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'WSJ': Crise de identidade leva Yahoo de líder a derrotado do mundo digital

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Matéria publicada nesta quarta-feira (27) no The Wall Street Journal conta que a venda do Yahoo Inc. para a Verizon Communications Inc. coloca um ponto de exclamação em um turbulento período de 20 anos que começou com o Yahoo no bem-sucedido papel de organizador da internet, mas que terminou com uma série de líderes fracassados e erros estratégicos. A agonia prolongada do Yahoo serve como caso clássico de uma empresa com uma dúvida existencial que seus inúmeros diretores-presidentes não conseguiram responder: O que é o Yahoo? Criado em um dormitório da Universidade de Stanford, em 1994, o Yahoo passou seus primeiros dez anos ganhando escala como um portal de internet. Aí, tanto o Google Inc. como o Facebook Inc. — que quase foram comprados pelo Yahoo — criaram bases lucrativas com ferramentas de busca e redes sociais. O Yahoo, com isso, acabou ficando para trás na economia on-line em rápida transformação que ajudou a criar. Sua receita e o número de visitantes caíram, enquanto a empresa penava para inovar seus vários serviços.

“Se você é tudo, você é meio que nada”, diz Brad Garlinghouse, um ex-executivo do Yahoo que, em 2006, escreveu o “Peanut Butter Manifesto” (Manifesto da Pasta de Amendoim, em tradução livre), um memorando interno criticando a empresa pelo excesso de diversificação. “A triste realidade [...] é que ele nunca resolveu sua crise de identidade.”

De acordo com a reportagem do jornal norte-americano, Garlinghouse diz que as estratégias voláteis do Yahoo frequentemente deixavam os funcionários confusos. Ele se recorda de, durante um retiro organizado pelo Yahoo em 2006, ter perguntado a gestores qual a primeira palavra em que pensavam quando ouviam o nome de uma empresa. No caso do Google, eBay e outros, as respostas foram claras: “busca” ou “leilão”. No do Yahoo, não. Eles disseram “e-mail”, “notícias”, “busca” e outras coisas. Uma série de seis diretores-presidentes em 20 anos intensificou a confusão, num vaivém entre tecnologia e mídia. Os fundadores Jerry Yang e David Filo inicialmente construíram um índice de sites de internet chamado “Guia para o World Wide Web de Jerry e David”, enquanto adiavam o seu trabalho numa tese. O primeiro diretor-presidente, um antigo roqueiro de cabelos grisalhos, Timothy Koogle, diz que entrou na empresa em 1995 sem nenhuma receita e com seis empregados que, segundo um recrutador, “precisavam urgentemente de supervisão de adultos”. No fim de 1997, o Yahoo estava entre os sites mais visitados. Ele listava 735 mil sites e oferecia gratuitamente e-mail, notícias, salas de bate-papo, atraindo 25 milhões de usuários únicos mensalmente. O salto explosivo no uso da internet alimentou o crescimento para 100 milhões de usuários, 2 mil funcionários e um valor de mercado de cerca de US$ 125 bilhões em 2000. Ao contrário dos rivais iniciais, o Yahoo já era lucrativo, em parte porque foi um dos pioneiros no uso da publicidade on-line.

O WSJ diz que aí veio o estouro da bolha da internet. A partir de seu auge, em 3 de janeiro de 2000, as ações do Yahoo despencaram 93% em 20 meses. Koogle pediu demissão em 2001 e a firma começou sua primeira reestruturação. O líder seguinte, Terry Semel, ex-executivo do estúdio Warner Bros., tentou transformar o Yahoo numa empresa de mídia. Ele queria cobrar mais tarifas por serviços premium, incluindo uma linha direta de astrologia que cobrava US$ 14,95 por pergunta. O Yahoo também parou de investir em sua ferramenta de busca, uma vez que seu índice de sites, que era gerenciado por pessoas, não conseguiu acompanhar a expansão da internet. Enquanto isso, outra dupla de estudantes de Stanford construiu um motor de busca baseado em algoritmos, que chamaram de Google. Ela seria a ruína do Yahoo. O Yahoo contratou o Google em 2000 para alimentar suas buscas, colocando o logotipo do Google em sua caixa de buscas. Semel discutiu a compra do Google com os fundadores Larry Page e Sergey Brin por US$ 1 bilhão, mas eles não chegaram a um acordo sobre o preço. Em 2002, a grande presença do Google no comércio on-line fez a sua receita disparar. Semel mudou de estratégia. O Yahoo pagou US$ 1,9 bilhão por duas empresas de tecnologia de busca e começou a alimentar suas próprias buscas em 2004. Semel também perdeu outra aquisição que daria ao Yahoo uma presença forte nas redes sociais e atrairia a cobiçada audiência jovem. Em 2006, o Yahoo chegou a negociar a compra do Facebook por US$ 1 bilhão, mas novamente as conversas foram encerradas por divergências quanto ao preço. O valor de mercado do Facebook hoje supera US$ 340 bilhões.

O The Wall Stree Journal fala que a Yahoo nunca conseguiu se recuperar. Em 2007, quando Semel pediu demissão, as vendas do Google eram mais que o dobro dos US$ 7 bilhões registrados pelo Yahoo. Semel e outros ex-diretores-presidentes do Yahoo não quiseram comentar ou não responderam a pedidos de entrevista. O próximo diretor-presidente foi Yang, um dos fundadores, que se comprometeu a remodelar a empresa. No início de 2008, a Microsoft Corp. fez uma oferta hostil para comprar o Yahoo por cerca de US$ 45 bilhões, um prêmio, na época, de cerca de 60%. Yang e o conselho rejeitaram as investidas da Microsoft por meses. Investidores irritados, incluindo o ativista Carl Icahn, tentaram tirar Yang do cargo e acabaram conquistando três assentos no conselho.

Questionado, em uma conferência do The Wall Street Journal, sobre como ele definiria o Yahoo, Yang teve dificuldade para dar uma resposta simples. “Eu penso no Yahoo como, nós temos que ser incrivelmente relevantes e significativos para os consumidores”, disse ele. “E definimos isso como um ponto de partida. Nós queremos que você inicie seu dia no Yahoo.” Em novembro, Yang pediu demissão.

O Journal acrescenta que depois, vieram Carol Bartz, da Autodesk Inc., e Scott Thompson, do PayPal, que enfatizaram respectivamente os setores de mídia e de comércio eletrônico. Com a saída de Thompson, em 2012, o Yahoo voltou para suas raízes tecnológicas com Marissa Mayer, ex-gerente de produto do Google. Ela se concentrou na melhoria de produtos como e-mail e o site de compartilhamento de fotos Flickr, ao mesmo tempo em que ampliou os investimentos em software para celulares, vídeos on-line e ferramentas de busca. Em busca de talentos, ela também investiu cerca de US$ 2 bilhões na aquisição de mais de 50 startups. 

A estratégia não conseguiu evitar a saída de profissionais talentosos e a queda de receita. Se ela fez algo, foi tornar clara uma verdade sobre o Yahoo: ele continua um portal de internet ambíguo, finaliza o The Wall Street Journal.