item, os acordos entre os dois países envolvem certas sutilezas, porque nesse campo – é forçoso reconhecer - são eles, não nós, que têm maior influência e poder para tomar decisões finais. 

Nada mais insinuante que tal diferença para reclamar a participação das comissões de Segurança e Relações Exteriores do Congresso, nem que, para tanto, seus integrantes se vejam obrigados a sacrificar alguns dias de campanha eleitoral. A celebração do vultoso acerto com os norte-americanos, estando bem definida, deve atentar para o fato de que pode se tornar lesiva aos interesses nacionais, se eles cederem a incondicionalidades, algo perigoso em qualquer acordo. É naquelas Comissões que deve ecoar a conveniência brasileira em relação ao que se sugere para compor a pauta do que se convencionou chamar de Foro Permanente de Segurança. 

Seria precipitado condenar, adredemente, as boas intenções anunciadas, entre as quais o combate ao tráfico, ao terrorismo e à má utilização dos recursos cibernéticos. Mas também nessas questões é inaceitável dispensar claras definições de compromissos bipartites sobre os valores em causa. Porque, bem avaliados os objetivos, parece claro que, se o maior poder de decisões caberia sempre aos Estados Unidos, não ao Brasil, preocupa saber que o vizinho do norte, podendo mais, há de avocar a si a última palavra. 

Não menos importante, no bojo das discussões que se travam entre as chancelarias, é pensar na repercussão e nas influências decorrentes dessa proposta nas relações do Brasil com os demais países latino-americanos. É certo, deve-se admitir, nem sempre correm paralelos nossos pontos de vista sobre o nível de intervenções políticas e econômicas na soberania dos povos. Num exemplo meramente ilustrativo, sem nada pretender insinuar, se Washington decretasse pesadas sanções sobre a Venezuela, depois de concluir que o país acaba de passar pela reeleição do presidente Maduro, tida como fraudulenta e viciada, o Brasil, ainda que a condene, não deixaria de adotar a tradição do não intervencionismo. Como conviveria, nesse Foro que se organiza, se os Estados Unidos pensarem, como efetivamente pensam, a favor de ações diretas sobre Caracas? 

Tudo concorrendo para que se exija o concurso do Legislativo no evolução desse projeto. Porque os horizontes que recomendam ações conjuntas, importantes nas relações internacionais, são os mesmos que pedem limites e prudência, em nome da soberania.