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'WSJ': Defensores do livre comércio da UE reagem à onda de protecionismo

Reportagem observa que  velhas tensões estão ressurgindo na zona do euro

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Matéria publicada nesta segunda-feira (26) pelo The Wall Street Journal observa que a União Europeia sempre teve uma atitude ambivalente sobre o livre comércio. O início do projeto europeu foi caracterizado por tensões entre esses países que acreditavam que um continente com poucos recursos naturais não tinha escolha a não ser estar aberto para o mundo e outros que acreditavam em uma “fortaleza Europa”, protegida por muralhas de altas tarifas. Essa batalha parecia ter sido vencida pelos defensores do mercado livre no início dos anos 90, quando a UE simultaneamente assinou a Rodada do Uruguai do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT, da sigla em inglês), que abriu a indústria europeia para a competição global, e abraçou o livre comércio interno radicalmente em busca de seu projeto de um mercado único.

Reportagem do Journal fala que neste momento velhas tensões estão ressurgindo. A UE hoje pode estar profundamente integrada na economia mundial, com um em cada sete empregos dependendo das exportações. Mas a opinião pública está cada vez mais desconfiada da globalização. Tanto a Brexit, a saída do Reino Unido da UE, como o surgimento de partidos contra a política estabelecida têm sido percebidos amplamente como um bramido de fúria dos eleitores “esquecidos”, que culpam a globalização pelo aumento da desigualdade, da crescente insegurança no mercado de trabalho, dos salários estagnados e pela erosão dos controles democráticos. Mesmo assim, os defensores do livre comércio da Europa não estão desistindo sem lutar. 

O jornal norte-americano conta que em uma reunião informal na semana passada, ministros do comércio de países da UE tomaram três medidas importantes para tentar sinalizar a continuidade de seu compromisso aos mercados abertos. O primeiro foi sinalizar seu forte apoio ao Acordo Econômico e Comercial Abrangente Canadá-UE (CETA, da sigla em inglês). Isso se transformou em um teste importante do compromisso da UE ao livre comércio e se ele pode continuar sendo considerado seriamente como um parceiro. Afinal, esse acordo, que levou sete anos para ser construído, tem sido considerado pelos negociadores dos dois lados como um novo tipo de acordo comercial, cheio de garantias para os direitos dos trabalhadores e para o meio ambiente e respeito à soberania nacional. Ainda assim, o acordo enfrenta oposição de alguns Estados membros, em meio a receios de que as proteções propostas pelos investidores e o mecanismo de resolução de disputas iriam dar muito poder aos interesses corporativos. Os ministros de comércio decidiram contra a reabertura das negociações, na expectativa de reduzir os receios por meio de uma declaração legal de união conjunta e a separação dos assuntos mais polêmicos para ratificação nos parlamentos nacionais. Isso permitiria que os líderes da UE ratificassem o núcleo da CETA em uma reunião em 27 de outubro, abrindo caminho para sua aplicação provisório a partir do início do próximo ano.

WSJ analisa que o segundo passo foi recusar desistir da Parceria Transpacífica de Comércio e Investimento com os EUA. Essa medida foi em grande parte simbólica, já que todo mundo aceita que não há chance de o acordo ser votado antes da eleição presidencial americana, deixando o destino da parceria nas mãos do próximo governo. Vários Estados membros da UE gostariam de aproveitar essa oportunidade para matar o acordo de vez, ou pelo menos desfazer o mandato da Comissão Europeia. Mas, ao concordar em estender o atual mandato e ao escolher participar da próxima rodada de negociações marcada para o início de outubro, os ministros de comércio apoiaram a comissão, que está determinada a preservar o que já foi conquistado nas negociações e manter viva a possibilidade, embora remota, de a TPP ser retomada. O terceiro passo foi provavelmente o mais sensível politicamente. Os ministros de comércio concordaram em apoiar a proposta da comissão para reformular as políticas antidumping da UE de forma a permitir que a UE reconhecesse a China como uma economia de mercado e, assim, evitando o risco de uma prejudicial guerra comercial.

O Journal argumenta em seu texto que essa questão ameaça se tornar um teste importante do compromisso da UE ao sistema de comércio multilateral baseado em regras. Sob os termos do acordo fechado em 2001, quando ela se uniu à Organização Mundial do Comércio, a China atualmente é tratada como uma economia fora do mercado, o que permite que os atuais membros da OMC apliquem defesas comerciais discriminatórias. Mas este acordo vence em dezembro. Alguns Estados membros da UE têm argumentado que já que a China ainda não é claramente uma economia de mercado, a UE deveria simplesmente recusar alterar suas políticas em vez de expor setores industriais sensíveis como o de siderurgia e painéis solares à concorrência altamente subsidiada. Em vez disso, a comissão planeja ver a UE reformular suas defesas comerciais de forma a manter os níveis atuais de proteção sem discriminar a China.

The Wall Street Journal questiona se a UE pode conter o avanço da oposição ao protecionismo. Os líderes da UE ainda podem alterar a CETA ou desistir de apoiar a parceria transatlântica em outubro. E o compromisso da comissão com a China pode se desintegrar em meio a divisões sobre o grau de severidade das regras antidumping: alguns países querem que a UE acabe com as chamadas regras do direito inferior, que limita as taxas retaliatórias bem abaixo dos níveis dos EUA. Por outro lado, as autoridades comerciais da UE insistem que não há perspectiva de voltar ao livre comércio, já que isso é virtualmente impossível sob o sistema da UE, no qual as políticas de comércio são uma responsabilidade exclusiva da UE — uma decisão intencional para colocar o bloco fora do alcance de pressões políticas domésticas. O perigo real para a UE é que, à medida que os movimentos comerciais ganhem o centro do debate, essas pressões políticas domésticas acabem solapando a legitimidade da própria UE.