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Movimentos antivacina ganham força ao redor do mundo

Apesar de existir, no Brasil grupo ainda é considerado pequeno

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Após uma explosão no número de casos de sarampo na Itália, Alemanha e Portugal, o tema dos movimentos antivacina voltaram à pauta.

Esses grupos são contrários à prevenção por imunização por diversos motivos, que vão desde razões filosóficas ao embasamento incorreto de informações.

Na Itália, por exemplo, das 1,6 mil pessoas que pegaram sarampo em 2017, 88% delas não tinham tomado nenhuma dose da vacina.

Para o Dr. Guido Levi, autor do livro "Recusa de Vacinas - Causas e Consequências" e primeiro secretário da Sociedade Brasileira de Imunização (SBIm), "algumas pessoas recusam vacinas por motivos filosóficos, por exemplo, antroposóficos, algumas por motivos de natureza médica, que têm opções médicas alternativas, por exemplo, usam a homeopatia".

Seguindo a mesma linha, o Dr. José Cassio de Moraes, professor adjunto da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP), ressalta à ANSA que muitas pessoas não conhecem os "beneficios que a vacinação traz e seu reduzido risco de causar reações adversas".

O médico ainda ressalta o risco que muitas pessoas correm por "lerem artigos ou publicações na internet, que não tem nenhuma base", como ocorre com uma série de mitos ligados à vacinação contra a gripe no país. Uma das bases científicas dos grupos contrários à vacinação se baseia em um artigo publicado na prestigiada revista "Lancet" por um médico britânico chamado Andrew Wakefild, que atrelou a frequência de casos de autismo com a vacina tríplice viral - que protege contra sarampo, rubéola e caxumba.

"O estudo [...]causou um prejuízo imenso na Europa com o reaparecimento do sarampo. Era um estudo fraudulento. Comprovou-se que o autor havia sido contratado por firmas de advocacia que queriam processar fabricantes da vacina. Foi o primeiro estudo publicado na Lancet a ser retirado dos anais da revista. No entanto, grupos antivacina o tratam com herói e dizem que ele foi perseguido", destaca o Dr. Levi.

Para a presidente da SBIm, Isabella Ballalai, o caso da "Lancet" deu força ao movimento antivacina na Europa e nos Estados Unidos. "É muito fácil um médico conceituado, numa revista conceituada, estabelecer um mito. Hoje melhorou a situação, mas continua havendo uma resistência grande à tríplice viral. No Brasil, isso não pegou", ressalta a líder da entidade à ANSA.

"EUA, Alemanha, Itália, Inglaterra, França, tem movimentos muito antigos, eu diria que desde essa história do autismo por uma questão cultural. Muitas vezes, se dá por questões políticas, já que o governo é quem faz as campanhas de vacinação, boatos, a facilidade da comunicação com que os mitos são criados. Não precisa ser médico nem jornalista para publicar um artigo médico sem embasamento", acrescenta Ballalai.

De acordo com o autor e médico, essa "recusa de vacinas é um fenômeno basicamente de classe A. Quase todos os casos de recusa de vacinas são de pessoas de categorias socioeconômicas elevadas". "Um estudo da USP [Universidade de São Paulo] de José Cássio de Morais mostrou que é um fenômeno tipicamente de classe A. Aí porque [essas pessoas] defendem homeopatia, antroposofia", acrescenta à ANSA.

Mas, quais os riscos de não tomar vacina?

Além do aumento de casos de doenças consideradas erradicadas ou sob muito controle, os riscos de não se vacinar atingem tanto o indivíduo como a sociedade no todo.

"Existem dois tipos de riscos: o individual dela, da pessoa, de ser infectada e ficar com aquela doença que pode levar ao falecimento e tem o risco que ela reduz a proteção coletiva. Há pessoas que não podem receber vacinas, porque estão em tratamento contra o câncer, por exemplo. Mas, elas estão protegidas porque as pessoas em volta dela estão imunizadas", explica Moraes.

Segundo o especialista da Santa Casa, caso uma pessoa que esteja em tratamento contraia uma dessas doenças, os efeitos nela "serão maiores" do que em uma pessoa que esteja saudável.

De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), entre duas e três milhões de mortes por ano são evitadas por conta da vacinação das pessoas, especialmente às ligadas à difteria, tétano, sarampo e rubéola. Por exemplo, no caso do sarampo, a OMS estima que as mortes caíram 74% entre 2000 e 2010 graças à intensificação das campanhas de vacinação pelo mundo.

Por outro lado, a entidade informa que cerca de dois milhões de pessoas morrem por doenças que já contam com imunização disponível.

Na mesma linha de análise, Levi ressalta que para conseguir controlar uma doença é preciso ter "um índice altíssimo de vacinação". "Se em um ano não vacina 5%, no outro mais 5%, acaba criando um número grande de pessoas não vacinadas e suscetíveis a doença. E aí surgem os surtos", diz o especialista.

Os surtos, como o que ocorre na Europa atualmente, fizeram com que o comissário da União Europeia para a Saúde, Vytenis Andriukaitis, emitisse um comunicado pedindo pela imunização e dizendo que as doenças atuais "são uma ameaça que não pode ser ignorada".

"As vacinas são uma das formas mais seguras e economicamente mais eficazes de assegurar a saúde pública e de prevenir doenças evitáveis", diz o comunicado da União Europeia.

- Questões médicas:

Além de famílias que se recusam a vacinar seus filhos onde a vacinação não é obrigatória, muitos médicos se posicionam contra a vacinação. Para Levi, o uso de vacinas na sociedade é tão importante para a humanidade como a água potável é para a sobrevivência.

"Alguns médicos dizem que o sistema imunológico da criança não pode responder tantos estímulos. Mas, algumas pessoas fizeram cálculos de que você poderia dar várias vacinas no mesmo dia que você não usaria o sistema imunológico inteiro mesmo assim. Outros dizem que o alúmen em algumas vacinas diminui imunidade. Mas, estudos mostram que leite materno e à base de soja têm muito mais alúmen do que nas vacinas. E ninguém falou que leite materno vai diminuir imunidade", ressalta o autor.

De acordo com Levi, "todos os argumentos médicos contrários às vacinas são absolutamente fáceis de se desmentir do ponto de vida cientifico". "Dei uma palestra para médicos e enfermeiras e perguntei: 'quantos de vocês viram casos de pólio?' Nenhum. 'Casos de sarampo?' Nenhum. Varíola, nem se fala. Se você quer ver como o mundo mudou com as vacinas, tem dados pra isso. Na Europa, eram 400 mil casos por ano de varíola, hoje está erradicada da face da Terra. Matou 3 milhões de pessoas quando os espanhóis a trouxeram para o novo mundo. Hoje, zero", finaliza.