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Edson Nery

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O carrilhão mais sonoro de Olinda, o da Basílica de São Bento, parecia muitas vezes tocar em vigília, quando anunciava as 18 horas, somente para Edson rezar  – primeiro o Ângelus; depois, “Ubiquidades”, um poema do seu amigo de juventude, Manuel Bandeira, pareciam irmãos. Ele recitava a oração e o poema na mesma cadência com o mesmo sentimento dos irmãos oblatos, como ele foi. “Quando rezo esse poema, penso em Deus”, dizia aos amigos. A poesia em Edson tomava a forma de oração.  No dia 22 do mês das chuvas e dos ventos frios de Olinda, os pássaros das torres sineiras do Mosteiro nãomais foram vistos  e  os pesados sinos da Basílica tocaram pela última vez para Edson. Momentos depois ele partiria para os horizontes imensos do firmamento, tornou-se partícipe da eternidade. O que houve depois disso foi uma grande tristeza no coração dos seus amigos.  

A atividade intelectual de Edson Nery da Fonseca não se limitou ao seu pioneirismo no campo da Biblioteconomia, Mestre incansável que foi a vida inteira nesse campo do conhecimento, uma ação permanentemente ressaltada pelos que vivem em comunhão com os modernos  métodos dessa disciplina.Métodos vislumbrados por ele.  Foi um dos profissionais mais conceituados do Brasil. Edson nos deixou um legado cultural de extraordinária dimensão, destacadamente como pesquisador da obra de Gilberto Freyre. De tamanha importância que não se chegará à obra gilberteana sem passar pelas trilhas inaugurais, abertas e dimensionadas à exaustão pelo saudoso Edson. Ele não se limitava às generalidades, era um estudioso sério, rigoroso. É necessário lembrar sempre o Edson articulista de Jornal, o conferencista notável, o memorialista -cota de malha no peito contra as vaidades, o crítico literário, o crítico de ideias,   juntando profundos saberes de exegese do texto e do pensar à coragem de dizer sem magoar, ético na convivência, sincero. Tudo isso com a elegância de estilo de quem foi a vida inteira  um leitor privilegiado dos clássicos de todas as épocas. Quando, em 2013, chegou a hora da escolha do homenageado da IV Feira Internacional do Livro/Fliporto, o nome de Edson foi aclamado. Ele foi sempre unanimidade inteligente. Quando soube de nossa decisão, na velha casa da Rua de São Bento, estando há vários anos sem poder sair do leito de enfermo, emocionou-se.  Suas primeiras palavras, para mim, comoventes, foram estas: “Eu irei receber a homenagem da Fliporto”. Mandou comprar uma cadeira de rodas,e foi levado por uma ambulância e assistido por seus médicos, sendo aclamado por uma multidão em fila. Falou de sua vida e de sua obra, rezou seus poemas  preferidos. Eu estava lá, aplaudindo ele.

Antônio Campos - Advogado e Escritor - [email protected]