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Da condição do gesto

Exposições apresentam narrativas que deslocam observação do lugar comum

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A possibilidade de encontrar novos eixos para a condição do gesto move três exposições que acabam de ser inauguradas na cidade: “Chutes inesquecíveis”, da premiada paulistana Analívia Cordeiro, no Museu de Arte Moderna (MAM), “Amores instantâneos”, de Luiz Sisinno, no Centro Cultural Justiça Federal (CCJF),  e a coletiva  “France eMotion - Le voyage animé”, na galeria da Aliança Francesa, em Botafogo. A última apresenta  obras de quatro fotógrafos, incluindo a do carioca Edu Monteiro, em visões únicas sobre o patrimônio da França.

Acostumada a girar em torno do próprio eixo, Analívia Cordeiro, bailarina por formação, sabe bem aonde os pés podem levá-la. Artista múltipla, a paulistana expõe pela primeira vez no Rio. Através de um estudo do movimento, possibilitado por um software único, desenvolvido por ela e pelo parceiro Nilton Lobo em 1982, Analívia cria esculturas e desenhos inspirados em dois movimentos do jogador Pelé, em 1968, e de Bruce Lee, notabilizado por filmes de artes marciais na década de 1960.

As 17 esculturas de Analívia são feitas em vários materiais, como resina transparente, poliamida nas cores branco, preto, vermelho, amarelo e azul, acrílico preto e branco,  latão e ouro. Serão mostrados ainda um conjunto de desenhos e os vídeos “Ar” (1985), “Micron virtudes” (1992), “Trajetórias” (1985) e “M3x3” (1973), considerada a primeira obra de videoarte brasileira.

Princípios da espacialidade 

“O trabalho de Analívia Cordeiro combina princípios da espacialidade planar concretista (apreendida por meio da convivência cotidiana com seu pai, Waldemar Cordeiro, pioneiro da arte concreta brasileira nos anos 1950) com a sistematização da teoria de Laban (aprendida com Maria Duschenes)”, explica o curador Fernando Cocchiarale. “São trabalhos cujo sentido, portanto, ultrapassa a contemplação das qualidades for mais quase abstratas das obras para alcançar um campo experimental resultante da objetivação de fluxos do movimento em esculturas e desenhos inesquecíveis”, complementa.

A artista frisa que faz questão de expor o software, o resultado técnico e a escultura finalizada. “Quero acabar com a ideia de que existe gênio. Qualquer um que quiser estudar tem ali incentivo para criar”, acredita.

Segundo Analívia, expor no Rio tem um sabor diferente, pois as pessoas têm familiaridade com o movimento, fazendo com que o corpo seja mais livre. “Nos pilotis do MAM, geralmente podemos assistir a uma garotada dançando divinamente. Amo ficar apreciando. Vou sugerir que, aos domingos, o museu disponibilize uma cota de ingressos cortesia para essa garotada assistir minha exposição”, anuncia a artista.

Linguagens sobrepostas

A exposição “Amores instantâneos”, no CCJF, formada por 30 colagens, flerta com o movimento do corpo sob outro ângulo. Então solteiro, o artista carioca Luiz Sisinno, que é formado em cinema, decidiu navegar em sites e se inscrever em aplicativos de paquera gay. Passou a observar a forma de expressão que muitos dos envolvidos utilizavam para impactar a comunicação. Frases agressivas, divertidas, preconceituosas até, começaram a ganhar protagonismo e a chamar sua atenção.

“Comecei a me apropriar dessas frases para aplicar a fotografias antigas, tanto as que herdei da família, como as que passei a comprar em sebos e feiras de antiguidade. Sempre me incomodou encontrar aquelas fotos, que já tiveram uma história, ali abandonadas. Ao fazer essa colagem com um rotulador Sylvapen atribuo, de alguma forma, uma identidade àquelas pessoas”, analisa. Sempre bem-humorado, Sisinno brinca com o anonimato, também protegendo os olhos, em alusão às tarjas que muitas vezes “garantem” a privacidade das pessoas. 

Mundo virtual e real vêm instigando o artista. Em suas duas primeiras exposições criou o personagem Bonequinho, ele mesmo como um soldadinho de chumbo posando em várias paisagens. “Agora, em sua mais recente pesquisa,  dá prosseguimento a seu impulso e paixão por fotografias ao lançar um outro olhar sobre imagens de pessoas através de retratos igualmente posados. Desta vez, superpondo passado e presente, em busca de uma inusitada intervenção temporal que interpela o nosso olhar na junção entre imagem e texto”, analisa o curador João Luiz Vieira.

Em Botafogo, a galeria da Aliança Francesa exibe “France eMotion - Le voyage animé”, coletiva sob curadoria de Muriel Enjalran, que reúne 35 trabalhos de quatro fotógrafos de diferentes nacionalidades: o beninense Ishola Akpo, o brasileiro Edu Monteiro, o americano David Schalliol e a espanhola Lourdes Segade. O patrimônio francês surge nas lentes de cada um pelo filtro de suas linguagens artísticas. Eles percorreram o país para criar suas obras. Em seguida, para dar vida às imagens capturadas, os artistas franceses Julie Chheng e Thomas Pons idealizaram um personagem animado que circula pelas fotografias, graças a um aplicativo móvel gratuito de realidade aumentada que o público acessa na mostra.

“A fotografia é uma arte democrática, que nos permite apresentar esta proposta global através de olhares diferenciados sobre o patrimônio da França”, declara Thomas Brégeon, diretor cultural da Aliança Francesa. O carioca Edu Monteiro é convidado do quarteto escalado pela Aliança. “Eu estava morando na França e, como os demais, recebi um roteiro de pontos históricos, de modo a cumprir de forma bem livre”, conta. Edu foi designado para registrar a região Sul durante o verão da França. “Propus para a curadora Muriel Enjalran o conceito de silêncio e ruído. A proposta era trabalhar com dois formatos, para isso viajei com uma câmera Hasselblad 6x6 cm,  carregada de filmes 120mm preto e branco e uma câmera digital. A ideia inicial era buscar na fotografia quadrada em preto e branco o silêncio de um tempo passado e na fotografia digital o ruído das informações e sentimentos contemporâneos”, explica o artista.

Segundo ele, o díptico do “Pici du Midi” é o que mais se aproxima do conceito inicial. Nele, usou uma das fotografias em preto e branco feitas com a Hasselblad, inspirada nas fotos dos primeiros aventureiros que desafiaram a altitude, abrindo trilhas apenas com mulas, picaretas e o poder de seus sonhos. “Imagem que evoca uma realidade distante dos atuais teleféricos, ao mostrar um longo caminho na montanha, o único acesso possível no passado. Esta fotografia monocromática aparece ao lado de uma colorida, na qual modernos e potentes telescópios são emoldurados por um céu carregado de estrelas, quebrando o silêncio, dando o tom futurístico daquele que é um dos centros de observação espacial mais equipados da França”, completa Edu. 

Serviço 

Chutes Inesquecíveis - Exposição de esculturas e desenhos de Analívia Cordeiro  

Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (Av. Infante Dom Henrique, 85. Parque do Flamengo - Tel.: 3883-5600) 

Ter. a sex., das 12h às 18h. 

Sáb., dom. e feriado, das 11h às 18h. 

Ingresso: R$ 14 

Estudantes maiores de 12 anos: R$ 7 

Maiores de 60 anos: R$ 7 

Amigos do MAM e crianças até 12 anos: entrada gratuita 

Quartas-feiras a partir das 12h: entrada gratuita 

Domingos ingresso família, para até 5 pessoas: R$14 

Até 22/7

Amores instantâneos - Individual de Luiz Sisinno

Centro Cultural Justiça Federal (Av. Rio Branco, 241 - Centro - Tel.: 3261-2550) 

Ter. a dom., 12h às 19h 

Entrada franca 

Até 7/7

France EMotion – Le Voyage animé - coletiva de fotografias 

Galeria Aliança Francesa (R. Muniz Barreto, 730 - Botafogo; Tel.: 2286-4248)

Seg. a sex., das 9h às 19h; sáb., das 8h às 12h 

 Entrada franca. 

Até 4/8