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Bomba ou traque?

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O momento foi bem escolhido. Na véspera do Primeiro de Maio em que as centrais sindicais conseguiram fazer um ato unificado em Curitiba, em defesa do ex-presidente Lula, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, estragou a festa divulgando uma denúncia bombástica contra ele, a senadora Gleisi Hoffmann, os ex-ministros Paulo Bernardo e Antônio Palocci e o empresário Marcelo Odebrecht, por corrupção e lavagem de dinheiro.  Lula teria acertado com a empreiteira, em 2010,  uma doação/propina de US$ 40 milhões, ou R$ 64 milhões na época, em troca do aumento do crédito da Odebrecht junto ao BNDES para obras em Angola. Se não foi a pressa que prejudicou a divulgação da iniciativa, a Procuradora-Geral está devendo informações complementares que tornem a denúncia mais consistente.

A primeira fragilidade diz respeito ao destino dos recursos, que não são esclarecidos pela nota oficial postada no site da PGR. Ela diz que o valor “ teria sido usado pelo Partido dos Trabalhadores em diversas operações”, mas cita apenas o caso da senadora, em sua campanha ao governo do Paraná, em 2014. Ou seja, quatro anos depois do acerto. Gleisi e seu marido, Paulo Bernardo, diz a nota, teriam aceitado receber doação de R$ 5 milhões por caixa dois, tendo recebido pelo menos  R$ 3 milhões da Odebrecht “em oito pagamentos de R$ 500 mil cada, entre outubro e novembro de 2014”. 

Mas, por esta conta,  não teriam sido então R$ 4 milhões? O erro aritmético deve ter sido obra da pressa.  A  senadora é também acusada de ter declarado, em sua prestação de contas eleitoral,  um pagamento de R$ 3 milhões a uma empresa que disse ter recebido apenas R$ 1,1 milhão. Teria ocultado R$ 1.830.000,00, e por isso foi denunciada por lavagem de dinheiro.  Mas pelo recebimento de caixa dois da Odebrecht, seu caso não deveria ser tratado como o de Geraldo Alckmin, que foi encaminhado pelo STJ à Justiça Eleitoral paulista?

A fragilidade maior vem da falta de notícia sobre o destino dos outros R$ 61 milhões. Foram embolsados por Lula e os demais citados ou foram usados em campanhas do partido? Existem provas de como foram usados e por quem? Em relação a Lula, diz o jurista  Afrânio Silva Jardim, a PGR “não consegue apontar a prova de que ele tenha recebido, para si, qualquer valor econômico, condição para enquadrá-lo no crime de corrupção”. E se ficar provado que foram usados em campanhas do PT, diz ele, será caso de crime eleitoral. 

Para aumentar a carga contra Lula e o PT, a Lava Jato de Curitiba tem mais chances de êxito com a delação do ex-diretor da Petrobras Renato Duque do que a procuradora com sua denúncia que, por ora, está mais para traque do que para bomba. 

O FIM DO FORO O STF 

deve concluir hoje o julgamento que restringirá o foro especial para autoridades, questão na prática já resolvida: Oito dos 11 ministros já aprovaram o voto do ministro Barroso, pelo qual parlamentares só serão julgados pelo Supremo por crimes cometidos durante o mandato e relacionados com o cargo. Já havia maioria, portanto, quando o ministro Toffoli pediu vista do processo e com ele ficou seis meses. 

Hoje tramitam na corte 500 processos envolvendo autoridades com foro. Com a mudança, muitos deles descerão à primeira instância, desafogando o Supremo. Se as prisões em segunda instância forem mantidas, será um golpe na impunidade. Excelências serão presas após a segunda condenação. Mas se a prisão em segunda instância cair, elas ganharão tempo com recursos, apostando na prescrição dos crimes. 

FUI MAL 

Só falta um cadáver, disse eu na coluna de ontem, sobre a violência política em alta, citando a morte de Marielle e os tiros contra a caravana de Lula e o acampamento de seus apoiadores. Um paradoxo, pois Marielle já tombou, num crime político, embora de conotação ideológica não tão clara como os tiros que a extrema-direita tem dado contra militantes de esquerda.