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Pag. 33 - Uma viagem ao Oriente

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Antônio Campos ADVOGADO, ESCRITOR E CURADOR DA FLIPORTO O livro Uma viagem à Índia (Edições Leya, 2010) do autor angolano Gonçalo M. Tavares, é admirável. Usando o modelo de Os lusíadas , é uma revisitação original do mito cultural e literário do Oriente, que é o tema da Fliporto 2011.

O seu verdadeiro poema épico com dez cantos, que se estende por 452 páginas, cria um personagem, Bloom, verdadeiro Ulis ses do século 21, que vai à Índia em busca de sabedoria. A busca da terra da promissão da alma onde um Ocidente sem ela imagina encontrar, até descobrir que os sem gurus são mistificadores, na sua visão. No seu livro, a solidão, o erotismo, a crueldade humana, entre outros males contemporâneos, cumpre o papel de monstros marinhos a serem enfrentados.

O autor esteve na Fliporto 2009, quando autografou o seu livro Jerusalém e abordou o tema de outro romance: Aprender a rezar na era da técnica . Agora, estamos o convidando novamente para ele falar, na Fliporto 2011, sobre o tema Uma viagem ficcional ao Oriente , que tão originalmente escreveu no seu livro Uma viagem à Índia .

Eduardo Lourenço, no brilhante prefácio do livro de Gonçalo, adverte-nos que: “Quando chegamos à Índia – os que por nós lá foram para sempre e lá ficaram –, há muito que ela era para o Ocidente a porta aberta e misteriosa para uma quietude capaz de nos curar do nosso demoníaco desassossego. Mas foi a nossa chegada que a converteu para os outros em lugar de todos os sonhos e fantasmagorias. Para nós, todas as viagens são viagens à índia. E não é o menor dos seus desafios e atrevimentos que Gonçalo M. Tavares nos proponha repetir a viagem arquétipo à terra onde realidade e sonho se confundem, subvertendo o sentido da viagem canônica do Ocidente em aventura da ilusão de todas as buscas divinas e epopeia luminosa da decepção.

Uma decepção à altura do desespero e da agonia ocidental no momento mesmo em que a sua história e meta-história, como pulsão conquistadora e épica, converteu o Ocidente inteiro e a sua cultura sob o signo de Ulisses em êxtase vazio, fascinado pelo esplendor do seu presente sem futuro utópico, glosando sem descanso a sua proliferante ausência de sentido”.

Em seu livro, Gonçalo Tavares conseguiu fazer uma obra que consegue atingir a Índia, desmentindo Kafka que assinalou: “Já no tempo de Alexandre as portas da Índia estavam fora de alcance, mas, ao menos, o gládio do rei mostrava a sua direção. Hoje, as famosas portas estão mais longe e mais inacessíveis; mas ninguém mostra a direção; muita gente brande gládios mas o olhar que pretende segui-los perde-os de vista” (Franz Kafka, O novo advogado , em Metamorfose ). Vale a pena viajar à Índia através do livro de Gonçalo.