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MPF: rede de 51 doleiros lavou R$ 1,6 bilhão em 3 mil off shores em paraísos fiscais

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A Operação Câmbio, Desligo, deflagrada ontem pelo Ministério Público Federal (MPF), Polícia Federal e Receita Federal, com apoio de autoridades do Uruguai, desarticulou “grandioso esquema de movimentação de ilícitos no Brasil e no exterior”. As operações eram do tipo dólar-cabo, forma de movimentação paralela, sem passar pelo sistema bancário, de entrega de dinheiro em espécie, pagamento de boletos e compra e venda de cheques de comércio. 

Foram expedidos 49 mandados de prisão preventiva, dos quais seis no exterior, quatro de prisão temporária e 51 de busca e apreensão. As buscas foram feitas no Uruguai e Paraguai, nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e no Distrito Federal, naquela que os procuradores da Lava Jato no Rio de Janeiro consideram a maior operação da força-tarefa no RJ. Segundo o MPF, o esquema funcionou por “décadas”, de forma interligada com diferentes núcleos em uma rede de lavagem de dinheiro e evasão de divisas. 

A investigação começou com a colaboração premiada dos doleiros Vinícius Claret, conhecido como Juca Bala, e Cláudio Barbosa, presos em março de 2017 no Uruguai e soltos ontem, quando venceu o prazo da prisão temporária. Eles apresentaram um HD com farta documentação do esquema. O procurador Eduardo El Hage disse que Juca e Tony foram apontados por Renato Chebar, doleiro e operador do esquema do ex-governador Sérgio Cabral, segundo o qual, desde 2007, foi necessário recorrer a outros doleiros devido ao aumento considerável do volume de operações na gestão Cabral. Os procuradores contaram ontem que, desde o final do século passado, foi montada complexa rede de doleiros, com base no Brasil. Com o aumento da fiscalização no país, a partir de 2002, alguns doleiros se fixaram no Uruguai. A rede operava com um sistema informatizado próprio, o Bankdrop, além de esquema de registro de operações, chamado ST, no qual constavam os débitos e créditos de cada conta. A rede movimentou cerca de R$ 1 milhão por dia, entre os anos de 2010 e 2016, em um volume total que passou de US$ 1,6 bilhão no período. Foram identificadas mais de 3 mil empresas off shores relacionadas ao grupo em 52 países. “Esses doleiros acionavam outros doleiros, o que permitia que as operações fossem feitas compensando o dinheiro em espécie que era entregue no Brasil pela organização criminosa do Sérgio Cabral, com os dólares que eram depositados em centenas de contas no exterior”, acrescentou El Hage. 

De acordo com os procuradores, o valor referente ao esquema de Sérgio Cabral nessa rede seria de US$ 100 milhões. As investigações continuam para identificar os responsáveis pelas off shores do esquema. Na operação foram identificados operadores financeiros e doleiros ligados a esquemas de evasão de divisas, como o do Banestado, do Trensalão do PSDB de São Paulo, de PC Farias, da Odebrecht e da JBS, acrescentaram os procuradores. “Com isso, vemos como as organizações se interligam e entrelaçam. Nesta operação , temos os doleiros da JBS, Paco e Raul, presos no Uruguai. Tem também o operador financeiro do Artur Pinheiro Machado, que atuava com desvios de fundos de pensão, os irmãos Chebar, que atuavam com o Sérgio Cabral, a família Matalon, em São Paulo, que atua há décadas. E esperamos que, com o decorrer das investigações, surjam outros esquemas criminosos”, ressaltaram os procuradores. No fim da tarde, o Juiz Marcelo Bretas, mandou colocar tornezeleira eletrônica nos doleiros Henrique Chueke e Marcos Ernst Matalon, por terem mais de 80 anos. 

Messer, amigo do presidente paraguaio

Principal alvo da Operação “Câmbio, desligo”, deflagrada ontem pela Polícia Federal, o doleiro Dario Messer é acusado de operar repasses milionários de propinas ao ex-governador do Rio, Sérgio Cabral (MDB). Descrito pelos delatores da Lava Jato Vinicius Claret, o Juca Bala, e Cláudio Barbosa como “doleiro dos doleiros”, Messer seria responsável por um esquema internacional de pagamentos de propina, chamado “Bankdrop”, que a PF afirma ter movimentado mais de US$ 1,6 bilhão desde a década de 1980, através de três mil empresas off shores com contas em 52 países. 

Segundo o Ministério Público Federal, Dario recebia 60% dos lucros dentro do esquema e usava como codinome “Cagarras”, por possuir uma cobertura na Avenida Delfim Moreira, no Leblon, Zona Sul do Rio, com vista para as ilhas de mesmo nome. Messer foi dono do Banco EVG, de Antigua e Barbuda, onde doleiros e empresários mantinham contas, entre eles, Arthur Cesar de Menezes Soares Filho, o “Rei Arthur”, acusado de pagar propinas a Cabral. Filho de Mordiko Messer, um imigrante polonês que fez nome como doleiro no Rio de Janeiro, Dario expandiu os negócios da família. 

Com ajuda do pai, obteve a cidadania paraguaia e também herdou a amizade com Horácio Cartes, atual presidente do Paraguai. Messer está na mira da Justiça desde o Caso Banestado, que o fez mudar suas bases para Uruguai e Paraguai, segundo revelou, em 2004, o doleiro Alberto Youssef, em acordo de delação assinado com o ainda desconhecido juiz Sérgio Moro, que atuou no caso Banestado. Em 2005, Dario Messer também foi alvo das investigações sobre o Mensalão. Mas foi somente com o advento da Lava-Jato que o doleiro mudou-se, em 2015, para o Paraguai.

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Mercado paralelo gira R$ 13 bilhões por dia 

GILBERTO MENEZES CÔRTES [email protected]

O mercado de câmbio paralelo no Brasil, que movimenta pouco mais de R$ 13 bilhões/dia, não se limita à troca manual de dólar, euros e outras moedas em casas de câmbio. Ontem, a decisão do Banco Central de vender 8.900 mil contratos de swap (troca de dólar futuro com juros pré-fixado) provocou queda de 0,56% no câmbio oficial para a faixa perto de R$ 3,5293. Em casas de câmbio, como a PM Turismo na Avenida Rio Branco, o público ignorava a operação  “Câmbio, desligo”, com o dólar comprado a R$ 3,52 e vendido a R$ 3,67, à tarde. O mercado de câmbio paralelo existiria antes da vinda da Coroa Portuguesa. Mas ganhou grande vulto nos anos 1980, na crise da dívida externa. A disparada do dólar paralelo era um sintoma de febre. 

>> Banco Central levanta DNA do capital

No JB, chefiava a editoria da Economia. O czar da Economia, Delfim Neto, desdenhava do câmbio como indicador confiável. Aí, uma jovem economista, Clarisse Pechmann, apresentou tese de mestrado na FGV-Rio sobre o câmbio paralelo. O saudoso repórter Bruno Cartier, foi escalado para cobrir. Clarisse ganhou o diploma e a fama de uma das maiores especialistas em câmbio no país. Na década de 90, separada, passou a assinar Clarisse Messer. Os negócios outrora comandados por Mordiko Messer, agora complicam a vida de Dario Messer. A investigação tem vários novelos. Um deles foi retomado em 3 março de 2017, com a prisão de Vinicius Claret, o Juca Bala, no Uruguai. Mas a PF também tem em mãos dossiê entregue  em novembro de 2015 por ex-amante de Dario. Estão citados como clientes do doleiro grandes empresários do Rio, São Paulo e Rio Grande do Sul, artistas, jogadores de futebol e agentes esportivos. 

A comunidade judaica, da qual a família Messer faz parte, também se faz presente, inclusive com a citação de rabinos. Fazer negócios com doleiros ou trocar dólares em casa de câmbio não é irregular. Mas o Banco Central regulamentou há mais de uma década a compra regular de moeda estrangeira em banco, sem necessidade de apresentar passagem para o exterior. Por isso, é estranha a preferência por operações de monta que não deixam recibo no paralelo. 

A lista dos pedidos de prisão preventiva pedida pelo Juiz Marcelo Bretas, da 7 ª Vara Federal Criminal é a seguinte: Dario Messer, Marcelo Rzesinski, Roberto Rzezinski, Claudia Mitiko Ebihara, Ligia Martins Lopes da Silva, Carlos Alberto Lopes Caetano, Sergio Mizharay, Carlos Eduardo Caminha Garibe, Ernesto Matalon, Marco Ernest Matalon, Patrícia Matalon, Bella Kayreh Skinazi, Chaaya Moghraabi, Marcelo   Fonseca de Camargo, Paulo Sérgio Vaz de Arruda, Roberta Prata Zvinakevicius, Francisco Araújo Costa Junior, Afonso Fábio Barbosa, Paulo Aramis Albernaz Cordeiro, Antonio Cláudio Albernaz Cordeiro, Athos Rubens Alberrnaz Cordeiro, Suzana Marcon, Carmem Regina Albernnaz Cordeiro, Cláudia Sá Garcia de Freitas, Ana Lúcia Sampaio Garcia de Freitas,  Camilo Lelis de Assunção, Alexandre de Souza e Gois, Claudine  Spiero, Michel Spiero, Richar Andrew de Mol. Van Otterloo, Raul Henrique Srour, Marco Antonio Cursini , Nei Seda, Renê Maria Loeb, Alexandre Monteiro Henrice e Henri Joseph.