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BNDES, o Plano de Desenvolvimento de Favelas e a vida marginal

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Boaventura de Sousa Santos, sociólogo português, afirma que "as pessoas e os grupos humanos têm o direito a serem iguais quando a diferença os inferioriza, e o direito a serem diferentes quando a igualdade os descaracteriza". Em 2009 o tema da favela foi inserido pela primeira vez em uma sessão do Fórum Nacional, ação desenvolvida pelo Instituto Nacional de Altos Estudos, presidido por João Paulo dos Reis Velloso, ex-ministro do Planejamento e que se ocupava até então na discussão e proposição de ações nas esferas macroeconomica e política do país.

Em uma atividade, a intervenção sempre refinada – mas não menos contundente – de Itamar Silva, diretor do IBASE e uma das mais atuantes lideranças do Santa Marta, na ação de afirmar  que a favela é cidade, chamou a atenção e fez com que Reis Velloso percebesse que não há desenvolvimento pleno para o país sem a inclusão da favela, não no planejamento frio dos tecnocratas das salas geladas dos governos, mas na proposição, elaboração e execução destas propostas, de forma horizontal e corajosa.

De 2009 pra cá, após um sem número de encontros e algumas outras sessões do Fórum, novos atores foram inseridos no contexto, a presença negra da favela aumentou. Menos monocromático e mais diverso – o que certamente trouxe uma qualidade e dinâmica ímpar ao evento – o Fórum traz para a cena um ator fundamental, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Sua presença na construção do Plano de Desenvolvimento Econômico das Favelas é primordial, mas há de se ter nesta cena a generosidade dos grandes atores. Muito mais do que aportar verba no sonho de desenvolvimento das favelas de maneira tutelada, faz-se necessária a readequação da instituição para lidar com este fenômeno: a favela como protagonista do processo.

Torna-se quase pedagógica sua participação no sentido de entender que o diálogo com a favela deve trazer ao banco o desejo e o desafio de redesenhar sua forma de lidar com esta realidade, que será cada vez mais presente, e servir de modelo de  desenvolvimento integral e sustentável para outras áreas marginais no futuro. É preciso adequar-se à uma nova realidade: a favela não é mais a mesma. Os favelados não querem mais serem marginais, mas alcançar a centralidade do processo, não querem mais ser objeto de intervenção sem estar inseridos na totalidade destes processos, e nem tratados como se não soubessem o que querem. Sim, nós sabemos.

É necessário entender que se não houver uma flexibilização e um entendimento da realidade que cerca as instituições que estão nas favelas, se os atores que estão chegando para esta empreitada proposta pelo Fórum e pelas favelas não tiverem a sensibilidade de entender que se fala de um universo de cerca de mais de um milhão de pessoas, com um PIB de cerca de R$13 bilhões por ano – o que chega perto do PIB de muitas capitais brasileiras como Florianópolis, Natal e Cuiabá – , e que esse montante circulando nestas áreas pode se tornar uma saída para muitas mazelas históricas, e principalmente, fazer com que seja viável a permanência destas famílias  em seus locais de origem, onde construíram sua vida, sua história ou seja sua própria identidade, de fato não estaremos falando de inclusão. Até  porque a gama de tributos é inviabilizadora para esta realidade, que as  instituições não dispõem de reserva em caixa para fiar empréstimos do BNDES, resumindo, não estamos falando de dinheiro, estamos falando de pessoas, e esse é o segredo: entender que há pessoas e não permitir que vieses burocratizantes  impeçam a favela de sair de sua vida marginal. Favela é Cidade, que ela seja tratada como tal.

"A nossa luta é todo dia, Favela não é Mercadoria" 

*Mônica Francisco é representante da Rede de Instituições do Borel, coordenadora do grupo Arteiras e licencianda em Ciências Sociais pela Uerj.