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Desa?os colocados pelas intolerâncias diante de um país dividido

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Nas últimas décadas vimos cair por terra o mito do “brasileiro cordial”, temos acompanhado  um protofascismo que, a cada dia, ganha contornos mais agressivos com motes ao estilo “bandido bom, é bandido morto”, isso em um país que coleciona os maiores indicadores de violência do mundo: 

• o Brasil é o país com os maiores índices de violência de gênero. É assustador o número de assassinatos de mulheres cis, mulheres trans, gays, travestis e lésbicas; 

• temos as polícias que mais matam e mais morrem em todo o mundo; 

• temos o terceiro maior número de pessoas encarceradas em um sistema perverso que animaliza o delinquente ao invés de recuperá-lo; 

• o genocídio da juventude negra  é um dado da realidade comprovado por vários dados estatisticos; 

• concomitantemente, a guerra às drogas é uma guerra perdida. Porém é dela que advém todo o ciclo de violência absolutamente incontrolável que hoje assola os principais centros urbanos do país. 

Essa realidade não é diferente no campo. A disputa pela terra vitima diariamente os povos tradicionais, como indígenas, quilombolas, ribeirinhos, quebradores de coco e os povos de matrizes africanas que buscam preservar seus valores religiosos tradicionais e, por isso, são sistematicamente perseguidos, violentados no básico direito garantido pelo 5º artigo da Constituição Federal de 1988.

O ciclo estabelecido pelos governos progressistas e as consequentes ações que levaram à segunda campanha de Dilma Rousseff, extremamente polarizada sob um discurso de “eles são o mal e nós somos o bem”, fez surgir um país dividido eleitoralmente. A não aceitação da derrota, pelo segundo colocado, levou a uma paralisia do Congresso e, por fim, ao impeachment da presidente. 

Esse breve histórico busca tornar compreensível o cenário atual do país, em que tudo que seja “diferente” está sob ataque, e o protofascismo se manifesta com toda a sua força. 

Florestan Fernandes dizia que o brasileiro, apesar de ser racista, tinha vergonha de se assumir como tal. Pesquisa realizada em 1995 confirmou essa afirmação. Naquele momento, 90% das pessoas admitiam existir racismo no Brasil, no entanto, quase o mesmo percentual afirmava nunca ter cometido nenhum ato racista. Ou seja, o diabo é sempre o outro, nunca somos nós. A grande verdade deste país é que o brasileiro perdeu essa vergonha à qual se referia Florestan. 

Hoje, o uso das redes sociais potencializa as ações de intolerância. A falsa sensação de anonimato dá ao intolerante e ao racista a segurança para apregoar ideias nefastas que muitas vezes extrapolam as redes e se tornam agressões físicas no mundo real. Haja visto o que vem ocorrendo com as religiões de matrizes africanas em todo o país . Os dados são assustadores, somente no Estado do Pará ocorreram mais de 50 assassinatos de Babás e Iyalorixás, em 2017. No Rio de Janeiro repercutiram muito, no ano passado, os casos em que “traficantes de Cristo” violaram e humilharam várias lideranças religiosas e são cada vez mais frequentes os casos de pessoas com seus trajes e guias religiosas e que são agredidas verbal e fisicamente. 

O grande desafio está em construir formas de resistir ao avanço protofascista, da intolerância e de casos correlatos no momento em que as pesquisas para as eleições presidenciais são lideradas pelo candidato que faz do discurso de ódio sua principal plataforma política. Que Orunmilá, Exú e Xangô abençoem nosso país e a cada um de nós.

* Jornalista, Babalawo da tradição afro-cubana de Ifá