A Confederação Nacional do Comércio (CNC), em seu boletim “Síntese da Conjuntura”, elaborado pelo economista e ex-ministro da Fazenda, Ernane Galvêas, faz as análises abaixo para esta quarta-feira (30/4):
A curto prazo, pode-se dizer que a inflação não está fora de controle, ao situar-se em cerca de 6%, a mesma taxa média observada nos últimos 10 anos. O nível de desemprego, em cerca de 6% da força de trabalho, é o mais baixo dos últimos tempos. A agricultura produziu, nesta safra, a maior colheita histórica. O comércio vem perdendo força, mas ainda projeta crescimento de 4,4% neste ano. O setor serviços se expandiu em 1,5%, acumulando 7,7% até maio. A indústria apresenta o resultado mais negativo, praticamente estagnada nos últimos três anos. Neste ano, as exportações caíram 3,4% e as importações 3,8%. As contas públicas são deficitárias e a dívida pública bruta cresceu R$ 185,1 bilhões, nos 12 meses terminados em junho.
A longo prazo, o cenário muda. A inflação reprimida terá que absorver os reajustes dos combustíveis, da energia elétrica e do transporte urbano, além de uma possível desvalorização cambial caminhando para 8%.
A agricultura depende do clima. A indústria perde produtividade e competitividade, sob o peso da carga tributária, dos juros e da esmagadora burocracia oficial. O comércio deve crescer em 2015 e 2016 menos do que em 2014. O setor serviços, puxado pelo turismo, poderá manter o desempenho atual. O desemprego tende a aumentar. As contas do setor público tendem a agravar-se, dependendo do resultado das eleições de outubro próximo. As contas externas dependem do mercado internacional, que se expande lentamente.
Em suma, a julgar pelos indicadores atuais, o PIB nacional caminha para um crescimento zero nos próximos dois anos. A não ser que haja uma reviravolta política, de baixa probabilidade.
INFLAÇÃO E TAXA DE JUROS
Desde as primeiras teorias sobre inflação, concluiu-se que a elevação da taxa de juros é eficaz na redução dos preços, desde que, produzindo uma menor procura de crédito, contribui para refrear a demanda agregada (consumo e investimentos), aliviando as pressões inflacionárias. Esse é o fundamento da política monetária do Banco Central: controlar a expansão da liquidez financeira, o que significa controlar a expansão da moeda e do crédito.
Se a expansão do crédito financia o aumento do consumo e dos investimentos, é óbvio que a sua contenção vai reduzir a propensão a consumir e a investir. O Banco Central do Brasil sabe disso e, dessa forma, sempre que a inflação estiver alta, digamos acima de 3% ou 4%, vai agir para elevar a taxa de juros básica (SELIC) ou, indiretamente, aumentar os recolhimentos compulsórios dos bancos ou a venda de títulos públicos, com o mesmo sentido de aumentar os juros e reduzir a oferta de crédito.
No Brasil, há dez anos, a taxa anual média da inflação (IPCA) se situa em torno de 6%, considerada alta, em comparação com as taxas internacionais. Em abril/13, o Banco Central iniciou uma escalada de alta da taxa de juros, partindo de 7,25% até chegar a 11%, atualmente. O resultado sobre a inflação foi decepcionante, possivelmente revelando que, na conjuntura atual, a taxa de juros não tem um efeito definitivo sobre a inflação. Até mesmo porque, no Brasil, existem duas políticas monetárias – contrárias: uma do Banco Central, que age conforme a teoria, visando os bancos privados, e outra do Governo, que comanda a acentuada expansão do crédito, a juros baixos, através da Caixa Econômica e do BNDES, principalmente.
Isto posto, é de se considerar, igualmente, a correlação entre a taxa de juros e a taxa de câmbio, ou seja, os juros altos atraem uma maior oferta de recursos do exterior, que expandem o crédito interno e promovem a valorização da taxa de câmbio, contribuindo para aumentar a oferta de produtos importados, com efeitos sobre redução dos preços. De outro lado, a taxa de câmbio valorizada reduz a exportação, propiciando maior oferta de bens no mercado interno, exceto serviços (non tradables).
Existe uma íntima relação entre exportações e PIB, seja numa direção ou noutra, as exportações puxando o crescimento econômico, a expansão econômica puxando as exportações. Em verdade, os dois indicadores caminham juntos, na mesma direção. Em 2009, as exportações caíram 22,7% e o PIB 0,3%. Nos últimos três anos, 2012/2014, as exportações em queda estão, visivelmente, refreando o crescimento econômico.
Na implantação do Plano Real, em 1994/95, o Banco Central usou a valorização da taxa de câmbio como coadjuvante para frear a alta dos preços. Conseguiu. Mas arrasou com as contas externas e reduziu a expansão do PIB.
ATIVIDADES ECONÔMICAS
A cada nova estimativa, diminui a projeção do PIB nacional para 2014, caminhando para um nível igual ou inferior a 1%, como prevê a CNI. O FMI reduziu sua projeção para 1,3% e o Boletim FOCUS para 0,97%. A crise de confiança industrial continua subindo. As Pesquisas da FGV, da CNI e da FIRJAN indicam o nível mais baixo desde 2009. Em maio houve queda de 5%, em junho de 5,4% e em julho de 2,0%. No comércio, chega-se ao nono mês de queda, com recuo de 7% em junho e de 1% em julho. Em julho, a contratação de funcionários caiu 1,2%, em relação a junho.
Segundo a Serasa, a devolução de cheques sem fundos chegou a 1,92% em junho, acumulando no 1º semestre 2,09%. O percentual de famílias endividadas aumentou de 62,5% em maio para 63,0% em junho. Contas em atraso caíram para 18,9% e famílias sem condição de pagar as dívidas chegou a 6,6% em julho, o mesmo que em junho.
A falta de chuvas ameaça as atividades econômicas no Estado de São Paulo, na pior crise de sua história, assim como no Centro-Oeste e no Nordeste, mas as chuvas na Região Sul afastam os riscos de racionamento no País.
Indústria
Segundo a CNI, o PIB da indústria nacional deverá fechar o ano com queda de 0,5%, comparado com a variação negativa de 0,8% em 2012 e da expansão de 1,7% em 2013. A utilização da capacidade instalada caiu de 71% em maio para 68% em junho. Em junho, a produção de aço bruto caiu 6,6% ante maio e 4,9% em relação a junho/13. No mesmo período, a construção civil caiu 1%. A produção mineral da VALE aumentou 12,6% no 2º trimestre, em relação a 2013.
A indústria automobilística, carro chefe da indústria nacional, registrou uma queda de 23,3% na produção de junho, ante maio, e de 16,8% no 1º semestre. Caíram, igualmente, as vendas de máquinas agrícolas.
Comércio
Após três meses de queda, o volume de vendas no comércio varejista brasileiro cresceu 0,5% em maio, na comparação com o mês anterior (PMC/IBGE). O crescimento mensal foi particularmente influenciado pelos ramos de equipamentos e materiais para escritório, informática e comunicação (+2,4%) e de artigos de uso pessoal e doméstico (+2,3%). No varejo ampliado, destacam-se as vendas do comércio automotivo (-1,9%) e de materiais de construção (-0,3%).
No acumulado do ano, os ramos de supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo (+4,1%) e de combustíveis e lubrificantes (+5,5%) tiveram maior contribuição. As lojas de departamentos registraram queda de vendas de artigos industriais, durante a Copa do Mundo. No corte regional, destacaram-se Acre (+10,8%), Tocantins (+19,0%) e Alagoas (+9,3%).
A receita real de Serviços teve redução de 1,5% em maio, ante abril, acumulando três meses de queda. A demanda de voos domésticos subiu 6,6% no 1º semestre. O índice de estoques do comércio caiu 4,5% em julho, ante junho, em São Paulo (Fecomércio-SP).
Agricultura
É grave a situação na zona rural de São Paulo, ante a falta de chuvas, mas a produção agrícola no País deverá atingir 198,5 milhões de toneladas de grãos, na safra que será colhida em 2015. A produção de açúcar deverá cair 3 milhões de toneladas. Nos últimos 30 dias, caíram os preços da soja (-7,5%), do milho (-6,9%) e do algodão (-4,9%). No 1º semestre, as vendas de fertilizantes bateram recorde (ANDA).
As chuvas continuam castigando a Região Sul, milhares de pessoas desabrigadas pelas enchentes, especialmente no Rio Grande do Sul, com 149 municípios atingidos.
O fenômeno El Niño está se desenvolvendo no Oceano Pacífico e deverá trazer fortes chuvas na América do Sul e baixa temporada de furacões nos Estados Unidos. Em São Paulo, a SABESP está provocando o bombardeio de nuvens, para fazer chover na região do rio Tietê.
Mercado de Capitais
Segundo a CAGED, em junho foram criadas apenas 25.363 vagas, o pior resultado desde 1998, acumulando no semestre 588.168 contratações. A indústria de transformação foi o setor que mais demitiu (28,5 mil). Em São Paulo, de janeiro a maio, registrou-se alta de 0,9% no emprego, com tendência de redução (Fecomércio-SP); entre abril e maio, houve queda de 0,02%.
Também houve queda na renda do trabalhador, em junho ante maio, sendo São Paulo (-1,6%), Belo Horizonte (-2,2%), Recife (-1,0%) e Rio de Janeiro (-0,5%). O ritmo de alta dos salários caiu à metade, em contraste com altas em 2012 (+5,68%) e 2013 (+2,8%).
Setor Financeiro
Em junho, as operações de crédito do sistema financeiro chegaram a R$ 2.830 bilhões, com expansão de 4,2% no ano e 11,8% em 12 meses, sendo +20,2% nos bancos públicos e +4,1% nos bancos privados.
Segundo a ABECIP, o total de crédito imobiliário somou R$ 53,1 bilhões, no 1º semestre, 7% acima do registrado no mesmo período de 2013. Entre maio e junho, houve queda de 7%.
No mercado segurador, a receita de prêmios caiu 18,8% em janeiro, permaneceu em queda em fevereiro e março, mas voltou a subir em abril (+3,7%) e maio (+4,4%).
Inflação
Com transporte e alimentos mais baratos, a prévia do IPCA-15 recuou de 0,47% em junho para 0,17% em julho. Entretanto, no acumulado de 12 meses, registra-se alta de 6,51%. Constituem destaques a queda de preços da batata (-13,2%), do feijão fradinho (-8,04%) e cenoura (-7,67%). Nos últimos 30 dias, caíram os preços da soja (-7,45%), do milho (-6,88%) e do algodão (-4,94%).
Mas a expectativa do mercado é de alta dos preços, devido aos reajustes que, forçosamente, deverão ocorrer no setor elétrico, combustíveis e transporte urbano. Para 2014, há projeção de alta de 16% na tarifa residencial de energia elétrica.
Contradição total = depois de infligir no mercado uma taxa SELIC de 11%, puxando as taxas de juros com a finalidade de restringir expansão do crédito, considerada a fonte mais importante da inflação, o Banco Central acaba de criar incentivos que podem injetar mais R$ 45 bilhões na economia.
Setor Público
O Governo federal arrecadou R$91,387 bilhões em junho, alta de 0,13% na comparação com o mesmo mês de 2013. De janeiro a junho, o total recolhido foi de R$ 578,594 bilhões, alta real de 0,28%.
Para fechar as contas, nos limites programados, o Governo federal espera receber R$ 23,9 bilhões das empresas estatais. Para fazer caixa, a União vai licitar 4 mil km de linhas de transmissão, antes mesmo de ter usinas geradoras.
A crise financeira que assola o setor elétrico a cada dia ganha contornos mais preocupantes. Em um ano e meio, o segmento deixou de ser autossuficiente e passou a depender de medidas paliativas do Governo federal.
Fora do “pool” de bancos convocados para financiar as distribuidoras de energia, com R$ 11,2 bilhões, o BNDES está socorrendo essas empresas com R$ 3 bilhões e o Banco do Brasil e a Caixa Econômica devem cobrir uma parcela de mais R$6,5 bilhões, O déficit de recursos do setor elétrico chega a R$ 53,8 bilhões. Desse total, os consumidores vão pagar R$ 35,3 bilhões.
A dívida pública bruta, em junho, alcançou R$ 2.895,8 bilhões, com um acréscimo de R$ 147,8 bilhões sobre dezembro/2013. A dívida mobiliária chegou a R$ 2.029,7 bilhões e as vendas de Tesouro Direto tiveram queda de 22,9% em junho sobre maio.
Setor Externo
As exportações do 1º semestre atingiram US$ 110,5 bilhões (-3,4%) e as importações US$ 113,0 bilhões (-3,8%), deixando um déficit na balança comercial de US$ 2,5 bilhões, com déficit de US$ 22,6 bilhões em Serviços e US$ 18,9 bilhões em Rendas, o saldo negativo em Transações Correntes chegou a US$ 43,3 bilhões, coberto com a entrada de US$ 52,4 bilhões de recursos estrangeiros, inclusive US$22,6 bilhões de investimentos diretos. A importação de bens de capital recuou 10,3%.
Em junho, os recursos cambiais atingiram US$ 37305 bilhões e a dívida externa bruta US$ 523,8 bilhões, inclusive US$ 193,6 bilhões de Inter companhias. Na terceira semana de julho o déficit da balança comercial ficou em US$ 552 milhões.
O Tesouro Nacional está lançando títulos no exterior no valor de US$ 3,5 bilhões, com vencimento em 1945, em troca de títulos de menor prazo e juros mais altos. Também a CEF está captando US$ 500 milhões para expandir suas operações (!?). Inexplicável.
No cenário internacional são fatos relevantes:
A Argentina foi obrigada pela Justiça norte-americana a pagar US$ 1,3 bilhão mais juros. As negociações continuam. A Argentina vai receber da China empréstimo de US$ 7,5 bilhões.
O PIB dos Estados Unidos deverá crescer 1,7% em 2014. O Grupo Citi foi condenado pela Justiça americana a pagar US$ 7 bilhões relativos a hipotecas de alto risco e o Paribas francês a pagar US$ 9 bilhões.
A União Europeia bloqueou os fundos de 72 indivíduos de empresas russas, a título de sanção à Rússia, pelas agressões à Ucrânia. E estuda ampliar as sanções, se contar com o apoio da Alemanha. Em Portugal, a crise se agrava com os problemas do Grupo Espírito Santo, que tem grandes ativos financeiros no Brasil.
Na China, o PIB subiu 7,5% no 2º trimestre. O Brasil e a China fecharam amplo acordo comercial e de investimentos, no valor de US$ 30 bilhões. A Embraer vai vender 60 aviões a jato para a China, no valor de mais de US$ 3,1 bilhões.