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Fernando Henrique Cardoso abre “Fronteras de la Ciencia”

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Na abertura do evento “Fronteras de la Ciencia – Brasil y Espanha en los 50 años de la Fapesp”, nesta segunda-feira (10), foi anunciada a abertura da primeira chamada de propostas a se realizar no âmbito do acordo de cooperação científica da Fapesp com a Universidade de Salamanca (Usal).

Inicialmente, as áreas cujos projetos poderão ser contemplados com 10 mil euros de cada entidade por projeto serão: Física (semicondutores, laser pulsado, espectrometria), Matemática, Climatologia, Engenharia Química, Ciências da Vida (parasitologia, bioquímica, biologia celular e molecular, neurociência, cardiologia e câncer), Agricultura (microbiologia e genética, biologia molecular), Enfermagem, Farmacologia, Direito, História, Pedagogia, Biblioteconomia e Comunicação. A chamada de propostas deverá ser publicada no dia 17 de dezembro.

O evento “Fronteras de la Ciencia” integra as comemorações dos 50 anos da Fapesp e reúne, nas cidades de Salamanca (10 a 12) e Madri (13 e 14), pesquisadores do Estado de São Paulo e de diferentes instituições de ensino e pesquisa do país ibérico, em uma programação intensa, diversificada e aberta ao público.

A série de conferências foi aberta pelo sociólogo e ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, que discorreu sobre o panorama da ciência política no Brasil e suas perspectivas para o futuro. O tema central do primeiro dia do evento foi “Ciência Política e Humanidades”.

Cardoso, que recebeu este ano o Prêmio Kluge, comparável ao Nobel nas ciências sociais, e é doutor honoris causa da Universidade de Salamanca desde 2002, é professor catedrático de ciência política na Universidade de São Paulo, embora tenha tido formação como sociólogo.

Em sua fala, disse que “o que une as pessoas na universidade é um sentido de cooperação, de pertencer a uma comunidade; a universidade prima pelo saber, mas também pelo sentido de compartilhar”, razão por que eventos como o que promove a FAPESP e a Universidade de Salamanca têm tanta relevância, na medida em que estimulam essa cooperação em nível internacional.

O sociólogo relatou que, em sua origem no Brasil, a ciência política tinha “uma obsessão” por desvendar “as bases da formação” do país, que eram um Estado colonial patrimonialista e uma economia exportadora e escravista. Sua própria tese de doutorado na Universidade de São Paulo, de 1961, foi sobre capitalismo e escravidão no Brasil meridional.

“Eram estudos parapolíticos sobre as bases do Brasil e como se distribuía o poder”, disse Cardoso, que citou entre os grandes precursores e pioneiros desses estudos Raymundo Faoro, Gilberto Freyre e Oliveira Vianna.

Depois dessa fase inicial, a maior complexidade da sociedade brasileira, derivada do processo de industrialização e urbanização, novos temas e preocupações se agregaram às preocupações dos estudiosos. “Não era mais possível explicar [o fenômeno social brasileiro] com esquemas simplistas”, disse.

O percurso foi acidentado, inclusive devido às ocorrências políticas que truncaram a primeira experiência democrática iniciada em 1946, mas progrediu, mesmo ainda durante a vigência do regime militar instaurado em 1964.

“Muita gente se refere aos anos 1980 como a década perdida. Eu não concordo. Pode ter sido perdida economicamente, mas foi nela que se fortaleceu a sociedade civil, graças à atuação da Igreja, dos meios de comunicação, dos sindicatos”, afirmou o ex-presidente da República.

Com a Constituinte de 1986 e a Constituição de 1988, consagraram-se as mudanças que já vinham ocorrendo fazia algum tempo. “O Brasil mudou muitíssimo. Não que o patrimonialismo tenha acabado, mas surgiram outras forças, há luta agora”, ressaltou.

Para a ciência política, os temas prioritários passaram a ser “o estudo das instituições, a análise e avaliação de políticas públicas, o conhecimento dos partidos políticos, das eleições e dos movimentos sociais”, disse.

A fim de ilustrar as enormes diferenças na forma de fazer ciência no Brasil, Cardoso relatou que a análise dos dados da pesquisa para sua tese de doutorado foi feita na administração da Faculdade de Medicina, onde havia um único computador IBM disponível. Era preciso passar as respostas que colhera em campo para cartões perfurados manualmente e depois processados pelo computador.

Para o futuro, o ex-presidente afirmou que o grande assunto deverão ser as novas formas de expressão política e de comunicação representadas pelas redes e mídias sociais. Citou o sociólogo espanhol Manuel Castells, que em sua opinião é um dos que melhor tem analisado esse fenômeno. “Criam-se agora comunidades virtuais, e é preciso entender como elas funcionam e como afetam a vida política”, disse.

Cerca de 200 pessoas assistiram à palestra do ex-presidente. A mesa da sessão inaugural foi presidida pelo reitor da Universidade de Salamanca, Daniel Henández Ruipérez, e composta pelo embaixador do Brasil em Madri, Paulo Cesar de Oliveira Campos, pelo presidente da FAPESP, Celso Lafer, pelo ex-reitor da Usal e, a partir de janeiro, novo presidente do Centro de Estudos Brasileiros da universidade, Ignácio Berdugo Gómez de la Torre, e José Manuel Moreno Aeria, do Banco Santander, que apoia as atividades do Centro de Estudos Brasileiros.

Lafer anunciou que em 2014 será realizada em São Paulo a segunda edição de “Fronteras de la Ciência” e que em 2013 as comunidades científicas paulista e espanhola serão consultadas para a definição do temário que constituirá o simpósio.

Agência Fapesp