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A sina da mobilidade urbana

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Foi uma surpresa agradável encontrar na edição do dia 7 passado, do JB impresso, uma excelente matéria intitulada “A sina do transporte público”, assinada pelo professor Marcus Quintela, sem dúvida, das maiores autoridades no assunto. Meu prezado amigo que, com extrema concisão, que só os que conhecem o assunto podem fazer, indica o caminho para a solução dos sistemas de transportes nas cidades brasileiras.

Como, nos tempos em que juntos colaborávamos para o JB, antes de se tornar digital, eu tinha a honra de por ele ser chamado carinhosamente de “meu guru”, vi-me no dever de complementar a sua matéria, em benefício dos atuais administradores públicos, plagiando seu título, chamando-a de "A sina da mobilidade urbana".

Também em homenagem ao meu saudoso amigo, engenheiro Gerardo Penna Firme, quando, com extrema felicidade, respondeu à pergunta de um repórter de se o transporte público organizado daria a mobilidade urbana, que todos desejamos, ao dizer: “O transporte urbano eficiente está como sexo para o casamento. Ambos são muito importantes, mas sozinhos não dão a felicidade completa.”

Pois é com o propósito de trazer a felicidade completa ao trânsito urbano, com a mobilidade equacionada, em benefício da livre circulação dos veículos de socorro que, em seguida, lhes mostro com se deve racionar o uso das vias saturadas. Ei-la, na integra:

As deficiências do transporte público nas cidades dos países do Terceiro Mundo, incapazes de satisfazer os sentimentos de conforto e de preguiça, inerentes ao ser humano, conforme declarou Henry Ford, em 1912, considerando estes sentimentos os responsáveis pelo sucesso de sua invenção, fazem os usuários utilizarem os seus carros de passeio para o  ir e vir casa–trabalho, criando como consequência o problema da mobilidade urbana.

A revista inglesa “The Economist” de 18-24 de fevereiro de 1989, em excelente matéria, com o título na capa ”Faça-os pagar” (Make they pay) sugere a adoção do pedágio urbano, como meio de diminuir o volume de tráfego dos carros particulares.

Posteriormente, no seu número da semana 6-12 de dezembro de 1997, como matéria de capa com o título: “Congestionamento hoje, pedágio amanhã” (Jam today, road pricing tomorrow) , volta a enfatizar o uso do pedágio urbano.

Eu, pessoalmente, por considerá-lo socialmente injusto, pela maneira desigual com que restringe o uso do carro de passeio, para os mais abastados e os menos, com prejuízo maior a estes últimos, nunca concordei em utilizar este sistema no Brasil. Finalmente no número da revista americana “Time”, de 24 de fevereiro de 2003, publicava uma matéria apresentando o plano de Londres, do prefeito Ken Livingstone, de criar uma zona, na área central da cidade onde o seu acesso para os carros de passeio implicava no pagamento de uma “taxa de congestionamento” (congestion charging) com um valor acima da passagem de “Undeground” ou de ônibus. No subtítulo da matéria, a revista comentava que: “O plano de Londres para reduzir o tráfego era arriscado, controvertido e... a última esperança, chegando brevemente a uma cidade perto de você”.

Ainda no ano de 2004, como costumo fazer desde há muito, visitei Londres a fim de observar o que lá existia de novidades sobre o assunto trânsito, observando que, de fato, o número de carros diminuíra, mas o de ônibus aumentara. Um motorista de táxi, perguntado por mim a sua opinião, respondeu: “Ele transferiram o congestionamento dos carros para o de ônibus”. De fato a comunidade de Londres aumentara em 200 o número de ônibus de dois andares e testaram, timidamente, o articulado, para atender o acesso ao centro comercial da cidade.

Não obstante, o número da revista “Time” de 16 de maio de 2005 elegia Ken Livingstone, entre os cinco melhores prefeitos da Europa, do ano que passou, graças ao seu projeto de “Congestion Charging”.

Eu, formado na escola européia, no que sei sobre a ciência do controle do trânsito, a tudo observava, estudioso que sou principalmente as soluções adotadas no meu país, para contornar o problema. O preço elevado e o tempo para solução ótima do metrô fizeram com que se optasse pela implantação do BRT, inexplicavelmente, não adotando o VLT, elétrico, não poluente, sobre trilhos. Enfim, era o que optaram e, atendiam ao raciocínio de Edson Passos de que “o ótimo é inimigo do bom.”.

Preocupado com o problema, ciente de que não possuímos opção convincente para substituir o uso do carro de passeio, lembrei-me do conselho do autor inglês G.K. Chesterton, ao escrever: “Não me preocupam os que não veem a solução, o que me preocupa são os que não enxergam o problema.” E qual era o problema, num país que não pode restringir o uso do carro, face ao que representa sua indústria para sua economia?

Era só olhar, enxergar e comprovar com pesquisa, ferramenta imprescindível para se gerir o trânsito. O mal não é o uso indesejável do carro de passeio, congestionando os períodos de pico, o mal era como o usam, 96% transportando apenas o seu condutor, ocupando 80% do espaço viário. A solução lógica, uma vez que cada vez cresce mais o número de carros a razão de 5 mil /mês, aqui no Rio, era racionalizar o seu uso, copiando a solução londrina e criando uma “taxa de congestionamento diária” para os carros somente com o seu condutor, principal responsável pelo desrespeito ao artigo 219 do Código de Trânsito Brasileiro, que pune como infração Média, andar abaixo da metade da velocidade máxima permitida. Esta situação nos permite eliminar este problema, criando uma “taxa de congestionamento”, diária, com um valor elevado, igual ao da multa prevista, no artigo da referência.

Como não temos a alternativa do transporte, adaptamos o carro de passeio à situação de fato, incentivando o transporte solidário, entre donos de carro que se conheçam e, assim, racionando o uso das vias que apresentam capacidade insuficiente para a demanda.

Criamos a “taxa de circulação racionada”, num valor capaz de subsidiar o transporte por ônibus, tornando-o gratuito, e que, considerando a atual arrecadação mensal da Rio Ônibus, de 78 milhões de reais, seria de 50 reais/mês, como contribuição de cada usuário do seu carro compartilhado, o que geraria uma arrecadação mensal de 100 milhões de reais, considerando-se, por baixo, um total de 2 milhões de carros com chips, de uma frota de veículos, na capital, de 3 milhões e 11 mil unidades. Estaremos eliminando o eterno conflito periódico entre o usuário dos ônibus e o governo, mantendo-o gratuito, e os seus reajustes, compensados na “taxa de circulação racionada”, paga pelos proprietários de carros, isentado deste ônus os usuários dos transportes.

Tudo isto se consegue com um sistema de “chip” identificador nos carros de passeio, participantes do transporte solidário e medidores em pontos estratégicos, nos caminhos para o centro ou de um bairro a outro, nas horas de pico, com seu controle totalmente informatizado. Diariamente, só poderá ser detectado um dos carros componentes do “carro compartilhado’(car pool). Caso mais de um circule, somente o primeiro detectado será isento da taxa de congestionamento. Em outras palavras, não é obrigatório trafegar lotado, basta que respeitem no horário de restrição a obrigatoriedade do grupo compartilhado só ocupar o espaço com um carro.

A fim, de incentivar que os grupos de participantes de cada carro compartilhado (car pool) tenham mais participantes, instituiremos  prêmios semanais, por sorteio, entre os carros com “chip”, que possuem números identificadores dos grupos. Assim é que um grupo com 4 componentes ganharia 400 mil reais, com três, 300 mil e assim por diante, até o mínimo de 200 mil para um grupo de somente dois componentes. Com este incentivo, espera-se uma redução de volume de carros de passeio, nas horas de pico, entre 50 a 80%, restabelecendo a mobilidade urbana, que defino como a dos veículos de socorro, principalmente a ambulância.

Para os sempre desconfiados, na criação de um especialista brasileiro, devo lhes dizer que, segundo a revista “Time”, em dezembro de 2005, no período natalino, houve uma greve em Nova York, de seu transporte público, o que provocaria um monumental congestionamento.

O prefeito teve a coragem moral de só autorizar a entrada de carros na Ilha de Manhatam, inclusive táxis, com a sua lotação completa. Não houve o congestionamento esperado.

Quando temos escassez de água, racionamos o seu consumo, por que não racionarmos o uso das vias, quando elas são insuficientes para o volume de tráfego?

Posso terminar este histórico de uma solução que só depende da coragem moral dos governantes, para ser adotada, com a expressão matemática do C.Q.D. (como queríamos demonstrar) para se concluir o desenvolvimento de um teorema, no caso a solução, em curto prazo, da mobilidade urbana.