O jornal americano The New York Times publicou nesta quarta-feira um artigo onde faz uma análise sobre como o sistema financeiro vai reagir à turbulência nos mercados. "Washington tem tentado reforçar o sistema financeiro nos últimos cinco anos assim ele pode lidar com a desordem nos mercados. A tormenta desta semana vai testar esses esforços de reconstrução. Investidores, depois de meses mergulhando nos mercados arriscados à procura de lucros, estão agora saindo fora".
Nas últimas semanas, eles despejaram junk bonds emitidos por companhias americanas, particularmente empresas de energia que pegaram grandes empréstimos para explorar o boom do petróleo de xisto. A queda acentuada no preço do petróleo poderia agora provocar o default de algumas empresas, dizem analistas.
A dor mais perigosa, entretanto, está ocorrendo fora. A Rússia vive uma crise completa da moeda, causada em parte pela queda do preço do petróleo. E o movimento do petróleo alimentou medos sobre outros países. A moeda turca atingiu um recorde de baixa na terça-feira, e a moeda do Brasil se enfraqueceu sensivelmente nos últimos dias. Os bonds do governo da Venezuela despencaram a níveis que indicam que os investidores pensam que um default é provável.
Tais dificuldades ecoam a crise que abalou os mercados dos países em desenvolvimento em 1998, quando a Rússia entrou de fato em default numa dívida denominada em rublos. E as convulsões globais daquele ano infiltraram no sistema financeiro dos Estados Unidos, apesar do desempenho da economia do país ter sido bom, como está agora.
Naquela época, o contágio seguiu até Wall Street através de um enorme hedge fund (os fundos de cobertura) chamado Long-Term Capital Management que quase desmoronou depois de apostar muito além de seus recursos.
Os paralelos com 1998 levaram investidores e reguladores a se perguntarem se alguns pontos fracos parecidos existem hoje. E se realmente existem, a questão é se os bancos grandes são sólidos o bastante para aguentar os choques. Por enquanto, muitos especialistas dizem que o sistema é suficientemente seguro.
“Isso não ameaça os bancos e outras instituições financeiras porque elas estão consideravelmente mais fortes do que estavam alguns anos atrás,” disse Donald Kohn, a conselheiro sênior na Brookings Institution e governador do Federal Reserve durante a crise financeira de 2008.
Os bancos estão mais fortes hoje porque eles confiam menos e dinheiro emprestado para financiar seus negócios e empréstimos. E os bancos de Wall Street não estão emprestando tanto dinheiro para os hedge funds e outros investidores para fazer apostas altamente especulativas que poderiam ser vulneráveis neste momento.
Além disso, os problemas que acontecem no exterior se dão na maioria dos casos em países onde os bancos americanos têm atividades limitadas. Isso coloca bancos globais em uma posição sensivelmente melhor do que em 2011 e 2012, quando a existência do euro era ameaçada e investidores estavam fugindo dos bancos europeus.
“O número de conexões entre os setores financeiros dos Estados Unidos e da Europa são certamente mais profundos do que as conexões entre os setores financeiros dos EUA e da Rússia,” disse Timothy A. Duy, professor de economia na Universidade de Oregon. Ele alerta, entretanto, que alguns bancos europeus estão mais expostos à Rússia.
Ainda assim, os grandes bancos continuam a confiar em bilhões de dólares em empréstimos a curto prazo que poderiam secar em caso de pânico, fazendo com que o sistema financeiro congele. E mesmo se esse tipo de financiamento é interrompido, bancos e hedge funds podem ser usados quando mercados se movem de maneira impulsiva e inesperada. Por exemplo, Jefferies, o banco de investimentos de Nova York, registrou na terça-feira uma queda de 73% nas receitas do quarto trimestre em sua unidade que negocia bonds. Parte dessa queda veio da desvalorização dos títulos que detém.
Os mercados também estão esbarrando em grandes investidores. Saba Capital, o hedge fund de Boaz Weinstein, teve um desempenho fraco este ano.
Grandes bancos comerciais como o JPMorgan Chase e Goldman Sachs vão registrar seus resultados do quarto trimestre em janeiro.
Altos funcionários do Federal Reserve se reuniram na terça e na quarta-feira para discutir política monetária. O mais provável é que o debate seja sobre se as decepções nos mercados vão afetar a economia. A queda nos junk bonds, por exemplos, podem fechar o caminho através do qual algumas empresas financiam suas operações, o que poderia levá-las a cortar a produção e o emprego. Essa ameaça paira com força sobre os mutuários de empresas de energia, que contribuíram bastante para o recente aumento do número de empregos.
Mas Kohn disse que não pensou que as condições do mercado eram ruins o bastante para persuadir o Fed a desviar de seu caminho de restrição lenta na política monetária.
“Minha expectativa é que eles verão isso como um risco de queda, mas não necessariamente como uma tendência central que provocaria a contenção,” diz ele.
Alguns investidores estão mais preocupados com riscos geopolíticos que abalam a confiança econômica. Os preços do petróleo em queda, por exemplo, poderiam criar uma fase econômica ainda mais difícil para países como Rússia e Irã. A explosão política em um grande produtor de petróleo poderia agir como um pesado fardo em outros lugares. A instabilidade geopolítica pode minar os esforços da Europa e do Japão de sair do marasmo.
Mas baixos preços do petróleo podem também pressionar governos que apostaram na instabilidade. A última instabilidade pode ter outros efeitos positivos. Ela pode virar um mini-1998 que limpa um pouco da espuma de mercados que, até recentemente, pareciam desafiar a gravidade. “Investidores deveriam reagir a mercados que são mais arriscados do que previram,” disse Kohn. “Algum ajuste se justifica.”