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Premissas do desenvolvimento econômico

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As circunstâncias às quais o Brasil está submetido geram compreensível angústia entre todos que almejam viver em um país com estabilidade política, respeito aos direitos constitucionais e índices declinantes nas severas disparidades sociais que ora se agravam. Políticas de restrição dos gastos públicos em saúde e educação e o desfazimento de intervenções geradoras de externalidades que estimulem o investimento privado só fazem tornar a situação mais difícil. 

O contexto de deterioração impele profissionais comprometidos com um projeto democrático a buscar alternativas para o soerguimento do país. 

W.W. Rostow é categórico em assinalar a necessidade que algum grupo da sociedade tenha vontade e autoridade para difundir as mudanças. Ainda que apresentando restrições à abordagem de Rostow, Gerschenkron converge quanto aos aspectos que devem respaldar o direcionamento para o desenvolvimento. Segundo ele, o esforço grande e repentino da industrialização clama por um New Deal das emoções. Entre nós, a formatação das propostas deve dialogar com amplos círculos sociais. A formação de uma opinião favorável ao desenvolvimento, em moldes democráticos e inclusivos, é prioritária. 

Pontuarei brevemente dois tópicos inevitáveis ao debate. O primeiro é a configuração onde o agronegócio é privilegiado, enquanto políticas industriais são ausentes de diretrizes governamentais. A geração de externalidades pelo agronegócio é pouco significativa, enquanto a desindustrialização em curso empobrece o tecido econômico e esfarela as cadeias produtivas. A pauta de exportações baseada em produtos primários carrega a fragilidade intrínseca à performance das matérias-primas ao longo dos ciclos econômicos. Como assinalou Kalecki, os preços de produtos industriais são principalmente o reflexo de seus custos de produção, enquanto o preço das matérias-primas é determinado pela demanda. Esses preços “caem bastante com a contração da atividade econômica”. Quando desdobramos esse raciocínio aos ciclos do comércio internacional, percebemos quão frágil a expectativa de contribuição estável das matérias-primas no que se refere à balança comercial. A combinação de subsídios ao agronegócio e desestímulo à diversificação de cadeias produtivas industriais implica num crescente engessamento das possibilidades de diversificação da pauta de exportações e restringe o raio de manobra das políticas para sustentação da atividade econômica. Mesmo o espaço de políticas de curto prazo de corte keynesiano, para manutenção de renda perante turbulências internacionais, incide sobre a manutenção do consumo doméstico de manufaturas e alimentos produzidos para consumo interno, não tendo como afetar os volumes e os preços das exportações de produtos primários. 

Outro tópico diz respeito ao sistema financeiro. Como exemplificado no editorial do JB de 15 de abril, o oligopólio bancário exerce juros proibitivos perante qualquer proposta de desenvolvimento. Em termos concisos, não se trata de questões de funding, mas da destinação de recursos para títulos públicos e empréstimos de curto prazo. Ao tratar do papel dos bancos no desenvolvimento econômico da França e Alemanha, Gerschenkron assinala que os bancos universais reciclavam saldos médios de depósitos de curto prazo em financiamentos de longo prazo. A estrutura de captação dos bancos brasileiros é similar ao modelo dos bancos universais, mas as inversões são baseadas em empréstimos de curtíssimo prazo e investimentos na dívida pública. Uma inversão de prioridades dos bancos públicos poderia ser um ponto de partida relevante para a “replicação” nacional dos modelos bancários que alicerçaram a experiência francesa e alemã. Tanto o Banco do Brasil como a Caixa detêm potencial para exercer um papel típico de bancos universais. Seu direcionamento nesse sentido é uma decisão de governo.

* Economista, doutor em Economia pela UFRJ