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Conversa no divã: Autoestima

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Há muitos equívocos e mal-entendidos sobre o conceito de autoestima. Vou procurar esclarecer um pouco o assunto. Para começar, assinalo que egoísmo e vaidade não são manifestações de autoestima. Muito ao contrário, quem gosta de si mesmo não tem necessidade de ficar se envaidecendo e os que possuem uma sólida relação consigo podem – e costumam – ser generosos e altruístas. Tanto o egoísmo quanto a vaidade mostram insegurança, falta de confiança e, no fundo, carência de um amor próprio sólido. 

Autoestima é um sentimento natural. Em princípio, podemos considerar que os seres vivos manifestam autoestima em sua busca pela sobrevivência e pela propagação da própria espécie. Observando diferentes animais se percebe que aparentemente eles se mostram satisfeitos consigo e felizes.  Apenas o mundo externo os perturba e os ameaça. Não dão evidência de conflitos internos. Não há porque duvidar também que os bebês se sintam satisfeitos com eles mesmos. Pode sentir fome, frio, desconfortos, mas não mostram dificuldade para se gostarem. Desta situação inicial de paz na relação interna para distúrbios na natural autoestima ocorre uma importante mudança.  

A meu ver, o elemento que primeiro interfere negativamente na autoestima é a racionalidade. Uma mente racional é a mais clara separação existente entre os animais (chamados de “irracionais”) e os seres humanos. Em um sentido muito específico, a mente nos dota da capacidade de antever o futuro. A grande distinção entre os seres humanos e os outros animais reside nesta nossa capacidade que está muito além do que eles conseguem fazer. Porém, ao pensar sobre o futuro, criamos um conflito interno entre nossos desejos imediatos e nossa vontade de planejar a vida. Nós todos passamos por situações constantes, diárias, de conflitos interiores. E o conflito é, basicamente, sempre entre o desejo imediato e o nosso investimento no futuro.

Um exemplo que assinala o começo deste eterno drama humano: a criança quer brincar, mas tem de ir para o colégio. Plantar agora para colher mais tarde. Desde cedo, somos todos conduzidos à percepção deste conflito e ensinados a valorizar o investimento no futuro. Todo processo de educação focaliza as consequências futuras, positivas ou negativas, das ações presentes. Inicia-se um constante conflito entre nossos desejos imediatos e nossas vontades que se referem a projetos e expectativas futuras. Este conflito resulta frequentemente em um descontentamento com as escolhas que são feitas entre as alternativas que aparecem incessantemente. E também o sofrimento gerado quando nossos defeitos e nossas limitações são percebidos como prejudiciais. 

Somos vítimas de uma constante autocobrança em busca de conquistas futuras. Esta inevitável situação gera abalos em uma autoestima originalmente sólida. Penso que recuperar a autoestima é um processo de desenvolver tolerância com nossos eventuais erros e aceitar nossas limitações. O modelo mais adequado para a autoestima parece ser o amor parental. Mães e pais amam seus filhos independentemente dos defeitos e imperfeições destes. Quando se consegue desenvolver este modelo de tolerância e aceitação na relação consigo mesmo se abre caminho para recuperar e manter uma sólida autoestima. Esta permite que se possa desenvolver um processo sereno de esforço, no sentido de superação pessoal e aprimoramento que busca conseguir que a pessoa realize seus potenciais da melhor forma, dentro de suas limitações, e invista sua energia no rumo do melhor destino possível.

* Nas próximas quatro semanas, estarei de férias e ausente deste espaço. Até a volta.