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Cartões de delírio

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Dois meses serão suficientes, sem necessidade da prorrogação de prazos, para que cheguem à conclusão os estudos em curso no Congresso Nacional sobre um dos grandes escândalos que ocorrem, premiado pela impunidade: o exorbitante custo do dinheiro tomado pela via dos cartões de crédito. A promessa de apresentação de relatório conclusivo é da Comissão Parlamentar de Inquérito, que se instalou no Senado, para aprofundar pesquisas e propor um basta. Ainda que se trate de assunto complexo, a violência dos juros aplicados é tamanha, que as evidências já saltam aos olhos, sem maiores esforços. Os senadores que tratam diretamente com os dados levantados confessam-se pasmos, diante de uma distorção que se afigura como crime, sem que o governo adote medidas capazes de conter o apetite das instituições financeiras. 

O Banco Central, vez por outra, ameace reação, mas sempre em doses modestas, insuficientes para assustar os banqueiros, que, tão confiantes em seu poder de persuasão, provavelmente, mais uma vez, não estejam preocupados. As CPIs do Congresso têm uma tradição de deixar de lado culpas e culpados, e os banqueiros, pensam eles, não seriam gente diferente. 

No caso dos cartões de crédito, a esperança de que é possível chegar-se a alguma conclusão, e, a partir daí, sejam anunciadas providências indispensáveis, é que o custo desse serviço assumiu proporções que não podem ser mais toleradas. Este é um fato concreto. As taxas no setor ignoram indicativos financeiros paralelos, que, se colocados em comparação, constituiriam, por si só, advertência contra o assalto. Desconhecem as instituições financeiras, por exemplo, a queda da inflação e a Selic, esta gerando influência nas ações interbancárias. 

Graças a esse descaso velhaco, quando o Banco Central anuncia a Selic em 6%, os agentes de cartões de crédito fazem ouvidos de mercador. Já chegaram a operar com 440% ao ano. Claro, quando são chamados a se explicar, o que raramente acontece, enumeram uma série de artifícios que, se não convencem os tomadores, muito menos os integrantes da CPI, há meses estudando e se espantando com o que veem. Sobre a clareza dos dados que vão compor o relatório da comissão, prova o fato de que apenas dez depoimentos, nada mais que isso, vão ser tomados até fins de junho. Não é preciso consumir muito tempo com o óbvio; com o que todo mundo já sabe.  

Os bancos costumam propor a comparação de seus serviços com os mesmos que são prestados em outros países, escudados em um nível tecnológico não comum nos demais. Mas, quando se pretende estabelecer analogia no campo dos cartões de crédito, logo desconversam, porque não há como justificar a brutalidade que praticam no Brasil. Nem poderiam permitir, pois, quando se trata da taxa no México, Argentina, Peru, Colômbia e outros mais próximos, o custo do cartão oscila entre 47% e 25%. 

De volta à pátria, para quem ainda não se assustou o bastante em relação ao abuso, bastaria tomar como exemplo que, mantidas as taxas atuais do cartão, se uma pessoa emprestasse, hoje, um real, dentro de dez anos teria o reembolso de R$ 640 milhões... 

Mas por que chegamos a esse ponto? A explicação está na sonolência dos governos –  todos os governos -, que nas campanhas eleitorais servem-se à tripa-forra das gentilezas dos banqueiros. Por isso, quedam impotentes ante os abusos de gentis patrocinadores