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A nova revolução chinesa: Parte 1

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As tarifas de importação anunciadas semana passada são um claro sinal de que uma guerra comercial entre EUA e China é iminente. Donald Trump alega que há um desequilíbrio muito grande na relação entre os países. Os chineses afirmam que apenas contra-atacaram. Porém, a medida de Trump vai muito além do déficit dos EUA na balança comercial. Sua verdadeira preocupação é a intenção dos asiáticos de se tornarem a maior superpotência mundial, usando tecnologia e aumentando sua influência em outras regiões. A estratégia chinesa é composta por três planos: o Made in China 2025, o IA 2030 e o Belt and Road Initiative. Hoje irei me concentrar no primeiro; os dois últimos serão assunto do próximo artigo.

Em 2015, Xi Jinping, presidente chinês, anunciou o Made in China 2025. O programa estabeleceu dez áreas inovadoras para se tornar referência global. As escolhidas foram: robótica; veículos de energia limpa; biotecnologia; indústrias aeroespacial, naval e ferroviária avançadas; energia elétrica; novos materiais (como de células solares); hardware e software de alto desempenho; e máquinas agrícolas.

A área de tecnologia é que mais vem chamando atenção. As duas maiores empresas da China no setor, Alibaba e Tencent, estão avaliadas em mais de US$ 500 bilhões. O protecionismo do governo chinês ajudou (Google e Facebook são proibidos por lá, por exemplo), mas seria injusto usar esse argumento para explicar tamanho valor de mercado. Os investimentos no desenvolvimento de empresas da área são impressionantes: saltaram de US$ 14 bilhões em 2012 para US$ 120 bilhões em 2017. Ano passado, 34 startups chinesas se tornaram unicórnios (com valor de mercado de US$ 1 bilhão ou mais), ou seja, 35% de todas as companhias que conseguiram o feito no mundo. Os EUA ainda lideraram, com 41,3%, mas o gap já foi muito maior: em 2014, eram 13,9% contra 61,1%. Outro sinal do avanço chinês em tecnologia é o fato de que, dos 500 supercomputadores mais rápidos do mundo, 202 ficam no país. 

A indústria de chips é fundamental nos planos tecnológicos de Xi Jinping, mas ainda pouco desenvolvida na China. A dependência estrangeira é muito grande (90% dos chips usados por lá são importados, especialmente dos EUA), por isso o governo pretende anunciar, em breve, um fundo exclusivo, estimado em US$ 47 bilhões, para fomentar a indústria local, com foco em chips de 5G e inteligência artificial.

No setor automotivo, a China começa a se destacar, impulsionada pelos carros elétricos. Segundo projeções, em 2040, 54% dos veículos vendidos no mundo serão de energia limpa. Os chineses já são o maior mercado mundial no segmento e, no Salão de Automóveis de Pequim deste ano, 174 modelos foram apresentados, sendo 124 desenvolvidos localmente. A proeminência do país se dá também nas baterias, uma vez que 60% do cobalto refinado do planeta (fundamental na produção delas) são de propriedade de companhias chinesas. Os carros autônomos são outros que irão contribuir para os planos dos asiáticos. São estimados que 33 milhões deles serão vendidos em 2040 e a já citada Tencent, além da Baidu (outra empresa importante de tecnologia), investem pesado no desenvolvimento dessas aplicações.

No campo científico, os chineses brigam de igual para igual com os americanos, pelo menos em publicações de pesquisas. Em 2016, foram 426 mil artigos publicados, contra 409 mil dos EUA. O setor de biotecnologia deve corresponder a mais de 4% do PIB em 2020, estimulado pelos mais de 100 parques científicos que existem ao redor do país.

Como vimos, o Made in China 2025 anda a todo vapor e empresas chinesas começam a ganhar protagonismo nos principais setores atualmente. Na próxima quarta-feira, irei comentar sobre o IA 2030 e o Belt and Road Initiative, outros motivos para as dores de cabeça de Trump.

* Especialista em inovação e novas tecnologias