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'DW': "Brasil vai perder muitos cérebros com fim do Ministério da Ciência", diz especialista da Nasa

Astrofísica critica fusão das pastas de Ciência e Comunicações pelo governo interino

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O jornal alemão Deutsche Welle publicou nesta segunda-feira (13) uma matéria onde Cientistas denunciam um retrocesso político e estratégico por trás da fusão do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação com o das Comunicações no Brasil. A pasta, criada em 1985 como parte do processo de redemocratização, foi extinta num momento de crise política profunda, após o afastamento da presidente Dilma Rousseff. O movimento reabre o debate sobre o papel do conhecimento no desenvolvimento nacional.

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Segundo a reportagem, as principais instituições científicas do país, como a Academia Brasileira de Ciências, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, a Fiocruz e diversas universidades federais, já se pronunciaram contrárias à fusão. Cientistas foram às ruas em diversas manifestações pedindo a volta do MCTI.

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Em entrevista à DW, a astrofísica Duília de Mello, que trabalha na Nasa e na Universidade Católica da América (CUA, na sigla em inglês), em Washington, frisa que investir em ciência é cuidar das "raízes do país". E considera preocupante os políticos brasileiros não compreenderem esse fato.

DW: Como você vê a extinção do Ministério da Ciência Tecnologia e Inovação?

Duília de Mello: É o fim da picada, fiquei deprimida. É um retrocesso de décadas.

DW: Por que é um retrocesso?

Quando você acaba com um ministério dessa envergadura, você está também acabando com toda uma estrutura para a administração da ciência e tecnologia no país. Sob o ministério estão, por exemplo, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a Agência Espacial Brasileira, o Laboratório de Luz Síncrotron, o Observatório Nacional. Não temos mais um guarda-chuva, é um problema complexo; a quem todas essas instituições se reportam? O orçamento de todos os laboratórios de pesquisa do país vem do ministério, é importante ter um órgão que administre tudo isso, que estabeleça as prioridades da ciência.

DW: A astrofísica Duília de Mello trabalha na Nasa. A fusão foi um erro?

Foi um gesto irresponsável, para dizer o mínimo, principalmente numa área tão importante para o Brasil. Poderiam ter enxugado o ministério, diminuído a estrutura, mas não acabar com ele assim, e ainda botar junto a outro ministério com o qual não tem nenhuma afinidade. Vejo com muita preocupação essa medida do governo, que, aliás, é um governo interino. Não conheço a lei, mas acho que um governo interino não poderia estar fazendo todas essas mudanças tão rapidamente.

DW: Como é a repercussão dessa medida no exterior?

É terrível, passa uma visão muito ruim do Brasil. Até porque o país participa de vários projetos internacionais, como o do Laboratório LHC [o grande colisor de partículas, na Suíça], o Observatório Europeu. Enfim, são muitos projetos. Eu não queria estar na pele desses pesquisadores.

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DW: Em relação aos pesquisadores mais jovens, que estão se formando agora, qual é o impacto dessa medida?

Ciência tem que ser levada a sério. O Brasil vai perder muitos cérebros com essa medida e dá um sinal muito ruim para os jovens que investiram na carreira, que estão começando carreira. Eles têm possibilidade de sair do país e é possível que o façam. Realmente não vejo nada positivo nesta decisão. Fico muito preocupada.

DW: O ministério foi criado no governo de Tancredo Neves, em pleno processo de redemocratização do Brasil após mais de 20 de ditadura. De lá para cá, o que mudou na ciência brasileira?

O ministério organizou a ciência brasileira, e isso é uma coisa muito importante. Os grandes laboratórios e os institutos passaram a ser todos ligados ao ministério e isso fez com que melhorassem muito. Muitos deles, por exemplo, eram improdutivos, não havia prioridades como tem hoje. Os recursos e as prioridades passaram a ser coordenados. As sociedades científicas têm contato direto com o ministério. E é por isso que a ciência brasileira está indo bem.

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DW: Então por que tanta gente critica a ciência brasileira?

Claro que a ciência brasileira poderia estar melhor, claro que precisa de mais recursos, mas está indo bem. A gente vê melhoras significativas nesses mais de 30 anos. O número de publicações de cientistas brasileiros aumentou exponencialmente [o Brasil é o 13º país no ranking mundial de produção científica], a participação do Brasil em projetos científicos internacionais de grande porte também aumentou.

Hoje há muitos cursos de doutorado no Brasil, bons cursos, ninguém mais precisa ir para o exterior para fazer um bom doutorado. E isso tudo é fruto do ministério. Ele também criou, há uns dez anos, toda uma área para divulgação da ciência, o que nunca existiu no Brasil, para popularizar a ciência, levá-la às regiões mais carentes. Não consigo entender como a ciência não é prioritária num país como o Brasil, acho preocupante ter que explicar a importância da ciência para os políticos.

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