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Beatriz Milhazes apresenta conjunto inédito de esculturas em carpintaria

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Pintora por excelência, Beatriz Milhazes vem recentemente experimentando as potencialidades e desafios da escultura. O resultado desse processo, iniciado em 2010, pode ser visto na exposição Marola, Mariola e Marilola, a partir do dia 20 de maio, na Carpintaria, novo espaço da Fortes D’Aloia & Gabriel, no Rio de Janeiro. É a sua primeira mostra na cidade desde a retrospectiva que realizou, em 2013, no Paço Imperial.

São três grandes trabalhos tridimensionais, que apresentam forte sintonia com suas telas, gravuras e colagens, mas propõem novos e instigantes nexos perceptivos.  Como se seus motivos característicos – como o círculo, a flor e o arabesco – tomassem conta do espaço e estabelecessem entre si um novo tipo de relação corporal, física, determinada também pelos intervalos entre elementos e pela posição do espectador. Dependendo do ângulo em que você observa a peça, forma-se um outro trabalho. É uma vivência concreta, em que o corpo da obra relaciona-se com o corpo do observador. “Esta possibilidade física é uma área de investigação que a pintura não oferece”, esclarece.

As três esculturas que dão título à mostra foram criadas ao longo de cinco anos de pesquisa – com a realização de diversas maquetes em tamanho natural – na Durham Press, estúdio na Pensilvânia (EUA) onde Beatriz desenvolve, desde 1996, sua produção gráfica, em paralelo a uma intensa agenda de trabalho e exposições. São peças grandes, com altura que varia entre 2,26 e 2,89 metros e que lidam com o espaço de diferentes maneiras, quer potencializando o corpo da obra (as circunvoluções de Marola criam um corpo mais denso no espaço, com largura e espessura quase equivalentes), quer servindo como divisor de campos, como no caso de Marilola, que tem menos de meio metro de espessura e funciona quase como uma cortina. Inéditas no Brasil, as três peças foram exibidas nas galerias que representam a artista em Nova York e Paris (James Cohan Gallery, NY, e Galerie Max Hetzler, Paris).

Os títulos, como costuma acontecer na produção de Milhazes, são interessantes chaves de leitura. Além de promoverem a conexão entre as obras, reafirmam a importância do ritmo, da sonoridade e da brasilidade em seu trabalho. A primeira e maior delas, que segundo ela ainda apresenta uma forte conexão com a ideia do móbile, remete ao ir e vir das ondas, à noção de movimento constante e sedutor.

Mariola, doce popular, também traz ecos da cultura vernacular que tanto alimenta a artista, enquanto Marilola brinca com a sonoridade, num jogo lúdico de palavras, num procedimento que se assemelha ao jogo espacial que ela cria a partir da associação de diferentes materiais e cores. Nas três peças, o conjunto é articulado a partir de um desenho em metal, que serve de suporte para os diferentes elementos. Há nessas composições uma lógica semelhante à da colagem, fortemente presente na pintura de Milhazes.

Tudo começou com um cenário feito por Beatriz para um espetáculo de dança de sua irmã, a coreógrafa Márcia Milhazes, em 2004. Ao criar uma espécie de lustre no centro do palco, ela foge pela primeira vez da ideia de painel que sempre havia regido seu trabalho cenográfico e coloca diante de si um desafio tridimensional que viria a se tornar cada vez mais agudo.

O primeiro resultado desse mergulho no espaço foi a série Gamboa (que esteve presente na mostra realizada há quatro anos no Paço Imperial), que para a artista ainda não pertenceriam ao campo escultórico. “Não considero que Gamboa lide com o volume, com o espaço arquitetônico, físico”, diz. Outra diferença em relação à experiência de Gamboa é o tipo de material utilizado. Enquanto o primeiro debruçava-se sobre elementos próximos à cultura do carnaval e da festa de rua, nas esculturas mais recentes Beatriz buscou propositalmente trabalhar com elementos mais resistentes, com materiais atraentes como os metais polidos, o acrílico e a madeira, transformada em suporte para intervenções pictóricas.

“Sou uma pessoa do bidimensional. Minhas ideias, conceitos estão totalmente ligados ao plano”, afirma, explicando como foi difícil e instigante esse desafio. “A maior dificuldade foi começar a raciocinar em três dimensões”, explica. Trata-se de um processo cheio de idas e vindas, no qual procurou “a partir do meu repertório, aprofundar, trabalhar verticalmente, evoluindo na tridimensionalidade”. “Foi quase uma aventura”, conclui Beatriz, que este semestre terá grande parte de sua obra reunida em um volume da série especial que a editora alemã Taschen dedica a grandes pintores contemporâneos. O livro, em grande formato, terá tiragem limitada (assinada de próprio punho pela artista) e será lançado em quatro idiomas: alemão, inglês, francês e português.  Beatriz fará assim parte de um seleto grupo de homenageados que já inclui nomes como Jeff KoonsCristopher WoolNeo RauchAlbert OhelenDarren AlmondAi WeiWei e David Hockney.

Marola, Mariola e Marilola, que reforça a vocação experimental e de promoção de cruzamentos entre diferentes linguagens da Carpintaria, fica em cartaz até o dia 15 de julho.