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Dicas do Aquiles: Uma autoridade do samba

Reprodução -
Natureza e fé
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A dica de hoje é “Natureza e fé” (Biscoito Fino), CD do compositor, violonista e escritor Moacyr Luz, um dos grandes sambistas cariocas. Suas composições têm a linguagem poética e musical percebida desde a Zona Norte à Zona Sul, e suas músicas (pessoais e/ou em parcerias) dão cara a suas gentes. Graças a harmonias e melodias de bom gosto, não raro elas caem no gosto popular. E seus versos (pessoais e/ou em parcerias) vão à predileção temática dos cariocas: seus conflitos e personagens.

Para o disco, Moa teve uma ideia que eu reputo como corajosa: abrir mão da zona de conforto dos instrumentos que formam a base das rodas de sambas e das baterias das escolas de samba.

Macaque in the trees
Natureza e fé (Foto: Reprodução)

E lá se foi ele em busca da pegada do samba sem a percussão tradicional. Sabido, pediu a Fernando Merlino e Carlinhos Sete Cordas que cuidassem dos arranjos e da arregimentação dos instrumentistas: cavaco (Dudu Braga), baixos acústico e elétrico (Zé Luiz Maia), batera (Camilo Mariano), percussões (Beto Cazes e Junior de Oliveira), trombone, clarone e clarinete e gaita. De cara convém registrar: a moçada suinga sem encaretar o samba.

O disco tem também a participação de alguns dos atuais parceiros de Moa. Exemplo? Fred Camacho e Pretinho da Serrinha, ele que tocou cuíca no bom samba “Atravessado”, do qual Moa é coautor.

Em “No Baile do Almeidinha” (Hamilton de Holanda e ML), cujo título remete ao arrasta-pé comandado por Hamilton e seu bandolim, o som do clarinete de Dirceu Leite assina o suingue que a voz de Moa amplia.

Com voz reconhecida pela desafetação, Martinho da Vila divide a parceria e o canto com Moa em “Na ginga do amor”.

“Natureza e fé”, de Teresa Cristina e ML, dá título ao álbum. Juntos, os dois cantam a cadenciada e enternecida homenagem a Xangô.

“Samba de Obá” (ML e Jorge Aragão) é cantado pelos parceiros. Enquanto seus vozeirões vão firmes aos graves e o samba balança na palma de mão, a gaita de Rildo Hora os ilumina.

Duas parcerias de Moa com Fagner, “Periga” e “Samba em vão” (esta última cantada pelos dois), encontram Fagner no melhor de sua forma, cantando forte a bela letra.

“Conto de fadas” é uma antiga parceria de ML com o saudoso Luiz Carlos da Vila. Dolente, o samba inicia com vocalises de Moa, enquanto violão, piano e bateria seguram a levada.

“Chapéu Panamá” é de Mestre Trambique, Wilson das Neves e ML – Moa os reverencia e levanta a bola do batera Camilo Mariano. O trombone (Allan Abadia) vem quente desde a intro.

“Gosto” é de ML e Zélia Duncan, que canta bonito e emocionada.

Em “Gostei do laiá-laiá” (ML, Pretinho da Serrinha e Fred Camacho), Camacho canta, e bem, com Moa. O clarone (Dirceu Leite) chega junto. O suingue come solto.

“Jorge da Cavalaria” (Serjão e ML) tem coro de 23 “Jorges” (o número do Santo Guerreiro): vinte e três amigos do Moa que, em uníssono, arrebatam.

Findo o disco, resta na alma um som que não desencarna: é a música de Moacyr Luz rodopiando no peito de quem reconhece sua autoridade no samba.