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Nova voz baiana, Illy interpreta grandes poetas em disco de estreia

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Uma galera nova da Bahia tem aquecido a produção musical do país e nela está Illy que, aos 30 anos,  é apontada como a nova promessa da MPB. Ela está no Rio há três anos, mas seu canto mantém o ar e a malemolência baianos nas músicas que fazem parte do disco de estreia, ‘Voo Longe’, com composições inéditas de Arnaldo Antunes e Chico César. 

Na abertura do show que fez na última sexta-feira no Festival Levada, o curador Jorge Lz declarou: “Não há diferentes tempos da MPB, do passado e do presente, a MPB é agora!”. Para ele, as gerações da música estão todas atravessadas. E a mensagem de Illy no disco é justamente a de viver o agora. “Nesse instante o Instagram não terá fotos/Pois as fotos não são vida, são depois”, diz a letra de “Só eu e você”, a inédita de Chico César. 

Illy trabalha e convive com o legado de músicos veteranos da Bahia, em uma rede que une nomes diversos. Quem produz o disco é Moreno Veloso, filho de Caetano, junto com Kassin. A música “Afrouxa” é uma inédita de Arnaldo Antunes em parceria com Betão Aguiar, Davi Moraes e Pedro Baby, filhos dos Novos Baianos. “Afrouxa e me dá sossego, amor”, pede a voz de Illy na canção. Davi, que fez uma participação do show de sexta, contou que o afoxé nasceu do encontro dos quatro compositores no Ceará, e que ganhou a “voz certa”. 

Em junho do ano passado, Illy abriu o show de Gal Costa no Circo Voador. “Gal me deu uma grande oportunidade e fiquei muito feliz, foi minha primeira apresentação para um grande público no Rio. Ela é  muito generosa”, diz Illy em entrevista em seu apartamento no Rio. Sentada no sofá encostado em uma parede estampada de referências, ela explica uma a uma: o quadro que retrata a Ponta de Humaitá, na Cidade Baixa, onde a família mora e onde cresceu, foi pintado pelo avô; e o de Iemanjá, que também foi pintado por ele - “Sou filha de Oxum e Iemanjá”. Aponta também símbolos que remetem a figuras como Zé Pilintra - “É meu empresário” -, além de referências musicais fortes, como Beatles, Chico Buarque e Bob Marley. 

“Eu sou esse equilíbrio de doçura e sal, seja na vida, no meu disco ou no show”, resume Ily, fazendo referência à música “Sombra da Lua”, que fala em “sereias conversando ao vento, cada uma no seu firmamento de doçura e sal”. É como intérprete que ela se firma e se projeta, inspirada por Elis Regina, Rosa Passos, Mônica Salmaso, Clara Nunes, Maria Bethânia além de Gal. “Estudei oficina de canto popular da Universidade Federal da Bahia e na Escola Baiana de Canto Popular. Tive um tempo de estudos, queria entender mais de música e de instrumentos, mas eu acho que essa potência vem da força de casa mesmo. Meu timbre é muito parecido com o da minha mãe e da minha vó. Na verdade, não sei se é potência. É mais verdade, é botar pra fora”, diz. 

No Rio, foi Illy quem chamou Moreno Veloso e Kassin para fazer a produção do disco. “Que bom que ele [Moreno] topou produzir o disco. E ele trouxe uma turma de gente massa”, frisa a cantora. Sobre o que é fazer um show produzido por Moreno, ela responde: “É alma, é coisa real, e o disco é muito assim”. 

Ela também foi em busca de Chico César: “Sou uma cantora em busca de compositores, de interpretar o que esses poetas têm. Sempre gostei muito do Chico e quando soube que ele ia lançar seu livro ‘Versos pornográficos’, pensei: ‘Vou lá ver se consigo falar com ele’. E foi assim que aconteceu. Cheguei e me apresentei, dizendo que era cantora e tinha vindo para o Rio gravar um disco”, conta. Illy disse ainda que era fã e perguntou se haveria chances de gravar uma composição dele. “Ele pediu para trocar e-mails e fomos nos falando, mas foi o jornalista paraibano Kubitschek Pinheiro quem fez a ponte. Eu mandei umas músicas em que eu cantava e ele mandou algumas inéditas. Escolhi ‘Só eu e você’ para meu disco de estreia”, diz. 

O restante foi garantido pelas redes de amizade e afeto formadas pelo caminho. Morando no Rio, ela conheceu Jonas Sá, que deu a música “Baleia”, em parceria com Alberto Continentino. Já Quito Ribeiro deu “Voo Longe”. “Logo que cheguei na cidade, conheci César Mendes num ‘predinho’ que a gente morou em Ipanema. Foi quando eu fiz minha turma aqui porque era um prédio bem Bahia. Cesinha é um baiano que toca violão com os Tribalistas e lançou recentemente um disco muito bonito. Ele me apresentou algumas canções também, que estão no meu disco”, conta. 

Para Illy, arte é educação e é o que o Brasil tem de mais forte. A paixão por música começou em casa, com raiz nos bisavós. A família sempre gostou de se reunir e sempre com música. “Cresci ouvindo eles cantarem. Minha avó e minha mãe cantam muito bem. Ninguém virou profissional, a não meu tio Rai, que está no meu disco. Ele é compositor, músico e professor de filosofia”, diz Illy. “Meu pai toca muito bem bateria e meu irmão já me acompanhou em shows tocando o instrumento”, completa. Falando em família, Illy é casada com Jorginho Velloso, neto de Mabel e sobrinho-neto de Bethânia e Caetano. 

“Eu já cantei em banda de axé e de forró e meu último projeto era uma banda de samba, a Samba Dibanda. Cantei muito em barzinho em Salvador, desde nova. Eu tinha 16 anos quando comecei a cantar em trio elétrico e meus pais me acompanhavam, por eu ser menor de idade. Tudo foi uma experiência muito boa”, ressalta. “Finalmente tive essa oportunidade de gravar um disco, de poder cantar os compositores que eu já admirava e tinha vontade de gravar. Coloquei todo esse sonho no disco”, diz. 

Quando Illy fala em transformar sonhos em disco, ela faz referência também a sonhos de quando ainda era bem pequena e assistia aos shows do grupo Confraria da Bazófia, da década de 90, e tinha vontade de subir no palco para cantar a música “Djanira”, de Arnaldo Almeida, Jarbas Bittencourt e João Luis. “Muitos dos compositores do meu disco eu já conhecia da Bahia. São amigos meus e dos meus tios. Hoje eu estou realizando esse sonho de cantar ‘Djanira’, ‘Olhar pidão’, ‘Ela’, que são músicas desses caras que eu, novinha, sentava no chão do teatro para assistir. Eles nunca gravaram, mas tocavam nos seus shows. São músicas que me deixam muito feliz”, conta, satisfeita.