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A aposta de risco do mercado

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Recentemente, com dezenas de outros correntistas, assistimos a exposições, separadas, de dirigentes de dois grandes bancos brasileiros sobre as expectativas econômicas e políticas para este ano eleitoral. Em comum, diagnósticos econômicos, relativamente, otimistas, baseados na crença de que o novo presidente será alguém assimilável pelo mercado, por proximidade ideológica ou por domesticação pragmática. Os exegetas vocalizavam os estudos de seus abalizados consultores em ambas as áreas, mas havia um de desbragada torcida para transformar em consolo o que parece catástrofe. 

Com Lula fora do jogo, as pesquisas contemplam Jair Bolsonaro, Marina Silva, Ciro Gomes e Geraldo Alckmin. Por precaução, não devemos excluir ainda o futuro postulante petista. Provavelmente, o segundo turno abrigará dois desses cinco pretendentes. Nesse elenco, o candidato natural do mercado seria Alckmin, pela colagem ideológica, pela experiência político-administrativa e por não sugerir solavancos na condução econômica do país. As circunstâncias do processo, no entanto, não lhe são favoráveis. Há na sociedade uma condenação quase generalizada à classe política tradicional, e ele carece de uma identidade pública marcante e animadora. Além disso, para Alckmin crescer, necessitaria que Bolsonaro murchasse, pois o capitão rouba-lhe potenciais eleitores, justamente pela sua falta de vigor e de perspectiva. 

Com Alkmin, aparentemente, infertilizável, o mercado, em desespero, começa a achar que Bolsonaro não é tão mefítico quanto parece. E aí ludibria-se. Primeiro, do ponto de vista eleitoral. Com ele no segundo turno, as pesquisas projetam disputas acirradas e indefinidas. Na verdade, é o adversário cobiçado por todos os concorrentes. Complicações imensuráveis, entretanto, poderiam advir de Bolsonaro vencer o pleito. Teríamos um presidente despreparado, com precário apoio parlamentar, forçado a formar governabilidade com a massa inorgânica e oportunista do Congresso, a preço previsto. Na esfera econômica, Bolsonaro é um tosco estatista que representa a antítese dos enunciados do mercado, que só se ilude com ele por infecção ideológica. A presença do economista Paulo Guedes por trás da figura é conforto simplista para quem só enxerga o seu quintal. O receituário liberal de Paulo Guedes dista sobremodo das práticas do candidato, e tenderia a se tornar ficcional. O pior de tudo, entretanto, decorre da enorme probabilidade de aumento de tensão na sociedade, caso ele venha a triunfar. Além das forças esquerdistas convencionais, somar-se-ão contra Bolsonaro, nas trincheiras digitais e nas ruas, os militantes das diversas lutas identitárias (tão atacadas por ele) e, até, segmentos de centro, críticos à sua pregação extremada. Com Bolsonaro na Presidência da República, derrotam-se as esquerdas, é fato, mas ampliam-se as chances de cataclismo social e de incertezas no ambiente de negócios, o que vulnerabilizaria a saúde do mercado. 

Que os vorazes bancos errem em suas estratégias políticas, é problema deles. No entanto, resulta em um problemão para os seus milhões de clientes quando os bancos tomam as suas posições de investimento, com o dinheiro dos correntistas, em função de análises vesgas e de opções equivocadas, lastreadas mais em sonhos editados do que na realidade. Na própria lógica do mercado, entre os candidatos competitivos, Bolsonaro é a aposta de maior risco, e o único devoto de soluções autoritárias.

* Jornalista