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Fôlego para a Justiça

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Por oportuno, deem-se as boas-vindas à mais recente iniciativa destinada a desafogar a Justiça brasileira, pelo menos nas instâncias em que esse esforço se revelar mais urgente. É o que pretende e propôs, ainda agora, o estudo encaminhado ao Congresso Nacional pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. Desse pretendido desafogo resultaria, como expectativa maior, a celeridade nos procedimentos judiciais, de forma que a sociedade possa ter a seu serviço a Justiça ideal; essa mesma que, quando se torna morosa nas tramitações, acaba se tornando injusta. Para sustentar tal preocupação, bastaria lembrar que são centenas, talvez milhares, os casos em que os processos se esgotam no tempo, e os criminosos acabam ganhando liberdade imerecida. Quando eles são influentes e envelhecem, lançam mão do benefício da prescrição; como se chegar aos 70 anos de idade fosse razão para impunidade e misericórdia. 

O anteprojeto, como se percebe, não tem pretensão de dispensar outras iniciativas, que a ele haverão de se associar para aperfeiçoá-lo. Nesse sentido, parecem inevitáveis algumas emendas, como a que pretenderá, certamente, eliminar a proposta de ampliação de 30 para 40 anos o teto das condenações. É sabido que o problema maior não está na duração da liberdade cerceada, mas na profusão dos recursos, que acabam por reduzir as penas, às vezes, à terça parte do que se prolatou nas sentenças. Expedientes não faltam. Acabamos de ver: graças às gentilezas do tribunal, somos um país em que a moça presa por matar a genitora é liberada para visitar o túmulo dela, exatamente no Dia das Mães... Muitas liberalidades tentam se explicar no princípio ideal da ressocialização; a ponto de esquecermos que, a antecipá-la, o primeiro dever da Justiça é aplicar o castigo.

A conversão de alguns tipos de condenação em obrigação de reparo ou prestação de serviços à comunidade surge como outro ponto contemplado e ampliado no anteprojeto do ministro Moraes. Leva-se em contra, no caso, o argumento irrecusável de que há uma vasta população carcerária formada por delinquentes, sem maiores riscos para a segurança pública. Preferencialmente, os presídios estariam destinados aos que praticaram crimes mais graves. Bem mensurado, esse seria um passo importante, sem falar da necessidade de imediato levantamento da população presa com condenação cumprida, e espera da soltura, que demora na burocracia dos cartórios. Um dos entulhos a remover. 

Qualquer que for o lado da Justiça em que se coloque o observador, há questões a exigir ações corretivas ou atualizações. É o que assegura a voz do povo; mas, antes dele, a voz dos juízes, serventuários e advogados experientes na tarefa de defender as partes, para lembrar que o novo estudo encaminhado ao Congresso tem outra contribuição importante. Ele também representa, concretamente, um estímulo ao Legislativo e aos juristas a aprofundar análises do interesse dos jurisdicionados sob outros aspectos, além dos propostos pelo ministro. 

É o caso da delação premiada, que só mais recentemente passou a sensibilizar os estudiosos, como contribuição paralela ao combate à corrupção. A delação é apenas instrumento de apuração do crime, e não pode deixar de se valer de critérios e normas convincentes ao ser acordada. Um cuidado indispensável, no momento em que a Justiça passa se valer de informações produzidas por agentes políticos no mínimo suspeitos, muitas vezes preocupados apenas em se safar de responsabilidades; ou se deixam conduzir pelo desejo de vinganças e represálias. Indício não é sintoma, sintoma não é fato. 

O anteprojeto originário da corte suprema não pretende cuidar de delações, mas ela sabe muito bem que se trata de uma faca de dois gumes, com o risco de cortar em ambos os lados.