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A farra dos refri, R$ 8,5 bilhões

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Quando assumiu o ministério da Fazenda, há três meses, Eduardo Guardia, ex-secretário Geral de Henrique Meirelles, traçara como meta reforçar o caixa com a reoneração da folha de pagamentos de alguns setores, as privatizações, como a da Eletrobras e suas subsidiárias, e a revisão da cessão onerosa entre a Petrobras e a União, com venda do excedente que coubesse à União. Foi atropelado pelas concessões que o governo teve de fazer na greve dos caminhoneiros. O que parecia ruim, com o baixo crescimento da economia, ficou pior. 

Nesta semana, a última de atuação do Congresso antes do recesso de 17 de junho a 1º de agosto - quando já estiver elaborado o Orçamento da União de 2019, para a votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias até fins de agosto-, a Câmara e o Senado aprovaram uma enxurrada de pautas-bomba de despesas e benefícios fiscais que podem ampliar em R$ 100 bilhões o rombo  que Guardia tentava reduzir para 2019.

Uma das manobras de aumento de gastos foi orquestrada no Senado na terça-feira, 10, pela bancada do Amazonas que entrou com duas propostas de projetos de decreto, para defender a manutenção do regime anterior aos fabricantes de refrigerantes na Zona Franca. Em 30 de maio, o governo editou o Decreto 9.394, que reduzia a alíquota do IPI sobre o xarope utilizado na produção de refrigerantes de 20% para 4%.

Estranho? A redução do imposto não agradou porque igualou a alíquota à cobrada no produto final. Antes, a diferença nos percentuais era aproveitada pelas empresas de refrigerante para gerar créditos usados para abater impostos no cotejo de IPI e ICMS. 

O decreto foi uma das medidas adotadas pelo governo para bancar o subsídio do preço do diesel aos caminhoneiros. A expectativa era arrecadar R$ 740 milhões em 2018 com a mudança, já que as empresas instaladas na ZF são isentas (e em 2019, pode gerar perdas de R$ 8,5 bilhões). Mais do que isso, impedia um dos maiores golpes fiscais do país: o uso do crédito prêmio de IPI para abater ICMS e “fabricar” dinheiro em Notas Fiscais, sem contrapartida de produtos. As malandragens da ZF de Manaus já sustentaram cadeias de eletrodomésticos que faliram no século XX, quando a Receita fechou o cerco. Cervejas pagam 56% de impostos e refrigerantes, 45% na garrafa e 46% na lata. Mas, a AmBev, para um faturamento anual de R$ 48 bilhões, tem pago um máximo de R$ 5 bilhões em impostos. Algo não bate.

A manobra se ampliou para o setor de refrigerantes. Mesmo sendo produto condenado nos Estados Unidos por causar doenças graves, como o diabetes e as consequências nefastas da obesidade para a saúde individual e o sistema público do SUS, a força do lobby dos refrigerantes é grande. Estão entre os cinco maiores anunciantes do país. Sua representação é feita pela Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas Não Alcóolicas (Abir), presidida por Alexandre Jobim, filho do ex-ministro Nelson Jobim (no governo FHC, que o indicou ao STF, e depois, como ministro da Defesa de Lula).

Na defesa das duas gigantes do refrigerante, a americana Coca-Cola e a multinacional brasileira AmBev (que produzem na ZF de Manaus os xaropes de coca, e guaraná), a combativa senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB - AM), apresentou projeto defendendo a volta do imposto de 20% aos gigantes do refrigerante, com apoio dos senadores do estado, Eduardo Braga, ex-governador (MDB) e Omar Aziz (PSD). Senadores de outros estados, como Ana Amélia (PP-RS), Lindberg Farias (PR-RJ) e Tasso Jereissati (PSDB-CE), reclamavam da concorrência desleal. 

Ana Amélia criticou o projeto de decreto pelas perdas para as empresas gaúchas. “Embora a legalidade do pleito dos senadores do Amazonas, como senadora do Rio Grande tenho que pensar e defender os interesses do meu estado”, disse. Lindberg fez coro: “Elas [empresas da Zona Franca] não pagam imposto e recebem em crédito. No momento em que o governo fecha farmácias populares, vamos dar R$ 7 bilhões de subsídio para a Coca-Cola?”, criticou.