ASSINE
search button

Dever de casa nota cinco

Compartilhar

Estava eu, posto em sossego, em meu escritório em Ponderosa, quando o vozeirão roufenho quase me matou de susto:
- Henrique Dourado, chefia? O que esse estagiário tem contra o menino Lincoln? Que teimosia!
Sim, era o Bagá! Que voltou a dar as caras na serra e já chegou reclamando da escalação contra o Vitória e, claro, da tragédia no Paraná:
- O que foi aquilo, pai do Céu? O Mengão não era! Ainda mais todo de azul. Aquela camisa dá uma zica que vou te contar...
Concordei com o ciclope (esse terceiro uniforme, aliás, me cheira a campanha eleitoral antecipada a favor da Chapa Azul, da situação), mas nem quis alimentar a discussão, pois a bola já rolava no Maraca. E com seis minutos, uma bomba de Vitinho explodia no travessão. O ciclope bramiu e o comentário seguinte veio com uma observação e uma crítica.
- Tomara que ele enfim estreie. Estamos precisando. Mas tem que deixar a fera mais solta no ataque. Vitinho não é ponta. É artilheiro.
Como de hábito, o sacrossanto crioulo estava prenhe de razão. E quando Diego, com a bola dominada, diminuiu a velocidade, para sofrer uma falta relativamente próxima à área, o ciclope suspirou fundo:
- Me leva à loucura essa mania do nosso dez, que prefere cavar a falta a seguir na jogada. E não tem treinador capaz de acabar com isso!
Pouco depois, dentro da área, Diego tocou para Renê, livre, e em vez de chutar, o lateral tentou um cruzamento que encobriu Dourado e não chegou a Paquetá. Em seguida, nova trama na área se perdeu no excesso de toques:
- Haja paciência com esse tico-tico no fubá! Chuta, cacilda! Bate no gol!
O tempo, porém, ia passando e o 0 a 0 continuava no placar. Trinta minutos de bola rolando e o ímpeto rubro-negro começava a arrefecer.
- Se esse primeiro tempo terminar em branco, já será uma derrota – disparou o Bagá, num muxoxo.
Aos 37 minutos, porém, Vitinho, o melhor em campo, voltou a chutar da entrada da área, obrigando Ronaldo a espalmar, com dificuldade.
- Só ele está jogando! O resto fica no maldito toque-toque, no frufru e nada.
Pois foi Vitinho, mesmo, quem iniciou a jogada do esperado gol. Do bico da área, colocou a bola na cabeça de Paquetá, que cabeceou, o goleiro do Vitória deu rebote e Diego mandou pra rede:
- *%#*@* Demorou! *@#%* – vibrou o colosso de ébano, com um chorrilho de palavrões, após um urro que fez meus cães ladrarem lá fora, convencidos de que um monstro invadira a casa. Não estavam errados...
O gol animou também o Flamengo, que voltou a pressionar e, numa trama de Diego com Renê, a bola chegou para Dourado, que concluiu pra fora!
- Bota o garoto Lincoln, estagiário! Esse bonde aí, não dá...
Veio o segundo tempo e o ceifador de oportunidades continuou em campo.
- Tem que fazer logo o segundo, ou vai acabar tomando sufoco de mais um time morfético da turma do Z-4 – advertiu o ogro.
Aos poucos, o Flamengo voltou a criar chances para marcar, mas abusava dos centros altos sobre a área:
- Isso me tira do sério, chefia. Deve estar faltando água no Ninho do Urubu. A turma só quer saber de chuveirinho...
Aos 16 minutos, para alegria do ciclope, entrou Lincoln e saiu Henrique Dourado. E aos 20, em bom passe de Everton Ribeiro, Paquetá quase marcou. Encobriu o goleiro com uma cavadinha, mas a bola, caprichosamente, saiu rente à trave.
- Tem que fazer logo o segundo, chefia. Tem que fazer... Quem não faz...
- Vira essa boca pra lá, Bagá!
Se no primeiro tempo, Vitinho foi o destaque rubro-negro, no segundo, quem se destacava era Everton Ribeiro. Mas, gol que é bom, nada. Até porque, quando Rodinei também participava das ações pela direita e seus cruzamentos eram desastrosos:
- Como é ruim, esse Rodinei! E o pior é que o reserva dele é o Pará! Como podem achar que o Mengo não precisa de laterais?
Pois é. Já próximo do final, entrou Marlos Moreno, saiu Vitinho. E o colombiano arrancou logo, driblando meio mundo, mas perdeu o controle da bola, na cara do goleiro:
- Isso é uma reencarnação do Cafuringa, chefia!
Em seguida, no primeiro ataque perigoso do Vitória, quase saiu o gol de empate – Diego Alves teve que fazer boa defesa:
- Não falei, não falei? Olha o perigo!
O 1 a 0, entretanto, prevaleceu e, na despedida, irritado, Bagá mandou a letra certa:
- Ganhamos, mas continuamos devendo, chefia. Pra sonhar com um milagre, na quarta que vem, no Mineirão, tem que jogar muito, mas muito mais que essa bolinha murcha aí...
Concordo em gênero, número e grau.

Tags:

futebol