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Do tronco ao poste: quem somos nós para condenar?

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Nesta semana nas redes sociais circulou com grande repercussão a comparação entre duas imagens veiculadas pela capa do jornal Extra: a primeira mostra um escravo sendo açoitado no tronco, remetendo ao Brasil na época da escravidão. A segunda mostra um homem amarrado em um poste, morto, vitima de um espancamento em São Luiz do Maranhão.

As imagens fazem uma comparação com uma cena de mais de 200 anos que se repetia no Brasil quando os escravos eram açoitados em praça pública para servirem de exemplo aos demais. A comparação nos faz refletir sobre qual época pertencemos e se estamos retrocedendo e continuando uma tortura só que hoje maquiada de “justiça com as próprias mãos”. A Lei Áurea foi sancionada há 127 anos, mas em 2015 assistimos com aplausos e manifestação de apoio a linchamentos públicos.

Quem se acha tão puro e santo a ponto de condenar um homem à morte por meio de um linchamento agressivo e criminoso. São mais criminosos os que cometem tamanha atrocidade com uma vida do que o homem que roubara o bar. Jesus pregava “quem não tem pecado que atire a primeira pedra”. Não defendo roubos, assaltantes nem bandidos, mas não posso abrir mão da justiça e dos direitos humanos.

O que mais entristece e assusta é a quantidade de pessoas que apoiam essa crueldade. Estes que apoiam são tão autores desse crime quanto os que o fizeram. Ninguém pode ser julgado a morte ou qualquer condenação, muito menos sem a mínima chance de defesa. Antes a população assistia aos linchamentos, hoje aplaudem a violência contra uma vida.

A escravidão ficou em 1888, mas a injustiça permanece forte em 2015. O ódio pregado por políticos, apresentadores sensacionalistas está tomando conta dos brasileiros. Cledenilson da Silva deixou uma mulher gravida de três meses. Infelizmente o ciclo da pobreza se repete nas famílias pobres e faz com que as pessoas sejam direcionadas ao caminho do crime. Não se justifica que o pobre tem que ser bandido. Sabemos da quantidade de trabalhadores, moradores de favela, negros que levantam todos os dias em busca do pão de maneira honesta. Mas convenhamos que o individuo que convive com todos os seus direitos de cidadania negados está mais propicio a se envolver na marginalidade.

Em uma época que assistimos a roubalheira milionária descoberta pelas operações de lava-jato, entre outras, é impraticável julgar a morte um pobre. Enquanto os verdadeiros ladrões continuam a ocuparem seus cargos, posições politicas e serem aplaudidos pela população. O Brasil está caminhando para um buraco profundo, o buraco do ódio.

* Davison Coutinho, morador da Rocinha desde o nascimento. Bacharel em desenho industrial pela PUC-Rio, Mestrando em Design pela PUC-Rio, membro da comissão de moradores da Rocinha, Vidigal e Chácara do Céu, professor, escritor, designer e liderança comunitária na Comunidade.