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Brasil: economistas reforçam previsões pessimistas de presidente do IBGE

Em entrevista, Paulo Rabello de Castro projetou cenário preocupante e de 'estagnação'

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Em meio à crise nacional e internacional, junto à turbulência política interna, economistas projetam um cenário pessimista para os próximos dois anos no Brasil. Em entrevista à Folha de S. Paulo, o próprio presidente do IBGE, Paulo Rabello de Castro, antecipou projeções negativas, e economistas ouvidos pelo JB reforçaram os argumentos de Castro. 

O presidente do IBGE fez uma análise econômica do país apontando para um cenário sombrio. Segundo o presidente do IBGE, o PIB crescer 1% no ano que vem será pouco, apesar do número voltar ao terreno positivo. A entrevista ocorreu antes da divulgação do PIB, na quarta-feira (30) e os números confirmam que o país continua em profunda recessão. 

>> Veja a entrevista

“Ainda estamos regredindo. E, se olharmos à frente, vemos projeções menos favoráveis do que há seis meses”, analisou. 

O economista destacou ainda que o risco de o país sair de uma recessão e cair em uma estagnação pode ser visto "a olho nu". 

“Esse risco é visível a olho nu. O desafio é enorme. São dificuldades internacionais e domésticas. Portanto, minha torcida pela saída da recessão fica só no plano estatístico. Porque, se crescermos 1% em 2017, provavelmente teremos um ou dois trimestres positivos no fim do ano. Isso ensejará a saída estatística da recessão, mas não agradará, porque a resposta em termos de emprego e renda vai ser muito fraca”.

Para o economista e professor da Ibmec MG, Reginaldo Nogueira, o país apresenta uma "recuperação muito fraca". "Vai demorar muito mais pra economia melhorar do que a gente pensava alguns meses atrás na virada do governo [quando Michel Temer assumiu a presidência]. E sem perspectiva de melhoria do mercado de trabalho, que só vai ganhar fôlego em 2019”, disse o professor. 

“Se a gente ficar ao longo de 2017 com renováveis crises políticas, teremos um problema, porque as reformas perdem espaço. A sociedade vai ver o Congresso com pouca representatividade e isso acaba batendo na base de sustentação do governo, que perde a capacidade de gerenciar reformas. Aí sim, a gente cai no cenário da estagnação. O ambiente político é fator determinante”, acrescentou Alexandre Espírito Santo, professor de economia do Ibmec no Rio. 

"Nós não conseguimos fazer o time jogar bem", disse Castro à Folha, sobre as forças produtivas do país. "As empresas entram mal em campo, as pessoas são desempregadas. Todos ficam desesperançados, a produtividade geral cai e o governo gasta demais”, completou.

Taxa de Juros

Para o presidente do IBGE, aumentar a taxa de juros não só não resolve o problema da economia, como pode ter consequências desastrosas. “Enquanto isso, outro grupo de teorizadores diz que, para que o mundo não caia sobre nossas cabeças, temos que praticar a taxa de juros mais elevada do mundo, pois esse é o remédio universal. Para mim, isso e tratamento numa clínica vodu são o mesmo”, destacou à Folha.

“A economia brasileira hoje é como um doente que tem enfisema pulmonar, ele quer respirar, mas não consegue. Tem que ter um balão para ele respirar minimamente, e esse balão é a queda de juros”, avaliou Alexandre. 

Castro, que trata o aumento da taxa como um “remédio sério”, diz que só deveria ser usado “por um período intensivo e muito curto”. 

“O resultado é que, de 1999 até hoje, a dívida pública está quase duas vezes superior ao que poderia estar se estivéssemos praticando uma taxa de juros neutra. Isso sustenta um rentismo financeiro e faz com que a sociedade precise ser reeducada para o compromisso de trabalhar. Trabalho no Brasil é opção de último caso. As filas preferenciais são as do subsídio e as do privilégio”, acrescentou.

A recessão de 1980

O cenário é pior do que a década de 1980 para os economistas, que enxergam com pessimismo a influência da crise externa. 

“Porque ela é uma recessão autoinflingida. Na década de 1980, não tínhamos apenas um incômodo internacional. Hoje o vento não está mais hiperfavorável, mas não quer dizer que o cenário seja totalmente antagônico. Em 1980 era. Estávamos afundados em uma restrição absoluta, não tínhamos dólares e tínhamos que importar petróleo. Hoje estamos em uma crise de credibilidade em razão dos nossos desajustes”, comentou Castro ao jornal.

“Estamos no meio de uma segunda década perdida [a primeira foi a década de 80]. Todavia, em termos de queda do PIB, essa é a pior crise dos últimos 100 anos. Só vamos recuperar o nível da renda per capita de 2013, em 2025”, acrescentou Reginaldo.  

Alexandre fez coro aos dois economistas: “É a pior recessão da nossa história desde a década de 1930, sem dúvida nenhuma. O que aconteceu e ainda está acontecendo é um cenário bem ruim sem precedentes na historia em termos de número”, exclamou.  

Cenário político

“O quiproquó político só aumenta a tensão”, diz presidente do IBGE à Folha. "A pior coisa que poderíamos enfrentar hoje é um novo estado de desconfiança em relação à figura do presidente da República”, completa Castro, à Folha.

“À medida que a lista de pecadores só faz aumentar, com as denúncias e as homologações [da Lava Jato], as repercussões que isso está tendo sobre as maiores empresas do país é absolutamente trágica. Precisamos articular meios que transcendam os acordos de leniência, de forma que as empresas possam ir pagando pelos seus pecados, deixando o rastro do castigo e das penas para as pessoas físicas, e liberá-las para pensar em novos investimentos”, disse.

Castro torce para que o cenário político interno “se esclareça favoravelmente” a Temer, para que não haja um novo afastamento do presidente da República, como ocorreu com Dilma Roussef, agravando ainda mais a crise econômica nacional. 

“Se nós temos senso no Brasil, que nós nos agarremos ao presidente e dele exijamos a ampliação da pauta de refundação da república. Não temos tempo a perder”, acrescentou.

O economista, que é a favor do reajuste da Previdência, ressalta a importância de reorganizar a economia para sair da recessão através de uma simplificação tributária, e a criação de um conselho de gestão fiscal como complemento da PEC do Teto de Gastos, para estabelecer critérios de avaliação. 

Reginaldo e Alexandre acrescentam que sem uma melhora no cenário político e a aprovação de medidas necessárias à crise econômica, não haverá crescimento. 

“Precisamos aprovar reformas. A turbulência política acaba tendo impacto sobre investimento e da capacidade do governo de aprovar medidas”, disse Reginaldo. 

“Eu acho que a gente tem um fato mais importante para analisar: como as reformas vão acontecer. Se forem positivas e se o cenário externo não for ruim, acho que podemos engrenar em 2018 num crescimento maior do que uma cosia perto de zero”, finalizou Alexandre.