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Por detrás da Copa

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Martinho Neves Miranda, Jornal do Brasil

RIO - Até 11 de julho, todos os olhares se voltam para a África. De quatro em quatro anos é assim: só se fala em Copa do Mundo. Até aqueles que não se interessam por futebol passam a folhear os cadernos de esportes dos jornais e assistem aos programas de TV especializados no assunto.

Mas esta é também uma oportunidade para termos uma visão política, social e jurídica das estruturas que governam o esporte e que terão muita influência no nosso país nesta década em que realizaremos os mais importantes megaeventos internacionais. Como por ora só se fala em Copa, vejamos, por exemplo, a dona dessa competição, a todo-poderosa Fifa.

Enganam-se aqueles que pensam que a Fifa é uma mera organizadora de eventos internacionais de futebol, pois a Copa é apenas um cartão de visitas daquela que é uma das organizações não governamentais mais pujantes da nossa era.

Em termos de representatividade mundial, pode-se dizer que a Fifa já superou a ONU, já que a matriz do futebol conta com mais federações nacionais filiadas do que o número de países vinculados à Organização das Nações Unidas.

Ocorre que, ao contrário da ONU, a Fifa conseguiu fazer com que suas normas se tornassem universais, sendo religiosamente observadas pela unanimidade de confederações, federações, clubes e demais profissionais do futebol.

Sob esse aspecto, só podemos equiparar essa força normativa da Fifa, que é centenária, com uma instituição milenar, que é a Igreja Católica, que também possui o seu polo de irradiação normativo emanado soberanamente de uma única fonte, que é o Vaticano e que se impõe perante todo o universo eclesiástico do planeta.

Assim, a exemplo do que ocorre na Igreja, que possui práticas idênticas em todo o mundo, vemos que o futebol também tem a sua própria liturgia, sendo comum dizer-se que no mundo do futebol todos falam a mesma língua .

E a unificadora dessa linguagem foi precisamente a Fifa. O problema é que ultimamente sua codificação não vem se restringindo apenas aos assuntos meramente desportivos.

Basta lembrarmos que ela impõe regras a serem observadas por Estados soberanos, expede regulamentação sobre contratos, dita normas trabalhistas, além de proibir os seus filiados de recorrerem ao Judiciário para contestar suas decisões, o que vem sendo surpreendentemente respeitado por todos, ante o temor de ficarem de fora desse universo, já que a Fifa exerce um verdadeiro monopólio na organização da indústria de entretenimento mais importante do globo, que é o futebol.

É bom refletirmos, portanto, que a Fifa construiu silenciosamente um mundo à parte, alheio à ingerência dos Estados, demonstrando que, sob o véu da Copa e do esporte mais popular do planeta, se esconde uma instituição que é detentora de um poderoso e gigantesco império que movimenta cifras consideráveis: o império da bola.

Martinho Neves Miranda é advogado especializado em direito desportivo e colaborador da Comissão de Esporte e Lazer da OAB/RJ.