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Pressões em ?m de governo

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É provável que o governo do presidente Michel Temer não consiga escapar do destino com que foram contemplados muitos dos antecessores. Ao se aproximarem do estertor de sua gestão, sofreram toda sorte de pressões de grupos políticos empenhados em extrair o máximo possível do poder; o poder da hora, que logo estará caminhando para outros donos. Hoje, percebem-se os primeiros sinais de que o fenômeno voraz tem tudo para ser reeditado. Lamentavelmente. Poucos, entre os que antecederam o atual, ostentaram tamanho ânimo para conceder, sempre ameaçado pelo fatal risco da ingovernabilidade. Sobretudo, quando se cuida de receber postulações de deputados e senadores. O presidente, com a experiência de velho integrante da Câmara, que também dirigiu, sabe, e não nega, que é a partir dali que se organiza a caminhada do Executivo. 

Esse tipo de diálogo no balcão, ainda que à custa de enorme sacrifício, pode levar o governante a superar as sucessivas crises que abalaram e ainda abalam o Planalto. Sem isso, Temer provavelmente não resistiria. É o exercício de algo que, contrastado com a realidade dos fatos, pode ganhar, como eufemismo, o rótulo de composição em nome dos interesses nacionais... Pouco difere do modelo de “composição” que Jânio Quadros, Fernando Collor e Dilma não souberam ou não se dispuseram a seguir, e, por isso, sentiram na pele que o monólogo, voz em mão única, não é parte do receituário do Congresso Nacional. Àqueles três exemplos sucederam-se graves problemas para as instituições, alguns até hoje mantidos vivos na memória política. 

Ideal seria não admitir pressões em nome dos interesses subalternos,  quando se distanciam das pautas legítimas da sociedade. Mas esse jogo   existe, tem influência e prestígio suficientes para que não seja desconsiderado. Em rigor, é preciso reconhecer e confessar claramente o fenômeno corrosivo nas relações entre poderes como primeiro passo para combatê-lo, restando a esperança de que, um dia, possa ser dominado em nome da moral e da ética. Não nessas horas, quando, além dos vícios  de sempre, predomina a dieta eleitoral, prescrita por um desejo incontrolável de consumir cargos, dinheiro e benesses. 

Não custa alimentar a esperança. No elenco dos aperfeiçoamentos desejáveis para a organização política brasileira, tempo haverá em que, bem filtrados pelo voto consciente, e envergonhados na prática de deslizes, parlamentares e dirigentes partidários se sentirão desestimulados a transformar seus anseios e projetos pessoais em objeto de troca com o poder. Quando isso for possível, os presidentes se verão dispensados de deixar o governo em condições de raquitismo e abatimento,  tal o volume dos caros  favores prestados.

Para hoje e para sempre, políticos profissionais precisam conter a sede e o apetite, mais ainda quando o presidente caminha para o fim, já  exaurido. Devem os postulantes comportar-se como bactérias benignas, que discretamente obtêm coisas do governo, sem acabar com as forças dele; ao contrário do papel que exercem as bactérias malignas, que destroem o corpo onde sugam. 

Entre os que preparam, em Brasília, os pacotes de reivindicações finais, com olhos voltados para as eleições, a maioria se compõe de governistas,  muitos já acenando com a promessa de desembarcar da nau capitânia do comandante Temer, onde navegou longamente a solidariedade conjuntural; esse tipo de solidariedade que tem fôlego calculado com rigorosa precisão: só vive enquanto o poder dura.