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'O exílio é uma espécie de doença', diz escritor afegão Atiq Rahimi

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“O exílio é uma espécie de doença”, define o escritor afegão naturalizado francês Atiq Rahimi a sua atual condição. Tendo deixado o país natal em 1984 devido à invasão soviética, o escritor diz que não são mais razões políticas que o fazem morar na França, aonde chegou depois de passar rapidamente pelo Paquistão: o que antes era obrigação, virou opção.

Se pôde escolher onde habitar, ele afirma mesmo assim que “não pode viver sem o exílio”. A linguagem, afirma, “está lá todo o tempo” — e como não é persa, seu idioma materno, “tudo muda”: “O francês é uma língua fantasmagórica para mim”, comenta Rahimi. “Há coisas que só consigo dizer na minha nova língua, que, em persa, ficaram muito associadas a tabus. Questões ligadas ao erotismo, por exemplo, que sofreram muitas transformações com a mudança de país”. 

Rahimi diz que todos os dias ainda escreve uma ou duas páginas em persa no diário. O idioma, afirma, “é muito poético”, permeado por imagens. Ele diz tentar transpor essa característica para sua prosa, “que é muito metafórica”.

O escritor começou a carreira profissional escrevendo em persa, idioma em que publicou três romances, incluindo a estreia, “Terra e cinzas” (Estação Liberdade, 2001), que foi adaptada para o cinema pelo próprio Rahimi em 2004 e ganhou a mostra “Um certo olhar”, do Festival de Cannes. 

O livro conta a história de um avô e de um neto que sobrevivem a um bombardeio que mata quase toda a família. O ruído das bombas deixa o neto surdo e a criança passa a acreditar que roubaram a voz do mundo e de seu avô. A trama se baseia livremente na trajetória do escritor, cujo avô perdeu a audição durante a guerra.

“A balada do cálamo” acaba de ser publicado pela Estação Liberdade. Autobiográfico, o texto oscila entre o presente em Paris e o passado errante, misturando memórias e reflexões artísticas, intercaladas por caligrafias e “calimorfias” (letras antropoformes). O autor define a obra como marcada pela relação entre “o corpo, o pensamento, o exílio e a linguagem”.

Rahimi ainda publicou no Brasil, sempre pela Estação Liberdade: “Maldito seja Dostoiévski”, “As mil casas do sonho e do terror” e “Syngué Sabour”, vencedor do Goncourt de 2008.