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Uma direita para ficar

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Não há tema mais candente, neste momento, do que a escalada, sem volta, das direitas em todo o mundo. E, a ratificá-la, viram todos, nos jornais, a vitória do primeiro-ministro Orbán, na Hungria, consagrando 97% dos votos da expressão política do país. 

A onda da direita está chegando a situações dramaticamente antológicas. Vamos, de saída, ao questionamento: qual é a grande oposição entre esquerdas e direitas? A primeira parte da ideia de que é possível repartir o rendimento social, de encontro sempre de uma situação de relativo e crescente equilíbrio na geração da riqueza e sua distribuição. Essa noção, cada vez mais, está ligada, no mundo contemporâneo, ao entendimento do que seja, de fato, o bem comum. E os extremos conceituais da esquerda – atente-se à palavra de Proudhon, por exemplo – chegam à visão de que “a propriedade é o roubo”. A esquerda defende essa ideia de que o bem comum não admite a noção de uma apropriação cumulativa, crescente, do que seja o produto social. 

Depara-se essa situação num momento tão inquietante em que, inclusive, a noção da igualdade básica da coletividade é, pela primeira vez, em marcação contrária à modernidade, destruída pelo Daesh (ou Isis), ou seja, a ideia de que só essa comunidade islâmica pode ser reconhecida, tornando obsoleto o conceito de cidadania. Neste momento, deparamos várias situações estupefacientes, mas a principal delas é a de que o Daesh nega a igualdade básica das pessoas e confronta a própria noção, marca da modernidade, ou seja, a democracia como um resultado da presença de todos, com igualdade de direitos, e de pretensões sociais. 

Há, ainda, um reconhecimento generalizado neste momento: a desaparição das formações dos partidos  de esquerda. Veja-se, por exemplo, a decadência do Partido Socialista francês, que, até dez anos atrás, era a agremiação mais importante do país e, agora, está abaixo do quinto lugar, dentro dos novos rateios eleitorais. É importante se salientar esse evento, diante do crescimento, também, das posições partidárias de direita na Alemanha, a tal ponto que a chanceler Merkel está, hoje, procurando os conservadores para lograr estabilidade no seu novo governo. 

Deparamos, ao mesmo tempo, o desinteresse político, cada vez maior, da mocidade. Verificamos – dados das Nações Unidas – que 66% do eleitorado entre 16 e 25 anos está votando em branco ou anulando o voto. Isso é um fenômeno absolutamente inédito e mostra até onde pode ir essa nova tendência, profundamente contundente para o futuro da democracia. Estamos vivendo um momento único, onde o futuro vai, também, depender da rapidez das mudanças tecnológicas, e perguntamos se, diante do avanço da internet e das redes sociais, estamos caminhando para o fim dos partidos, porque, a cada dia, o confronto de ideias e pautas assume novas formas, novos espaços, novas configurações. Não há surpresa para o amanhã; há a fatalidade do hoje; e a perspectiva de um futuro apocalíptico, ou não, dependerá da consciência com que a modernidade vai enfrentar o exercício do voto e, sobretudo, a visão de mudança.

* Membro do Conselho das Nações Unidas para a Aliança das Civilizações e da Academia Brasileira de Letras