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Além do chip na bola

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O uso de recursos, como a análise de vídeos e o chip na bola na Copa do Mundo da Rússia, reforça a tendência de aproximação entre a tecnologia e o futebol. Na última Olimpíada vimos um movimento parecido em diversos esportes. A Fifa resistiu o quanto pôde até aceitar que o mundo do esporte também mudou, e 2018 será um marco dessa relação que, inevitavelmente, será simbiótica. O que hoje funciona para ajudar a resolver um pênalti ou apontar se uma bola ultrapassou a linha do gol se tornará rapidamente um item tão elementar quanto os uniformes leves ou as chuteiras de alta performance, que já estão em todo lugar. 

O que veremos acontecer, em larga escala, na sequência dessa relação tech-sports é a utilização de softwares e técnicas de big data. Originalmente, o termo refere-se a um conjunto de dados tão volumoso e complexo que os softwares tradicionais não conseguem tratar. Ultimamente, o termo tem sido utilizado em iniciativas de análises que buscam prever ou explicar comportamentos de usuários, cliente ou, neste caso, jogadores de futebol. 

Os dados coletados a partir das movimentações dos jogadores, características do time, dos adversários e quase infinitas combinações de jogo são usados, cada vez mais, para que técnicos desenhem suas estratégias de jogo. Quando a bola está rolando, as estatísticas colhidas durante a partida sobem para a nuvem e abastecem ferramentas em tempo real. Assim, o treinador e sua equipe podem usufruir de dados como algoritmos, redes neurais, programas que registram padrões para fazer projeções de curtíssimo prazo. 

Em 1986, o pesquisador Mike Hughes fez uma análise estatística rudimentar e afirmou que times de sucesso faziam um jogo de passe em sua metade do campo e se aproximam do outro lado predominantemente pelo meio. Por outro lado, os dados também mostram que, no mesmo ano, equipes mal-sucedidas jogaram significativamente mais pelas laterais em todo o percurso do ataque até a defesa. Ele também afirmou que a quantidade de chutes está relacionada à quantidade de gols de uma equipe. Isso mostra que o ditado do “água mole em pedra dura” faz mais sentido no mundo da bola do que o “quem não faz, leva”. Surpreendentemente os números da temporada 2016-17 das principais ligas da Europa confirmaram a constatação feita 30 anos antes.

A seleção alemã usou uma solução da empresa conterrânea SAP, chamada Match Insights, na Copa de 2014. Os dados permitiram melhorar o jogo da equipe. Os tetracampeões, por exemplo, foram capazes de saber que os franceses concentravam seu jogo no meio e deixavam espaços nos flancos. Assim, venceram as quartas de finais. Na semifinal com o Brasil, eles já sabiam as jogadas preferidas da nossa seleção e as reações de seus jogadores em situações adversas. 

O SAS Institute, um dos líderes mundiais de análise de dados, já roda em algumas empresas do basquete americano. Em pouco tempo, clubes, seleções e associações esportivas, dentro e fora do futebol, criarão ou contratarão empresas e profissionais para realizar análise de desempenho de jogadores, suas equipes e adversários.

Uma outra categoria importante da relação entre tecnologia e esportes gira em torno de aplicativos orientados a negócios. Isso inclui análises de preço de ingressos, análise de fidelidade de fãs, promoções, mídias sociais e fidelização. Embora haja um interesse considerável nesse tipo de análise entre os profissionais, é razoável dizer que recebe menos atenção e apoio do que a análise de desempenho de jogadores e equipes.

É interessante perceber, no entanto, que a genialidade e técnica apurada ainda são os ativos mais importantes. Prever o futuro nem sempre é suficiente para resolver a questão. Dois exemplos são Garrincha e, recentemente, Robben, da Holanda. Todos sabiam para onde eles iam driblar, mas a habilidade dos craques era superior à previsibilidade de suas ações. O melhor é que nem precisa combinar com os russos.

* Professor e coordenador de MBA em Marketing Digital da Fundação Getulio Vargas