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Coluna de Segunda: Barbosa não é tão pacato assim

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Depois de se reunir com a direção do PSB, na quarta-feira passada em Brasília, o ex-ministro do STF Joaquim Barbosa afirmou que a conversa foi produtiva, mas, por enquanto, não tomou a decisão de disputar a Presidência da República. “Eu ainda não consegui convencer a mim mesmo de ser candidato”. Também explicou aos jornalistas que é um homem de vida pacata e que teria dificuldades de ordem pessoal e familiar para se lançar na política. O PSB, que comemorou o desempenho de seu mais novo filiado nas pesquisas (com cerca de 10% das intenções de voto) vai ter que esperar mais um pouco. Talvez até as convenções oficiais em julho.

A candidatura do ex-ministro, portanto, não está confirmada. Mas, se vier, vai embolar o meio de campo. Muita gente se impressiona com o perfil de Joaquim Barbosa, que, em sua passagem pelo STF, mostrou-se inflexível com os criminosos de colarinho branco e com os desvios cometidos por políticos. Relator do “Mensalão”, ele pediu penas pesadas para todos os envolvidos, sem abrir exceção. Condenou desde a empresária Kátia Rabelo, dona do Banco Rural, até o ex-todo poderoso ministro da Casa Civil, José Dirceu, que permanece até hoje como um dos principais estrategistas do PT. Dizem que Barbosa é o outsider, o nome novo que faltava à eleição de outubro. Vai tirar votos à direita e à esquerda e tem tudo para alcançar o segundo turno. É o que dizem.

Cá com meus botões, acho que Joaquim Barbosa tem lá seus predicados, mas creio que as conclusões são precipitadas. Como avalia o calejado César Maia, ao fim e ao cabo devem prevalecer os políticos profissionais, como Marina, Ciro, Bolsonaro e Alckmim (além do nome a ser indicado por Lula, se for impedido de concorrer). Mas há um outro ponto que considero essencial. Trata-se da personalidade explosiva do ex-ministro do Supremo. Nesses dias de lua de mel com o PSB e de namoro com os eleitores, Barbosa apresenta-se como um homem cordato, acessível e  bem-humorado. Presta-se até mesmo a posar em selfies com simpatizantes em livrarias, restaurantes e aeroportos. Mas, na vida real, ele não é bem assim.

Joaquim Barbosa tem pavio curto e é tão explosivo quanto Ciro Gomes. Para quem duvida,  basta pesquisar na internet e rever bate-bocas célebres entre Barbosa e Gilmar Mendes (sempre ele) em sessões do STF.  Naquela época, em Brasília, ao ser encontrado em lojas  de vídeo e shoppings, o ex-ministro, em geral de poucos sorrisos, não dava espaço para intimidades.  Com os jornalistas, então, o tratamento era de hostilidade explícita. Como tantos outros homens públicos, Joaquim Barbosa não gosta da imprensa. E não tem paciência com repórteres.

Dou aqui o meu exemplo. No final de 2011, Joaquim Barbosa estava prestes a enviar seu relatório sobre o “Mensalão” para o ministro Ricardo Lewandowski, revisor do caso. Eu dirigia a sucursal de Brasília da revista “Istoé” (na época, pró Lula e Dilma) e pedi à repórter Izabelle Torres que marcasse uma entrevista com Barbosa, para que nos antecipasse alguns pontos de seu texto. Era quase certo que ele pediria a condenação de todos. Depois de muita insistência, o chefe de gabinete do ministro nos avisou que ele nos receberia. Entramos no gabinete, eu e Izabelle, e Joaquim Barbosa, de cara fechada, nos cumprimentou secamente.  Disse que só nos recebeu por causa de nossa insistência. Mas advertiu que o encontro seria curto.

Assim que fiz a primeira pergunta, Barbosa, de dedo em riste, fez a seguinte advertência: “O senhor está enganado. Isso aqui não é uma entrevista. De forma alguma. Vou conversar e falar do andamento do meu relatório. Mas os senhores não podem publicar uma linha de nossa conversa. Se publicarem, eu processo os dois e a revista!”. Conhecedor de alguns artifícios que os jornalistas usam, concluiu: “E não adianta publicar frase minha, como se fosse citada por amigos e assessores. Processarei da mesma maneira”. Obviamente, o ambiente ficou pesado e o encontro perdeu todo o sentido. Do que adiantava, se nada podia ser publicado?

Conheci um Joaquim Barbosa irascível, quase autoritário. Mas nesses dias de pré-campanha eleitoral, o ex-ministro diz que é um homem pacato. Vai ver que mudou, depois de aposentado.