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Desempregado não vota em governo

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Quase um quarto da potencial força laboral brasileira encontra-se desempregada, ou trabalha insatisfatoriamente, ou desistiu de procurar emprego, segundo o IBGE. São 27,7 milhões de pessoas nessa infausta circunstância, que, em tese, podem votar em outubro próximo. Ou seja, cerca de 19% do eleitorado suportam as angústias, as humilhações e os sofrimentos inerentes a esse desolador contexto. Isso sem contabilizar outros milhões de votantes que também são afetados pela precariedade funcional dos seus entes queridos. Tudo indica que as eleições se darão nesse vulcânico ambiente, cuja influência nos resultados é imprevisível, exceto pela patente vocação antigovernista – tanto no campo federal quanto nas esferas estaduais – dessa legião de degredados sociais. 

O desemprego é um dos elementos mais desestabilizadores da natureza humana. Para o desempregado crônico, não existe governo bom, mesmo que ele e a sua família se amparem em algum programa social compensatório, como o Bolsa Família, ou em serviços públicos nas áreas de saúde e educação. Em lares de provedores e de filhos sem trabalho e remuneração, sem perspectivas de presente e de futuro, não há a distinção entre as responsabilidades dos poderes federal, estadual e municipal; todos são igualmente ruins. Em conjuntura de desemprego elevado, o juízo sobre governos, comumente, é depreciativo, como apontam as inúmeras pesquisas de opinião, notadamente em centros politizados e de imprensa insubmissa. Desde que a taxa de desemprego mudou de patamar no país – praticamente, dobrando nos últimos três anos –, os governos, em todos os âmbitos, murcharam em suas dimensões. 

Na verdade, a drástica inflexão nos níveis de avaliação começou com os movimentos de rua de 2013, quando todos os governos despencaram em queda livre, pela mudança sincrônica do humor da população. O governo Dilma, por exemplo, conforme pesquisa na época, caiu de 57% para 30% de bom e ótimo em apenas três semanas. Pelos padrões históricos, 30% de bom e ótimo eram considerados índices de risco para as pretensões eleitorais de qualquer agrupamento político à frente de executivos. O que não se percebera, então, é que, perante uma sociedade mais crítica, desiludida e abrasada, os paradigmas de aferição de governanças se desarrumaram, o que permitiu, inclusive, a reeleição da presidente Dilma, em 2014, a despeito da queda de avaliação da sua administração. Hoje, nesse cenário de alta taxa de desemprego e subemprego e de decepção generalizada com a classe política, governos supervalorizados só por exceção. 

É difícil de se acreditar nas possibilidades de um candidato à Presidência da República identificado com o governo Michel Temer. Primeiro, pela péssima apreciação do governo Temer expressa nas pesquisas; apenas 6% de bom e ótimo contra 70% de ruim e péssimo. Segundo, pela gigantesca massa de desempregados, subempregados e desesperados que, majoritariamente, tende a ser contra governos, pois as políticas públicas de transferência de renda, embora relevantes para muitos, são módicas e limitadas para conferir algum sentimento de dignidade. A força eleitoral do Bolsa Família é real, mas insuficiente para superar o drama do desemprego na escala atual, que atinge novos contingentes alheios às muletas assistencialistas. No momento, há muito mais eleitores no valão do desemprego e do subemprego do que no balcão dos dependentes habituais. 

* Jornalista